Como realmente sabemos que não somos robôs?

Como saber se somos realmente humanos, e não algum tipo de inteligência artificial numa casca humanoide convencidos de que somos humanos?

Em Westworld, alguns robôs humanoides estão vislumbrando uma horrível realidade por trás de sua autopercepção artificial – que eles foram criados para serem usados e mortos por ricos que vão para Westworld brincar de cowboy por alguns dias.

À medida que a realidade deles começa a desmoronar, nós fazemos a pergunta: como saber se somos realmente humanos, e não algum tipo de inteligência artificial numa casca humanoide convencidos de que somos humanos?

O que realmente significa ter livre arbítrio, ser um produto da natureza e não de um design humano? Se você não pode dizer a diferença entre um robô e um ser humano, isso realmente importa? Pedimos a filósofos, cientistas da computação e escritores que dessem sua opinião; elas seguem abaixo.

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Evan Selinger

Professor do Departamento de Filosofia no Rochester Institute of Technology

Longe de ser nova, a questão de saber se realmente somos robôs ou não vem sendo feita pelo menos desde o início da era moderna, quando René Descartes se perguntou se ele poderia ter certeza de que os outros – que pareciam e se comportavam como ele – não eram, de fato, autômatos.

Descartes chegou a esse problema porque percebeu que tinha acesso direto em primeira pessoa a seus próprios pensamentos, mas não conseguia entrar na cabeça de ninguém da mesma maneira. O melhor que ele poderia fazer era inferir que estava realmente cercado por companheiros humanos, e ancorar essa crença em uma convicção sobre um Deus bondoso que garantiria que ele não estava sendo enganado.

Porém, deixando de lado o argumento de Deus e focando no nosso entendimento de que não podemos duvidar da existência de nossa própria consciência, ainda podemos nos questionar se somos cérebros em cubas (como em Matrix) ou inteligências artificiais altamente sofisticadas na forma de um robô. De um ponto de vista introspectivo, não podemos resolver este problema. Nem podemos aprender algo perguntando aos outros – eles também podem ser robôs e também não saber disso.

Depois, há a questão do parto. Mulheres que já deram à luz sabem de toda a confusa biologia humana que está envolvida nisso. Mas não podemos descartar que uma raça superavançada poderia construir robôs com anatomias humanas (ou semelhantes à humana). Hipoteticamente, esta fisiologia sofisticada construída poderia enganar dispositivos médicos de imagem também.

Diante dessas e de outras complicações, acho que a saída do dilema é distinguir entre a atitude do ceticismo filosófico, e a perspectiva do pragmatismo cotidiano.

Intelectualmente, parece que podemos analisar esta questão para sempre. Mas para fins práticos – como realizar nossas tarefas e levar os outros (e a nós mesmos) a sério como seres com moral e autonomia – precisamos apenas assumir que somos baseados em carbono, e não em silício. Sem essa crença prática (de que nós somos quem nós acreditamos ser), nós provavelmente ficaríamos paralisados em uma crise de identidade e nos tornaríamos disfuncionais.

Bruce Sterling

Autor de ficção científica, jornalista, teórico

Bem, eu não acredito nessa ideia. Qualquer robô inteligente descobriria em dois minutos que ele não é humano. Ele não pode inspirar, expirar, comer ou excretar. Ele não tem pais, nem memórias de infância e não envelhece. Ele não pode ficar infectado ou doente, e não tem pulso. Ele não dorme, não tem sangue quente, e não tem calor corporal nem impressões digitais.

Assim, mesmo que ele esteja de alguma forma programado com memórias falsas de todas essas qualidades intrinsecamente humanas, o fato de que ele simplesmente não é feito de carne humana viva deve ser óbvio para ele. Se ele é feito de carne humana viva, então ele não é um robô.

Ele pode ser inteiramente uma construção de software e não um ser físico, mas estou inclinado a pensar que você não pode simular um ser humano sem simular o mundo físico que nos cria.

Somos produtos da luz solar, do oxigênio, da chuva, das bactérias dentro de nós. Somos criaturas materiais e encarnadas, como corvos e golfinhos. Estes animais são muito inteligentes, assim como nós, mas se alguém dissesse: “que tal criar um robô que acredita sinceramente ser um corvo?”, essa ideia seria um absurdo.

Susan Scheider

Professora de filosofia e ciência cognitiva na Universidade de Connecticut, membro do Centro Interdisciplinar de Bioética da Universidade Yale, escritora

Descubra se as máquinas podem ser conscientes – se elas podem sentir uma certa maneira de serem elas mesmas. Se não puderem, então você não é uma inteligência artificial de qualquer tipo, incluindo um robô. Isso acontece porque, se você consegue responder a essa pergunta agora, você é um ser consciente.

David Auerbach

Escritor, cientista da computação e ex-engenheiro de software do Google e Microsoft

O absurdo é a marca do ser humano. Se os humanos são seres naturais e robôs são criações artificiais, então qualquer designer que tivesse me criado tem uma abordagem tão arbitrária e ridícula que ele/ela é indistinguível da própria natureza. Então eu não acho que somos robôs no sentido de servir a algum mestre secreto. Somos mal capazes de servir a nós mesmos, muito menos a qualquer outro.

No entanto, mesmo que eu não possa me imaginar sendo um robô no sentido de ter um propósito oculto, há uma ansiedade maior aqui, que é o medo da falta de autenticidade. Acho que é por isso que realmente nos preocupamos com essa questão.

Ser um robô significaria que estamos de alguma forma sendo enganados: que, apesar de nossos sentimentos de sermos livres e autônomos, somos na verdade ferramentas de alguém ou de outra coisa. O que tememos não é ser robôs, e sim que nossa existência seja uma fraude, e que sejamos fraudes.

Talvez sejamos apenas simulações em uma inteligência artificial que foi convidada a projetar o que aconteceria se Donald Trump fosse eleito presidente. Mas se somos criaturas que vivem e respiram, se estamos agindo e sofrendo e vivendo através de um mundo, então esse mundo é tão real como qualquer mundo poderia ser. Chamá-lo de “simulação” não tornaria nossas vidas e nosso sofrimento menos reais.

Se nos comportamos como achamos que os seres humanos fazem, se sentimos e pensamos como os humanos, então nos ajustamos à nossa definição do humano, que é tudo o que temos. Talvez possamos ser robôs, mas ainda somos humanos para todos os fins práticos.

Nossa verdadeira preocupação, então, é que ser um humano não é o que coletivamente pensamos que é – que não vivemos de acordo com nossa própria definição de ser humano. E isso, temo eu, é quase certamente verdade. As culturas tiveram muitos sentidos diferentes da alma, da essência humana e da humanidade, e todas elas estão erradas ou não foram provadas. É improvável que estejamos certos hoje. É improvável que sejamos robôs, mas tampouco somos o que pensamos que somos.

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