Como é construída a parte do Facebook que ninguém vê (mas um bilhão de pessoas usam)

Uma nova arquitetura está tomando forma em confins gelados e remotos do mundo, feita para as máquinas que mantêm o Facebook funcionando.

Desde que nós, humanos, desistimos da vida nômade e começamos a construir casas, a arquitetura tinha um objetivo: tornar a vida melhor para os humanos. Mas agora, uma nova arquitetura está tomando forma em confins gelados e remotos do mundo, feita… para máquinas. Nesse caso, para os computadores que mantêm o Facebook funcionando.

No norte da Suécia, logo abaixo do Círculo Ártico, arquitetos a mais de oito mil quilômetros do Vale do Silício estão criando uma nova forma de design modular. Eles são liderados por arquitetos como Marco Magarelli, gerente de engenharia de design para data centers no Facebook. Nos últimos cinco anos, ele comandou a incomum abordagem da empresa para seus centros de processamento de dados.

Conforme as empresas de tecnologia competem para construir seus data centers de forma mais inteligente, rápida e barata, elas estão provocando um renascimento na arquitetura modular e pré-fabricada – e o Facebook está à frente. Eu tive a chance de conversar com Magarelli para descobrir como é ser um arquiteto construindo casas para a maior parte das identidades online no mundo.

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Suas selfies estão devorando energia

A maioria das pessoas imagina a internet como algo intangível; mas na verdade, ela está presa ao mundo físico por centros de processamento de dados. Há milhares deles para lidar com todos os bits e bytes que chegam a seu computador.

Magarelli usa o termo “caixa mágica” para descrever esses espaços: muitas pessoas não sabem muito bem como ou onde esses data centers existem. E o trabalho dele, como arquiteto, é “tentar fazer essa caixa o mais elegante e efetiva possível”, explica ele.

As caixas mágicas do Facebook deveriam ser construções bastante simples. Basta reunir alguns servidores, alguns sistemas mecânicos para esfriá-los, garantir que eles estejam seguros e pronto, certo?

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Não exatamente. Como me explica Magarelli, elas estão longe de ser edifícios normais: alguns data centers usam mais de cem vezes a energia de um prédio de escritórios. Eles precisam ser ultra seguros e ultra estáveis contra hackers, contra desastres naturais e contra todo tipo de problema ambiental. Afinal, eles guardam os dados do mundo – e não estamos falando aqui apenas do Facebook. Se eles forem destruídos, sua internet também será. Por isso mesmo, há um movimento de expansão: espera-se que o mercado para data centers modulares chegue a US$ 40 bilhões nos próximos quatro anos.

O Facebook, como segundo site mais visitado do mundo – perdendo apenas para o Google – precisa de muitos deles. De acordo com a rede social, seus usuários curtem seis bilhões de coisas por dia e já compartilharam um total de 400 bilhões de fotos. Toda essa atividade se soma ao que já é um monte de dados. Em 2012, o Facebook disse que, por mês, seus usuários consumiam cerca de sete petabytes de armazenamento só em fotos.

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Há dois anos, para lidar com esse aumento exponencial na demanda, o Facebook contratou três engenheiros que enfrentaram o desafio de “dimensionar nossa infraestrutura de computação da forma mais eficiente e econômica possível”. Isso ficou conhecido como Open Compute Project, uma iniciativa para reformular completamente a infraestrutura de hardware e rede dos data centers do Facebook. E o mais importante, eles colocariam todo o trabalho deles online: qualquer outra empresa poderia seguir o exemplo do Facebook.

A equipe do OCP reprojetou completamente todos os detalhes, incluindo racks de servidores mais eficientes, e também baterias de reserva – para que os centros não precisem de uma fonte ininterrupta de energia. E tão importante quanto toda essa arquitetura de rede, é a arquitetura física.

Construindo prédios como se fossem mobília

Magarelli entrou no Facebook em 2009 e, como parte do Open Computing Project, ele organizou uma espécie de hackathon para trazer ao Facebook especialistas em lean construction, ou construções enxutas – uma teoria emprestada das fábricas e aplicada na eficiência da construção.

Desse evento surgiram dois conceitos básicos. A primeira estratégia seria algo como “montar um carro em um chassi”. Você constrói a sua armação estrutural, então encaixa nela todos os componentes de verdade, das luzes aos cabos, usando uma linha de montagem em uma fábrica. Depois, tudo deve ser transportado na traseira de um caminhão até o edifício.

