Estimular seu cérebro com corrente elétrica pode não deixar você mais inteligente

A ETCC consiste em aplicar uma corrente fraca e constante em certas áreas do couro cabeludo. Muitas pessoas acreditam que ela pode melhorar o aprendizado.

Na última década, um método não-invasivo para estimular o cérebro chamou a atenção de cientistas: nele, os neurônios respondem à corrente elétrica, que muda o funcionamento do cérebro inclusive em pessoas saudáveis.

Trata-se da ETCC (estimulação transcraniana por corrente contínua), que consiste em aplicar uma corrente fraca e constante em certas áreas do couro cabeludo. Muitas pessoas acreditam que isso pode melhorar o aprendizado. Será mesmo?

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Cientistas da Universidade da Carolina do Norte (EUA), liderados por Flavio Frohlich, realizaram um estudo sobre a eficácia da ETCC, e sua metodologia é relativamente simples.

Primeiro, eles deram a todos os participantes um teste de QI amplamente usado. Uma semana depois, eles dividiram as pessoas em dois grupos: um deles passou pela ETCC, recebendo uma corrente fraca de 2 mA por vinte minutos; o outro, não.

ETCC e eletrodos

Imagem via YaleNews

O resultado? A nota de todas as pessoas aumentou, só que o aumento maior esteve no grupo que não passou pela ETCC. Um comunicado à imprensa explica:

Quando Frohlich e colegas analisaram os resultados dos testes, eles viram que as notas para três dos quatro tipos principais de testes cognitivos foram muito semelhantes entre os dois grupos de participantes. Mas as notas de raciocínio perceptual foram muito mais baixas entre as pessoas que passaram pela ETCC.

O raciocínio perceptual testa a inteligência fluida, definida como a capacidade de pensar logicamente e aplicar uma resolução inovadora a novos problemas.

O estudo foi publicado no periódico Behavioural Brain Research. O experimento foi limitado, com apenas 41 participantes, mas serve de alerta: “nós não sabemos quais são os efeitos a longo prazo. Há muito mais coisas que precisamos entender até que a ETCC esteja pronta para uso doméstico sem supervisão médica”, diz Frohlich.

Por que essa preocupação? É que existem vários dispositivos à venda prometendo “fazer overclock no seu cérebro” através da ETCC. É o caso do foc.us, que custa US$ 300. Há também guias na internet para fazer um dispositivo semelhante, e comunidades no Reddit dedicadas ao assunto.

Dispositivo para ETCC

“Isso pode afetar regiões do cérebro que não são alvo do estímulo; e em alguns casos, a estimulação pode prejudicar as funções cognitivas, em vez de melhorá-las, se a polaridade for invertida”, diz a BBC. Isso também pode causar queimação e até piorar seu humor.

É preciso saber quais regiões estimular, com qual intensidade, e por quanto tempo. Em laboratórios, a ETCC é usada em ambientes controlados por no máximo 20 minutos por sessão, e só em participantes que passaram por avaliação médica.

O interesse pela ETCC explodiu em 2000, quando cientistas alemães descobriram que a técnica pode acender as células do cérebro como resposta ao estímulo elétrico.

United States Air Force

United States Air Force

Desde então, surgiram alguns estudos favoráveis para a ETCC. A Força Aérea americana passou a usar a técnica para estimular o cérebro de pilotos: ela reduz pela metade o tempo de treinamento em simuladores.

Em outro estudo, o estímulo ajudou alunos da Universidade Oxford a aprender matemática, com efeitos que duraram seis meses – no entanto, o estudo foi bastante limitado, contando com apenas 25 participantes.

Este ano, a eficácia da ETCC foi duramente questionada. Pesquisadores reuniram os resultados dos últimos 15 anos em estudos sobre a técnica. A conclusão: “parece não haver nenhum efeito confiável da ETCC no controle cognitivo, linguagem, memória, ou outras medidas variadas”.

Ainda assim, mais estudos são necessários: a ETCC parece aliviar dores que não respondem bem a analgésicos convencionais, por exemplo. E outros métodos para estimular o cérebro podem reduzir sintomas da depressão, como o próprio Frohlich descobriu.

Só não espere “fazer overclock” no seu cérebro dando um leve choque prolongado na própria cabeça. [University of North Carolina]

Primeira imagem por Allan Ajifo/Flickr

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