A inovadora terapia contra o câncer que usa bactérias para invadir tumores

A bactéria modificada funcionou para reduzir o câncer em ratos, aumentando a esperança para testes em humanos

Pesquisadores da Coreia do Sul desenvolveram um tipo de bactéria que invade tumores e convence o sistema imunológico do corpo a atacar células cancerígenas. Em experimentos, a bactéria modificada funcionou para reduzir o câncer em ratos, aumentando a esperança para testes em humanos.

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Em um estudo publicado no Science Translational Medicine, um time de pesquisadores liderado pelos biólogos Joon Haeng Rhee e Jung-Joon Min, da Universidade Nacional de Chonnam, na Coreia do Sul, descreveu uma nova imunoterapia na qual uma estirpe feita em laboratório da bactéria Salmonella é convertida em uma versão biológica do mito do Cavalo de Troia. Depois de entrar em um tumor desavisado, a bactéria modificada transmite um sinal que ativa as células imunes próximas a atacar as células malignas.

Em testes preliminares, a técnica diminuiu tumores em mais da metade dos ratos que receberam as injeções de bactéria. É preliminar, mas os pesquisadores estão esperançosos de que essa forma de imunoterapia será tanto efetiva quanto segura em humanos.

A terapia que usa bactérias contra o câncer data de 1893, quando o cirurgião William B. Coley percebeu que tumores recorrentes em tecidos conjuntivos, chamado sarcoma, desapareceram depois que os pacientes foram infectados com a bactéria Erysipelas. O que o levou a desenvolver a terapia agora chamada “Toxinas de Coley”, que utiliza diversas bactérias para combater o câncer. Essa linha de pesquisa sobre o câncer, no entanto, ficou hibernando quando as terapias cirúrgicas e químicas surgiram.

Desde 2008, o tratamento bacteriano contra o câncer tem passado por uma renascença. Algum sucesso nessa área tem sido anunciado, particularmente quando cientistas usam Salmonella modificada como mecanismo de entrega de agentes terapêuticos no corpo, como genes e remédios anti-cancerígenos. As bactérias têm uma habilidade natural de ir direto para os tumores, tornando-os ótimos agentes de transporte. Infelizmente, todas as terapias de bactéria contra o câncer necessitam de múltiplas injeções dos micróbios, e recaídas são comuns.

Em um esforço para desenvolver um método melhor, Rhee e Min pegaram uma estirpe da Salmonella typhimurium e a deixaram 10.000 vezes menos tóxica que o normal, enquanto mantiveram a habilidade da bactéria de continuar viva e capaz de transportar outros agentes. Diferentemente de outros esforços, a bactéria modificada não foi desenvolvida para entregar remédios; em vez disso, ela foi desenvolvida para entregar uma mensagem importante para células imunes próximas, que diz: “ataque esse tumor!”.

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Crédito: Chonnam National University

Especificamente, a bactéria Salmonella é geneticamente modificada para secretar uma proteína estranha conhecida como flagelina (FlaB). Essa proteína, encontrada em um micróbio aquático chamado Vibrio vulnificus, é a forma básica do flagelo, um apêndice parecido com um chicote que permite que os microorganismos se movimentem nadando. Já que animais vertebrados, incluindo humanos, não possuem flagelos, essa proteína é estranha às nossas células. Quando glóbulos brancos vorazes conhecidos como macrófagos detectam a presença dessas proteínas estranhas, eles imediatamente as percebem como “perigo” e entram em ação.

Macrófagos são como Roombas microscópicos, aspirando tudo que parece que não deveria estar lá, incluindo restos celulares, substâncias estranhas, vírus e bactérias indesejadas e, mais importante, células cancerígenas. Mas os macrófagos nem sempre enxergam tumores como uma ameaça, dada a presença de marcas identificáveis, como proteínas familiares associadas com células saudáveis. A bactéria modificada, estacionada dentro do tumor com sua carga alienígena, basicamente convence as células imunes a lançar um ataque, ativando uma resposta imune. Os macrófagos então, alegremente, começam a devorar as células malignas.

Os pesquisadores testaram sua bactéria cavalo de troia em ratos com câncer de cólon. Três dias depois das injeções, a bactéria dentro dos tumores era 10.000 vezes mais abundante do que as encontradas nos órgãos vitais das cobaias. Os macrófagos então rapidamente começam os trabalhos, fazendo os tumores encolherem a níveis abaixo dos detectáveis em mais da metade dos ratos.

“Nós documentamos a total erradicação de tumores em aproximadamente 60% das cobaias tratadas”, explicaram Rhee e Min, em entrevista ao Gizmodo. “Os 20% restantes dos animais continuaram estáveis”, o que quer dizer que não morreram, “apesar dos tumores terem diminuído de tamanho”.

Mais importante ainda, a bactéria com o FlaB se mostrou não-tóxica e não invadiu tecidos não cancerígenos nos roedores. Pelo contrário, a Salmonella, armada com o FlaB, diminuiu os tumores, prolongou a sobrevivência dos ratos e preveniu o ressurgimento novos crescimentos de tumores.

“Nós não usamos nenhuma medicação adicional ou quimioterapia”, disseram Thee e Min, acrescentando que sua terapia bacteriana pode ser combinada com outras técnicas anti-câncer, como radiação e quimioterapia.

Se essa forma de imunoterapia alcançar o estágio clínico (e esse é um grande “e se”; estudos com ratos são conhecidamente não confiáveis), os pesquisadores não enxergam as injeções comuns como o tratamento apropriado.

“A bactéria pode ser injetada repetidamente, se necessário”, notaram os pesquisadores. “Mas nós não encorajamos a repetição contínua da terapia, já que o sistema imunológico humano vai criar respostas imunes antibacterianas depois de diversas aplicações da mesma bactéria”. Uma resposta antibacteriana impediria a Salmonella de proliferar na região do tumor, o que quer dizer que o tumor não estaria mais marcado para ser destruído.

Para lidar com esse problema, os pesquisadores planejam usar diferentes estirpes com marcas biológicas distintas, se repetidas injeções forem necessárias em alguns casos.

É cedo demais para dizer se esse tratamento vai ser efetivo e seguro em humanos, mas esses resultados preliminares são encorajadores. Rhee e Min dizem que a técnica deve funcionar para outros cânceres, incluindo de mama, glioma, melanoma e de pulmão. “Isso é mais um estudo de prova de conceito”, afirmaram os pesquisadores.

“Estamos planejando testes pré-clínicos no futuro mais próximo. Se encontrarmos os parceiros certos que nos deem financiamento suficiente, testes clínicos possivelmente podem começar muito em breve”.

[Science Translational Medicine]

Imagem do topo: NIH

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