Cientistas criam sementes especiais de arroz e soja para combater o HIV

Pesquisadores espalhados por vários países - inclusive o Brasil - criaram sementes transgênicas com proteínas que neutralizam o vírus da Aids.

O combate ao HIV é uma tarefa árdua e necessária: 35 milhões de pessoas no mundo estavam infectadas até o fim de 2013, segundo a UNAIDS. Para impedir que o vírus se espalhe, é importante usar camisinha, mas só isso não resolve: uma equipe aposta em uma solução cultivada na soja e no arroz.

Pesquisadores espalhados por vários países – inclusive o Brasil – criaram sementes transgênicas com proteínas que neutralizam o vírus da Aids.

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Em um estudo, cientistas conseguiram produzir o anticorpo 2G12 em sementes de arroz. Ele se prende ao HIV, deixando-o vulnerável para que seja combatido pelo nosso sistema imunológico.

Para modificar o DNA do arroz, os pesquisadores usam um método chamado biobalística: células e tecidos da planta são bombardeados com microprojéteis de ouro ou tungstênio a 1.500 km/h. Eles levam os genes para transformar o arroz, que então é cultivado em estufas. Assim, a planta passa a ter um DNA modificado, e produz anticorpos contra o HIV.

Esses anticorpos ficam dentro de cada semente. Para extraí-los, é preciso usar um pouco de ciência (o nome técnico é “cromatografia de imunoafinidade”). A ideia é oferecê-los na forma de um gel que neutraliza o HIV, a ser usado antes de cada relação sexual.

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Arroz biofortificado (CIAT/Flickr)

O anticorpo 2G12 é normalmente produzido em células de mamíferos, que são cultivadas em tanques de fermentação. Só que nesse método, a produção é baixa e os custos são altos: você não encontra um tanque de fermentação industrial em todo país – especialmente não nos mais pobres, que mais sofrem com o HIV.

Ao usar plantas, o custo pode cair em até 95%, e o anticorpo pode ser produzido em massa. O arroz seria cultivado inicialmente em estufas. Estudos anteriores já conseguiram gerar anticorpos do HIV no milho e tabaco, porém em quantidades bem menores.

O estudo teve a participação dos brasileiros Elíbio Rech e André Murad, ambos da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia. Rech é conhecido por criar no país um dos maiores laboratórios-estufa do mundo para pesquisas de transgênicos com fins medicinais; e também por desenvolver as primeiras plantas transgênicas de soja e feijão.

Soja (2)
Sementes de soja da Monsanto (AP Photo/Dan Gill)

Soja

Rech e Murad foram coautores de outro estudo, também publicado este ano, que usou a soja para produzir uma proteína que neutraliza o HIV.

Ela se chama cianovirina, e é capaz de desativar o HIV, impedindo que ele se conecte às células do seu corpo. A proteína é eficaz até mesmo contra o SIV, que causa AIDS em macacos.

Para modificar o DNA da soja, os pesquisadores também usam a biobalística, que descrevemos acima. E para retirar a proteína da semente, é preciso desidratá-la, transformá-la em pó, e depois usar “uma combinação de extração aquosa, precipitação com etanol e cromatografia”. Não é fácil!

Mas depois que isso é feito, a produção é grande: se a soja transgênica for plantada em uma estufa tão grande quanto um campo de futebol, ela pode gerar cianovirina o bastante para proteger do HIV uma pessoa durante 65 anos, 365 dias por ano.

E os pesquisadores prometem que a soja também pode ser usada para fabricar óleo, que não contém a proteína anti-HIV. No entanto, Rech diz em comunicado que as sementes transgênicas precisam ser plantadas em condições controladas de uma estufa, não no campo.

Aqui, a ideia também é criar um gel com a cianovirina, para ser usado antes de relações sexuais. Esse gel já foi usado em macacos, prevenindo a transmissão do vírus da AIDS.

Rech explica a’O Globo que o gel é pensado para mulheres, “porque muitas africanas não têm opção da utilização de preservativos pelos parceiros – então, com isto, elas decidiriam”. Segundo a Embrapa, países em desenvolvimento com altos índices de AIDS – especialmente na África – não terão que pagar royalties se produzirem a cianovirina dessa forma.

Elibio Rech

Elíbio Rech, pesquisador da Embrapa (Wilson Dias/Agência Brasil)

Biofábrica

Ambas as pesquisas apostam no conceito de biofábricas, ou fábricas biológicas. É uma união entre a biotecnologia e a indústria farmacêutica que já alcança um faturamento de US$ 10 bilhões por ano, segundo a Embrapa.

Produtos biotecnológicos representam cerca de 10% dos novos produtos no mercado, e o agronegócio brasileiro está de olho nisso. Roch acredita que o daqui a dez anos, o Brasil será pesadamente influenciado pela biogenética.

Isso levanta uma série de questões sobre OGMs (organismos geneticamente modificados): eles podem ser úteis até na medicina, mas podem causar problemas ambientais se não forem controlados. Também há potenciais riscos à saúde.

Por isso, o posicionamento da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) é que cada transgênico seja avaliado com base na ciência, para determinar os benefícios e riscos de cada um.

Estes métodos talvez sejam realmente úteis para combater o HIV, mas terão alguns obstáculos para virarem realidade. [Plant Biotechnology Journal via Embrapa]

Foto inicial por Christina B Castro/Flickr

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