Como os foguetes termonucleares da NASA nos levarão para além de Marte

As primeiras pessoas a pisarem em Marte não chegarão lá a bordo de foguetes movidos a compostos químicos, como os que levaram a tripulação da Apollo 11 para a Lua – eles simplesmente não são o suficiente para gerar o impulso necessário para chegar ao planeta vermelho antes de expor sua tripulação a meses de […]

As primeiras pessoas a pisarem em Marte não chegarão lá a bordo de foguetes movidos a compostos químicos, como os que levaram a tripulação da Apollo 11 para a Lua – eles simplesmente não são o suficiente para gerar o impulso necessário para chegar ao planeta vermelho antes de expor sua tripulação a meses de radiação espacial perigosa. Em vez disso,a NASA está se voltando para foguetes termonucleares — há muito tempo ignorados — para levar os primeiros exploradores para Marte.

Como a NASA vai criar um foguete melhor

Foguetes termonucleares não são uma tecnologia nova. Na verdade, pesquisadores começaram a discutir a possibilidade de usar energia nuclear para impulsionar foguetes e aeronaves lá atrás, em 1942, após Enrico Fermi ser sucesso com testes de reatores de fissão. Em 1944, equipes do Laboratório de Metalurgia da Universidade de Chicago e do Laboratório Nacional Los Alamos desenvolveram um design inicial termonuclear que usava um reator de fissão para superaquecer gás hidrogênio que então escaparia por um pequeno bico e geraria o impulso. Como o combustível nuclear é 107 vezes mais denso em energia do que o químico e foguetes similarmente poderosos teriam cerca de metade do peso, os foguetes termonucleares (NTR, na sigla em inglês) podem transportar carga para alimentar de 1:1 a até 7:1, especialmente quando usadas em estágio superior. O design gerou interesse das forças aéreas dos Estados Unidos (USAF), que conduziram testes no Laboratório Nacional de Oak Ridge entre 1947 e 1949.

O desenvolvimento desta tecnologia ficou parado por alguns anos antes de Los Alamos começar o desenvolvimento do ICBM movido a tecnologia nuclear em 1955 e expandir a motores a jato nucleares em 1956. Mas em 1957, a USAF determinou que a tecnologia não era adequada para uso militar, e no lugar recomendou que as tecnologias não-nucleares fossem transferidas para a recém-formada National Aeronautics and Space Administration (a NASA!) e assim começou o Projeto Rover.

O Projeto Rover durou de 1955 até o seu cancelamento em 1972, e em 1961 já tinha se desenvolvido tão rápido e sido tão bem sucedido que o Centro de Voos Espaciais Marshall começou a fazer barulho para ser autorizado a usá-lo RIFT (teste de reator durante um voo) em 1964, um marco de desenvolvimento que permitiria a construção e lançamento do estágio final do protótipo. Em resposta, o Escritório de Propulsão Nuclear Espacial foi criado em 1961 para observar e planejar operações, assim como facilitar a cooperação entre a NASA, que estava focada em sistemas de voo e design de motores, e a Comissão de Energia Atômica, que desenvolveu a tecnologia do reator. O primeiro diretor do escritório foi H. B. “Harry” Finger, não embarcou no papo do RIFT e adiou o lançamento, exigindo um rigoroso conjunto de métricas de desempenho a ser atingido antes de os motores saírem do chão.

Do lado da NASA, o Projeto NERVA tinha a missão específica de criar um motor digno para o espaço, possível para uma missão e, mais importante, realmente termonuclear. Os mais de 20 designs de foguetes diferentes produzidos nestes 17 anos surgiram em várias etapas: o Kiwi, um protótipo que não foi feito com o intuito de voar foi desenvolvido entre 1955 e 1964. O maior e intermediário Phoebus foi desenvolvido entre 1964 e 1969; e o Pewee, que funcionou entre 1970 e 1971 até ser substituído pelo design de fornalha nuclear. A série de foguetes nucleares experimentais viu um desenvolvimento simultâneo entre as plataformas Phoebus e Pewee entre 1964 e 1968.

Um par de reatores nucleares para cada modelo foi desenvolvido em Pajarito, em Los Alamos – um para experimentos críticos, um estado em que o reator passa por uma reação de fissão a temperaturas baixas o suficiente para gerar efeitos térmicos insignificantes, e um para testes com força total no sítio remoto de Nevada (o que ajudava quando os motores testados explodiam e espalhavam material nuclear ao redor do lugar). O complexo super-secreto Sigma ficou com a produção de plutônio-238, um primo não-físsil do Plutônio-239, usado nas bombas nucleares lançadas no Japão.

