Estudos brasileiros usam cobras e plantas para buscar novos tratamentos contra a hepatite C

Novos estudos brasileiros apresentam avanços contra o vírus da hepatite C a partir de compostos encontrados em cobras venenosas e plantas da flora brasileira. As pesquisas se basearam na linha de investigação que conseguiu resultados contra a febre amarela, sarampo e a dengue — que faz parte da mesma família de vírus da hepatite, chamada […]

Novos estudos brasileiros apresentam avanços contra o vírus da hepatite C a partir de compostos encontrados em cobras venenosas e plantas da flora brasileira.

As pesquisas se basearam na linha de investigação que conseguiu resultados contra a febre amarela, sarampo e a dengue — que faz parte da mesma família de vírus da hepatite, chamada Flaviviridae — a partir do isolamento de compostos do veneno de animais, segundo informações da Fapesp.

Cobras vs. Vírus

Crotalus durissus terrificus (Créditos: Orias1978/Flickr)

O primeiro estudo, realizado no Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas (Ibilce) da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e publicado na PLoS One,  utilizou compostos isolados do veneno da espécie de cascavel Crotalus durissus terrificus, popularmente conhecida como cascavel-de-quatro-ventas, boiçununga ou maracamboia.

Duas proteínas do composto isolado do veneno da cascavel são utilizadas: fosfolipase A2 (PLA2-CB) e a crotapotina (CP). Elas são subunidades associadas do complexo proteico crotoxina (CX), que também foi testado.

O genoma do vírus da hepatite C, como explica a Fapesp, é composto por uma única fita de RNA, o ácido ribonucleico, que codifica as proteínas do vírus. O vírus invade a célula humana, se replicando e produzindo novas partículas virais.

“Dentro da célula hospedeira, o vírus produz uma fita complementar de RNA, a partir da qual serão produzidas moléculas de genoma viral que constituirão as novas partículas”, explica Ana Carolina Gomes Jardim, coordenadora do Laboratório de Virologia do Instituto de Ciências Biomédicas (ICBIM) da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), que também participou do estudo.

Gomes Jardim explica que a proteína fosfolipase pode se intercalar com o RNA dupla fita, um intermediário da replicação do vírus, impedindo que o vírus se expanda. “A intercalação reduziu em 86% a produção de novos genomas virais, quando comparada ao que ocorre na ausência da fosfolipase”, disse. Ao utilizar o completo proteico crotoxina no mesmo experimento, o resultado foi de apenas 58%.

Os resultados foram ainda melhores na segunda etapa da pesquisa, que verificou a possibilidade de bloquear a entrada do vírus nas células humanas. A fosfolipase bloqueou em 97% a entrada do vírus nas células humanas em cultura. O complexo crotoxina, por sua vez, pode reduzir a entrada viral em 85%.

A proteína crotapolina também foi testada, mas seus resultados não foram tão satisfatórios: ela não pode, por exemplo, impedir a entrada do vírus nas células humanas, nem a sua replicação, mas, na outra etapa do processo, reduziu em 78% a saída de novas partículas virais das células.

Flora vs. Vírus

O segundo estudo utiliza compostos naturais da flora brasileira. Os pesquisadores testaram como a planta Pterogyne nitens, conhecida popularmente por amendoim-bravo, reagiria ao vírus da Hepatite C a partir de seus flavonoides — compostos encontrados em frutas, flores, vegetais em geral, mel e no vinho.

A pesquisa foi conduzida pelo professor Luis Octávio Regasini no Laboratório de Química Verde e Medicinal na Unesp de São José do Rio Preto e publicada na Scientific Reports.

Sorbifolina e a pedalitina, dois flavonoides das folhas do amendoim-bravo, foram isolados e avaliados de maneira idêntica ao estudo que se baseou no veneno da cascavel.

A ação antiviral dos compostos flavonoides foi testada em células humanas infectadas e não infectadas pelo vírus da hepatite C.

A pedalitina pode bloquear a entrada do vírus nas células humanas em 79% dos casos. Já a sorbifolina teve um resultado inferior, bloqueando a entrada do vírus em apenas 45% dos casos. “O experimento foi feito com dois genótipos do vírus da hepatite C, o genótipo 2A, que é o padrão para todos os estudos, e o genótipo 3, que é o segundo mais prevalente no Brasil. Nos dois casos, a ação antiviral dos flavonoides foi equivalente”, explica Gomes Jardim.

Apesar do resultado favorável em bloquear a entrada do vírus nas células humanas, os flavonoides não apresentaram nenhum bloqueio durante a replicação do vírus e nem na saída da célula infectada.

O vírus

Transmitido por contato com sangue contaminado, o vírus da hepatite C, na maioria das vezes, não apresenta sintomas nos pacientes infectados. Quando apresenta, no entanto, desenvolve fadiga, náuseas, perda de apetite e o amarelamento dos olhos e da pele.

Ele atinge 71 milhões de pessoas em todo e o mundo e cerca de 135 mil pessoas no Brasil. Segundo o Ministério da Saúde, o vírus da hepatite C é o maior responsável por casos de cirrose hepática e, consequentemente, transplantes de fígado. Os atuais tratamentos contra o vírus são trabalhosos e podem apresentar desde resistência viral até outros efeitos colaterais, como diabetes e depressão.

No ano passado, o governo brasileiro passou a oferecer uma nova forma de tratamento contra o vírus que apresenta cura de aproximadamente 90% dos casos. Eles foram disponibilizados em unidades básicas de saúde do país, independente do grau de de avanço da doença do paciente infectado.

Imagem de topo: Teste rápido de hepatite (Créditos: Fotos Públicas)

[Fapesp]

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