A bipolaridade de explorar o espaço infinito com mecânicas limitadas em No Man’s Sky

No Man’s Sky é um game quase experimental que diz ao jogador que ele tem a liberdade para explorar de tudo, mas lhe dá condições muito limitadas para tanto.

por Renato Siqueira

Quando Sean Murray, criador da Hello Games, subiu no palco do VGX Awards em 2013 para revelar No Man’s Sky – citando Asimov e Arthur C. Clarke como grandes influências para o desenvolvimento do jogo – o público fã de sci-fi ficou louco.

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A ideia era desenvolver um game de mundo aberto com exploração espacial “virtualmente” sem fim, e para isso optaram por passar 6 anos desenvolvendo o título usando um código de geração processual, aquele que cria dados randomicamente através de algoritmos que embaralham milhares de informações para criar algo novo. Era isso que supostamente daria ao jogador a sensação de liberdade em um jogo de mundo aberto.

A tecnologia presente neste tipo de programação é muito interessante, mas é também um processo bastante complexo e, para ser realizado, tem que levar em consideração muitas variáveis. Já no caso de um um jogo de exploração espacial, é preciso lidar com variáveis quase infinitas – o que não acontece em No Man’s Sky.

De 1980 pra cá, foram cerca de 16 jogos de produtoras diferentes que usaram este tipo de programação integralmente em seus títulos, uma prova do quão complicado é criar algo utilizando este processo. Agora, não me leve a mal, os games usam o Procedural Generation há anos, mas sempre em pequenas partes de sua construção, como por exemplo, em “caixas de itens” ou “baús do tesouro” encontrados aleatoriamente nos jogos. É o tal Procedural Generation que faz com que tenha sempre algo diferente lá dentro.

Hype criado, mas injustificado

Foi uma combinação de declarações de Sean Murray com vídeos mostrando planetas incríveis, criaturas alienígenas e batalhas espaciais que fizeram os jogadores cair de joelhos. E foi assim que o hype pelo jogo simplesmente nasceu.

A verdade é que No Man’s Sky é um game quase experimental que, enquanto diz ao jogador que ele tem a liberdade para descobrir e explorar um quintilhão de planetas (isso está até na campanha de marketing do jogo!), lhe dá condições muito limitadas para tanto.

A minha experiência com No Man’s Sky começou em um planeta de nome impronunciável; minha pequena nave estava com defeito necessitando de vários elementos químicos para ser reparada. Foi então que, com uma arma laser, comecei a minha busca pelos materiais. Com o raio de mineração eu destruí plantas e pedras, e com meu jetpack explorei cavernas e montanhas procurando coisas para consertar a nave.

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Todos os planetas possuem tons predominantes de cor que variam em espectros limitados.

Nave consertada, decolei em busca do desconhecido. Não dá pra negar que é muito legal a primeira vez que você sai voando de um planeta. Vêm na sua cabeça frases clichês de filmes e séries sobre o espaço como “O espaço, a fronteira final…” e você passa a imaginar mil aventuras que podem acontecer em seu caminho como explorador. A princípio, tudo é imaginado e contemplativo. Os planetas são coloridos em tons de vermelho e amarelo com flora e fauna diferentes. Em alguns há água, em outros o ambiente é nocivo e hostil.

Mecânica do jogo e exploração de planetas

No sistema onde apareci haviam quatro planetas, uma estação e um posto espacial. Me empolguei em visitar cada um deles, fui a abrigos e monumentos. Encontrei o primeiro alienígena. No momento da conversa, percebi que não sabia seu idioma. Foi então que um texto explicando as reações do ser como em um livro de RPG apareceu. Não há imagens, não há CG, não há vozes, não há absolutamente nada pra te manter no clima, só aquele texto. Com opções limitadas de interação, a resposta certa me rende itens e a errada me causa dano.

Bem mais pra frente, descubro que pra aprender o idioma eu preciso explorar pedras do conhecimento e monolitos que me ensinam uma palavra de cada vez. Saio em busca das pedras. Mais para frente entendo que, para criar materiais, montar novas tecnologias e conseguir dinheiro para novas naves, armas e jetpacks necessários para ir mais longe em minha jornada, preciso minerar elementos em cada um dos planetas visitados.

E são essas as suas únicas opções de exploração, os quatro elementos, a base da mecânica limitada de No Man’s Sky: aprenda, atualize, minere e venda. Não importa para onde o jogador viaje ou o que faça neste vasto espaço, estas quatro opções estarão sempre presentes e são a única maneira de avançar no jogo. O jogo é um verdadeiro gerenciador de itens, sendo que sua nave e seu traje têm espaços limitados para carregar estes conteúdos.

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Esse alce, boi bípede e com pele de lagarto foi uma das coisas mais esquisitas que encontrei em minhas andanças

Por conta das rasas opções de exploração, passados um pouco mais de 15h de jogo, e tanta repetição, seu ímpeto de viajar pela galáxia começa a desvanecer. E a partir daí fica muito mais claro para o jogador que a viagem espacial não tem nada de incrível, e o jogo – de tão limitado – fica chato e repetitivo. Explorar planetas começa a ser um enorme pé no saco porque tudo começa a ficar igual aos olhos do jogador veterano.

Como passa a não haver mais a “magia da imersão no universo espacial”, dá pra entender que a cada novo planeta, nós chegamos na verdade, ao mesmo lugar, que foi apenas “vestido e pintado” de forma diferente pelas alterações randômicas do código do jogo.

Em termos de mecânica dos controles, o jogo não tem nada demais. Você se move com o direcional, atira, recolhe itens, entra e sai da nave. Acabou. Nem mais e nem menos. As batalhas contra outras naves espaciais não têm propósito já que não há um enredo e nem mesmo uma classificação que diz se com aquilo o jogador age bem ou mal. Enfim, você pode fazer tudo desde que esteja dentro da limitada mecânica criada.

No Man’s Sky não tem quase nada do que foi prometido desde sua revelação em 2013. O hype criado em cima dele foi apenas uma sequência de promessas que foram esquecidas no caminho do desenvolvimento afetando a versão final do jogo que foi lançada este mês. Na contra maré da falta de conteúdo, os produtores revelaram em sua página oficial que pretendem fazer atualizações periódicas incluindo mais e mais.

Por isso, se você me pedisse uma indicação pra comprar este jogo agora eu lhe diria: Não compre! Talvez em algum momento ele esteja melhor, mas agora você pagará apenas por um gerenciador de itens com temática espacial. Tá longe de ser até mesmo o próximo Minecraft.

No Man’s Sky está disponível para Playstation 4 e PC.

Atualizado às 16:45

Na internet, jogadores tiram sarro das criaturas geradas aleatoriamente no jogo

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