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As primeiras versões do modelo de teste KIWI foram disparadas pela primeira vez no meio de 1959. Composto por uma pilha de placas de óxido de urânio não revestido mergulhados em hidrogênio líquido, chamar seu motor de motor é uma grande bondade pelo seu estado, mas mesmo assim ele foi capaz de produzir impressionantes 70 MW de eletricidade e gerar exaustão de 2683 graus Kelvin. A segunda versão, o KIWI B, trocou as placas de urânio por pequenas bolas feitas de dióxido de urânio, suspenso em uma matriz de grafite, revestida com carboneto de nióbio. O hidrogênio líquido fluiu através destes feixes para gerar exaustão. Além da eletricidade e impulsão, os primeiros designs de KIWI tinham falhas que nunca foram resolvidas até o fim do programa. Uma delas era que eles sacudiam e vibravam – muito. O suficiente para quebrar os pacotes de combustível, tornando-os inúteis. Também eram tão quentes que o vapor super-aquecido corroía as paredes do reator.

O perigo de uma falha catastrófica, chamada de “brecha de contenção”, era muito grande durante o teste. Estas falhas – causadas por sondas impactando no solo, fuga de fissão ou falhas de projeto -, tanto na atmosfera quanto em órbita, poderiam fazer chover radiação em uma enorme parte de terra. Então em 1965, os pesquisadores explodiram propositalmente um reator KIWI no meio de Jackass Flats, parte do local de testes de Nevada. A explosão resultante despejou precipitação suficiente para matar tudo ao seu redor em um alcance de 160 metros, e envenenar tudo que existia em um raio de 600 metros. A quantidade de precipitação depende do formato do combustível que o motor roda, com barras de combustível sólido e esferas enterradas em matrizes de carbono espalhando mais radiação que as contrapartes líquidas e gasosas.

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Após cinco anos de desenvolvimento do KIWI, a NASA se voltou para um motor muito maior, a série Phoebus. O teste inicial do foguete em 1959 produziu 1064 MW de força e 2370 graus Kelvin de exaustão em 10 minutos. Estas estatísticas saltaram para 1500 MW em 30 minutos em 1967 e ganharam o título de “o mais potente reator nuclear já produzido” quando o Phoebus A-2 liberou incríveis 4000 MW de carga elétrica em apenas 12 minutos. Isso é 4GW de energia, equivalente à produção total de Chernobyl – suficiente para iluminar 3 milhões de casas – gerado em 15 minutos.

Na outra extremidade de escala de poder estava os modelos stout de 500MW baseados nos desenhos originais do KIWI. Eles foram criados para testar um novo revestimento de carboneto de zircônio para substituir o carboneto de nióbio original. Eles também foram usados como base para o moderno design de 11 toneladas do foguete termonuclear feito pela NERVA conhecido como NDR. O design do Pewee reduziu em três vezes a corrosão causada pelo combustível. Durante este tempo, a NASA também testou diferentes designs de foguete resfriados com água, conhecido como NF-1.

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Outro desdobramento dos projetos originais KIWI foi o NERVA NRX, que começou a ser testado em 1964 e evoluiu para o NERVA NRX/XE – um foguete nuclear próximo de estar pronto para voar. O escritório de assuntos espaciais testou o motor XE 28 vezes em 1968, lançando-o em uma câmara de baixa pressão para imitar os efeitos do vácuo do espaço. Em todos os testes, o motor gerou mais de 1100MW de energia assim como 334kN de impulsão – o que o escritório exigia ser atingido antes de permitir um lançamento, assim como a quantidade que a agência precisava para efetivamente levar astronautas para Marte. Durante os testes, o motor rodou por mais de duas horas no total, 28 deles com força máxima, e só parou quando queimou todos os 17kg de combustível.

Este sucesso, em combinação com Los Alamos resolvendo três problemas de materiais, criaram uma grande quantidade de potenciais usuários dos novos foguetes nucleares. Alguns deles queriam substituir os propulsores J-2 usados no segundo e quarto estágio do Saturn I e IV. Outros queriam eles sendo usados como “reboques espaciais”, pegando objetos da órbita e lugares mais altos. Infelizmente, nenhuma dessas ideias saiu do papel já que todo o projeto foi cancelado no fim de 1972.

Os Estados Unidos já tinham colocado um homem na Lua naquele momento, a era Apollo estava sendo substituída pela era dos ônibus espaciais, a opinião pública estava começando a se voltar contra a tecnologia nuclear, e o Congresso americano ficou furioso quando encontrou os efeitos que uma missão tripulada para Marte fariam no orçamento nacional. E sem uma missão para Marte, não havia motivos para o desenvolvimento do NTR. Assim, mesmo atingindo quase todas as métricas exigidas, exceto duas – reiniciar 60 vezes e rodar um total de dez horas – o projeto foi encerrado.

Como os foguetes termonucleares funcionam

Todos os foguetes Rover/NERVA rodaram com plutônio-238, um isótopo não-físsil com meia-vida de 80 anos. Com uma meia-vida curta e a relativa dificuldade de separar os isótopos específicos do plutônio natural, o Pu-238 é normalmente sintetizado usando o mesmo método originalmente desenvolvido pelos pesquisadores Glenn T. Seabord e Edwin McMillan em 1940 – bombardear uma amostra de Urânio-238 com deutério.

