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Facebook tenta oferecer internet gratuita sem ferir a neutralidade de rede

Mais sites estarão disponíveis através do Internet.org: eles podem se candidatar para chegarem a usuários mais pobres, que não pagam para acessá-los.

Em 2013, o Facebook lançou uma iniciativa para conectar o mundo inteiro à internet: trata-se do Internet.org, que vem fazendo parcerias em países como Quênia, Colômbia e Índia para que pessoas se conectem de graça a determinados sites.

Daqui em diante, mais sites estarão disponíveis através do Internet.org: ele acaba de se tornar uma plataforma, ou seja, outros serviços podem se candidatar para chegarem a usuários mais pobres, que não têm condições de pagar por acesso à internet.

Há algumas regras para entrar no Internet.org. Sites que consomem muitos dados ficarão de fora, incluindo streaming de vídeo e download de arquivos. Eles também precisam ser otimizados para navegação em celular, incluindo dumbphones.

Para oferecer esses serviços sem custo, o Facebook faz parcerias com operadoras móveis em países pobres. Por isso, a operadora pode decidir quais sites vai liberar de graça ou não.

Não é só isso: qualquer um pode criar um app para o Internet.org, mas ele precisa ser aprovado pelo Facebook. Ele também deve permitir que o Facebook rastreie usuários e compartilhe esses dados com as operadoras e o governo. Além disso, não há suporte a criptografia.

O Internet.org está presente na Zâmbia, Tanzânia, Quênia, Colômbia, Gana, Guatemala, Filipinas e Índia. Ele conta com apoio da Samsung, Nokia, Qualcomm, MediaTek, Ericsson e Opera.

Há planos ambiciosos de espalhar drones para oferecer acesso à rede em países pobres. Por enquanto, o projeto oferece acesso a determinados sites locais voltados para notícias, classificados, saúde, esportes, livros, entre outros. A lista varia dependendo do país, mas há quatro sites oferecidos em todos eles: a Wikipédia; o Accuweather (previsão do tempo); e, obviamente, Messenger e Facebook.

E a neutralidade?

O Internet.org obviamente não é apenas um ato de bondade vindo do Facebook: é uma forma de atrair mais usuários. E no processo, a rede social acaba atropelando princípios como a neutralidade de rede.

A neutralidade de rede defende que todo tráfego da internet deve ter a mesma prioridade. Isso significa que seu provedor não pode reduzir a velocidade do YouTube ou de torrents; isso também significa que não se deve dar tratamento especial para determinados sites – como os parceiros do Internet.org.

Afinal, isso permite alguns cenários bem indesejáveis. Suponha que alguém desenvolva uma rede social na Tanzânia: tanto o Facebook como a operadora têm o poder de barrá-la do Internet.org. E se é preciso pagar para acessar essa rede, melhor ficar com o Facebook, que todo usuário do Internet.org pode acessar sem custo.

É uma internet limitada na qual o Facebook tem um poder desproporcional. E de quebra, eles ainda ficam de olho no que você está usando. Nós realmente queremos dar mais poder para essa rede social?

Críticas

Na verdade, o Internet.org sofreu duras críticas na Índia por causa disso. O app foi lançado em fevereiro; em abril, várias empresas de destaque – como a gigante da mídia Times Group – reduziram seu apoio ao projeto.

O país está em uma discussão calorosa sobre a neutralidade de rede, depois que a TRAI (espécie de Anatel indiana) abriu consulta pública para regulamentar o assunto. Eles receberam meio milhão de e-mails com propostas.

Mark Zuckerberg respondeu dizendo que, “para pessoas fora da internet, ter alguma conectividade e alguma chance de compartilhar é sempre muito melhor do que não poder se conectar e compartilhar”. Este ano, ele já havia dito que “a parte mais cara a respeito de possuir um smartphone e estar conectado à internet não é o smartphone; são os dados”.

As críticas continuaram, e o Internet.org hoje virou uma plataforma mais aberta: parece ser uma tentativa de suavizar a controvérsia, mas não deve resolvê-la. Oferecer acesso limitado desafia a ideia de uma internet livre e aberta, só que oferecer acesso gratuito para todos é impossível. Zuckerberg diz:

É muito caro tornar gratuita a internet inteira. As operadoras móveis gastam dezenas de bilhões de dólares para aguentar todo o tráfego de internet. Se tudo fosse gratuito, elas decretariam falência.

Roberto Stuckert Filho/PR/Flickr

No Brasil

Em abril, Zuckerberg se encontrou com a presidente Dilma Rousseff para discutir como oferecer acesso gratuito a certos serviços da web – incluindo, é claro, o Facebook – para a população de baixa renda e de áreas distantes do país.

Um projeto piloto está sendo desenvolvido pelo Facebook em Heliópolis, um bairro de baixa renda na cidade de São Paulo, mas ainda há poucos detalhes. Mesmo assim, as críticas já estão se acumulando: há cerca de um ano, foi aprovado o Marco Civil da Internet – e um de seus principais pilares é a neutralidade de rede.

A Proteste e outras 33 entidades que participam da campanha Marco Civil Já entregaram uma carta à presidente criticando a parceria com o Facebook:

Ao prometer o “acesso gratuito e exclusivo” a aplicativos e serviços, o Facebook está na verdade limitando o acesso aos demais serviços existentes na rede e oferecendo aos usuários de baixa renda acesso a apenas uma parte da internet…

No longo prazo, isso pode gerar concentração dos serviços de infraestrutura, de acesso à internet e conteúdo, restringindo a liberdade de escolha do usuário.

Em entrevista, Dilma diz que Zuckerberg volta ao Brasil “em junho e aí vai discutir o modelo”, que deve contar com a participação de movimentos sociais – assim como foi no Marco Civil. É esperar para ver. [Internet.org]

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