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O segundo esquema tem a ver com montagem. O servidor não vem pré-montado de fábrica; em vez disso, seus módulos vêm dentro de uma caixa bem compacta. Tal e qual as partes de uma estante, os componentes são bastante simplificados e universalizados para evitar erros durante a montagem. Ao decompor a construção em partes simples e universais, todo o processo ficaria mais barato, rápido e fácil.

Dessas duas ideias nasceu o Rapid Deployment Data Center, ou RDDC, que é como o Facebook chama o design de seus centros de processamento. Uma série de módulos pré-montados são enviados para o local e instalados em uma velocidade incrível, usando o melhor das estratégias que mencionamos acima.

Coisas estranhas acontecem sob o sol da meia-noite

Esse ano, o Facebook vai ter uma chance de testar a ideia do RDDC: a rede social anunciou um novo projeto de construção em Luleå, na Suécia, vizinho de seu data center mais recente.

Luleå, uma cidade de 46.600 habitantes e muitas bandas famosas de black metal, fica muito acima na costa do Báltico, tão acima que é quase na Finlândia. As temperaturas em Luleå nunca sobem muito: o mês mais quente, julho, tem uma temperatura média de 16,1°C. Em fevereiro, -14,4°C é regra. Essas temperaturas subárticas são uma dádiva para as empresas de data center, que gastam milhões de dólares pra manter frios seus servidores enquanto eles trabalham arduamente.

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Mas não é só o frio que leva o Facebook para lá: é também a infraestrutura de energia da Suécia, uma das mais confiáveis do mundo. E ela vem de fontes renováveis, o que é uma grande vantagem para o Facebook, que comprou diversas usinas eólicas nos EUA para alimentar seus data centers locais.

Luleå 2 será o primeiro data center da companhia a usar o conceito RDDC de pacotes compactos de Magarelli. Ele será uma espécie de experimento, uma forma de testar ideias que o OCP e a equipe de Magarelli vêm desenvolvendo desde o “hackaton”. E, quando estiver pronto e funcionando, a equipe irá estudar o caso e, em seu próximo projeto, aplicar tudo o que aprender.

A caixa mágica

Acredite ou não, o trabalho de Magarelli e sua equipe no Facebook tem um precedente de mais de um século atrás. “Eu pensei na Revolução Industrial e em como os edifícios se adaptaram às indústrias que nasciam”, ele diz. “O que faz uma usina de energia, ou uma fábrica de papel, serem como são? Todos esses arquétipos evoluíram pra satisfazer necessidades industriais”.

Na virada do século passado, à medida que a Revolução Industrial tomava a Europa e os EUA, nascia um novo tipo de edifício: a fábrica. Ela se tornou um símbolo entre arquitetos que procuravam uma nova abordagem para construções. As fábricas eram resistentes, baratas, rápidas de serem construídas e, de vez em quando, eram até mesmo bonitas. Acima de tudo, porém, elas eram construídas com base em sua função, em vez da forma.

Mesmo assim, algumas fábricas até se tornaram famosas entre designers: a fábrica de turbinas da AEG, em Berlim, ainda hoje é tema de aulas para jovens arquitetos. É que havia um fluxo livre para a troca de ideias entre o design industrial e o design de vanguarda.

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É difícil não ver os paralelos entre as fábricas e os centros de processamento de dados. Cada tipo de construção é projetada pra atividades comerciais bastante específicas, e cada uma tem que se manter dentro de orçamentos e calendários estritos. Ambas são perfeitamente utilitárias, feitas para funcionar.

Ainda assim, os designers conseguem soltar a imaginação dentro das regras e exigências da arquitetura comercial. O data center, assim como a fábrica do século XIX, é um “tipo completamente novo de edifício”, acrescenta Magarelli.

Para a maioria de nós, a internet transforma a bagunça do mundo físico em algo intangível, que não deixa rastro no mundo real. Então, é estranho pensar que quando bilhões de pessoas se debruçam no computador, focadas em um mundo completamente invisível, elas estão usando uma infraestrutura bastante tangível.

Todos os nossos cliques, uploads e curtidas forçaram o Facebook a inventar um tipo diferente de edifício: uma caixa mágica que poucos de nós veremos, mas que será usada por mais de um bilhão de pessoas.

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Fotos por Luleå Data Center/Facebook; foto inicial por AP Photo/Facebook, Alan Brandt.

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