O plutônio é uma commodity valiosa para a exploração espacial onde quantidades insuficientes de luz solar tornam os painéis solares inúteis. O gerador termoelétrico de radioisótopo (RTG) da NASA roda com Pu-238. Enquanto o plutônio é um condutor fraco de eletricidade, sua emissão de partículas alfa como parte do seu processo de deteriorização gera uma grande quantidade de calor para rodar o RTG. As famosas sondas Voyager, a nave espacial Cassini e a Curiosity e a nova sonda New Horizon todas dependem de energia nuclear para as operações.

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Núcleo Sólido

O mais simples design de núcleo usa combustível sólido (como as placas do KIWI e do Phoebus) para superaquecer o hidrogênio. A quantidade de calor, e consequentemente a impulsão que tal formato consegue produzir varia de 22 graus K para mais de 3000 graus K e só é limitado pelo ponto de fusão dos componentes do reator ao redor. Trabalhando com propulsores de hidrogênio líquido, um núcleo sólido consegue produzir um impulso específico de 850 a 1000 segundos – o dobro do que o motor principal dos ônibus espaciais consegue atingir.

Núcleo Líquido

Se, em vez de enterrar o combustível nuclear em matrizes de grafite, as pastilhas de combustível fossem misturadas diretamente no líquido em si, o motor resultante seria capaz de gerar temperaturas além do ponto de fusão do combustível nuclear – teoricamente, pelo menos. Ninguém é capaz de criar um desses. Prender o combustível radioativo no motor enquanto permite que o fluído saia é bem difícil. No entanto, projetos de rotação usam a força centrípeta para separar os dois e surgem como uma grande promessa.

Núcleo Gasoso

Um reator de núcleo gasoso é mais difícil do que um líquido, exigindo um bolso rotativo de gás urânio rodeado por vapor de hidrogênio. Já que o combustível não entraria em contato com as paredes quentes da câmara, ele seria intensamente quente (na magnitude de muitas dezenas de milhares de graus K) e produziria 30 a 50kN em 3000 a 5000 segundos.

NASA vai de volta para o futuro

Após um hiato de algumas décadas, tanto a NASA quando a Agência Espacial Federal Russa (que desenvolveu muitos dos seus próprios NTRs durante a guerra fria mas nunca testou fisicamente nenhum deles) anunciaram em abril de 2012 que reviveriam a tecnologia de foguetes termonucleares e coordenariam um projeto conjunto de US$ 600 milhões com potencial envolvimento de França, Reino Unido, Alemanha, China e Japão.

O Centro de Voo Espacial Marshall também está preparando o seu próprio Estádio de Propulsão Criogênica Nuclear como parte do futuro Sistema de Lançamento Espacial. Este local seria super-refrigerado pelo fornecimento de combustível hidrogênio líquido e seria incapaz de iniciar uma reação de fissão até estar seguramente fora da atmosfera. No entanto, já que os testes acima do solo foram universalmente banidos desde a última vez que a NASA mexeu com NTRs, pesquisadores estão usando um simulador chamado NTREES. Este modelo pode simular as interações entre vários componentes de um motor NTR, permitindo que cientistas aperfeiçoem os desenhos e aspectos de engenharia sem o risco de espalhar uma chuva nuclear.

“Os dados que ganharemos usando esta instalação para teste permitirão que engenheiros criem elementos mais eficientes e resistentes, e sistemas de propulsão nuclear”, diz Bill Emrich, pesquisador da NASA na instalação NTREES. “A nossa esperança é que isso permita o desenvolvimento de um motor de foguete nuclear confiável e de custo efetivo em um futuro não muito distante.”

Além de desenvolver tecnologias revolucionárias de motores, a NASA também está encarando uma espécie de falta de combustível. Os Estados Unidos não produzem plutônio-238 desde os anos 1980 e os estoques existentes são usados para RTGs. Algumas estimativas dizem que todo o suprimento acabará até o fim desta década.

É por isso que a NASA não está perdendo tempo e anunciou que o DoE vai produzir Pu-238 novamente a partir de 2017. “Nós vamos iniciar o projeto de produção de plutônio”, disse Wade Caroll, diretor-adjunto de sistemas de energia de defesa e espaço. “Provavelmente vai levar de cinco a seis anos até o próximo plutônio estar disponível.”

Os planos do DoE são de produzir um total de até 1,8kg do isótopo anualmente, o suficiente para satisfazer as nossas missões robóticas planetárias. Tudo o que precisamos agora é uma espaçonave interplanetária. Sem problemas.

[Wikipedia 123 – Popular Science – Space Travel – Science Daily – Los Alamos National Lab –EPA – Mother News Network – Idaho National Lab – Today I Found Out]

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