A epidemia da distração digital (ou “Como prender a atenção de alguém por cinco–opa, notificação nova no Facebook!”)

…E lá estava eu, no alto de doze andares e sendo perseguido por dois caras armados, quando o prédio ia chegando ao fim à medida que eu corria, uma situação que me deixava com apenas duas opções: me esconder e chorar ou saltar até o teto do prédio vizinho. Sem perder o embalo, eu tentei […]

…E lá estava eu, no alto de doze andares e sendo perseguido por dois caras armados, quando o prédio ia chegando ao fim à medida que eu corria, uma situação que me deixava com apenas duas opções: me esconder e chorar ou saltar até o teto do prédio vizinho.

Sem perder o embalo, eu tentei o pulo. As minhas mãos chegaram ao próximo prédio, mas os meus pés ficaram no quase. Então eu fiquei lá, balançando, em em breve momento de inabilidade, e tudo que ouço é o som do meu iPhone ricocheteando na quina de um contêiner de lixo lá em baixo…

Essa parece ser uma boa maneira de começar um post sobre como é difícil conseguir e manter alguns momentos de atenção nesta era de dedos hiperativos e olhos em constante procura de algo mais e mais interessante. Uma era em que escrever dois tweets seguidos sobre um mesmo assunto pode ser considerado o equivalente escrito a um longa metragem.

Quase ninguém mais faz uma coisa de cada vez. As telas não permitem. E em um sopetão de evolução humana, as nossas mentes se acostumaram a monitorar múltiplas fontes de informação ao mesmo tempo. Sim, você está lendo este texto. Mas já estamos no quarto parágrafo. Se você for minimamente como eu, já está na hora de dar uma olhada no Twitter, ver as notificações no Facebook, ver quem te “circulou” no Google Plus e responder aquelas 3 ou 4 janelinhas do MSN/GTalk que estão piscando. Mas espere.

…Durante as minhas aulas de educação física, eu mal conseguia fazer meia flexão. Eu não sou o cara certo para estar pendurado em um prédio de doze andares. Quando eu acordei hoje de manhã, era apenas um escrito de investidor de tecnologia, protegido pelo brilho do meu monitor de 27 polegadas. Como vim parar aqui? Bem, longa história. E longas histórias não funcionam muito bem na internet. Além do mais, uma das minhas mãos escorregou e agora só quatro dedos evitam que eu me torne um contorno de giz na calçada…

Esses dias de manhã, minha esposa estava ocupada com várias tarefas do trabalho em seu laptop, quando a nossa filha de dois anos correu pela sala e mergulhou no sofá, fechando por acidente a tampa do computador. Sem olhar para cima, a minha esposa reabriu o laptop e disse, “Não pule no sofá quando a mãe estiver trabalhando, Jen.”

Só que a nossa filha não se chama Jen.

Está ficando cada vez mais difícil se concentrar em qualquer coisa, mesmo as que são claramente mais importantes. A minha filha é muito novinha para nos enviar um aviso por email de que ela vai pular no sofá, mandar um tweet do meio do ar e publicar um vídeo no YouTube do seu voo enquanto se aproxima da aterrissagem no sofá. Mas isso é o que é necessário para conseguir a nossa atenção irrestrita. A fulaninha não tinha chance.

Dia desses, perguntei para o meu filho se ele preferia que eu ou a mãe dele o levasse até o ônibus para o primeiro dia do jardim de infância. Ele respondeu: “Quero que o iPad me leve.” E quem pode culpar o menino? Os seus pais são no máximo o equivalente a um único app.

…Enquanto os meus dedos branquelos se preparam para desistir, eu sinto uma grande e forte mão no pegando pelo pulso. Alguém está tentando me puxar. Sendo assim, eu faço o que qualquer judeu neurótico faria nesta situação. Eu desmaio…

A Verizon frequentemente foca seus comerciais do iPhone naquilo que a empresa enxerga como uma de suas maiores vantagens: você pode fazer chamadas e navegar na internet ao mesmo tempo.

Faz sentido. Quer dizer, você se imagina fazendo só uma dessas coisas? Sim, isso acontece quando você está dirigindo, andando em uma rua movimentada ou ensinando o seu filho a andar de bicicleta, mas em situações normais, parece até burrice perder esse tipo de tempo unitasking.

…Uma lâmpada brilha sozinha e não muito forte, pendurada no teto de uma sala que se não fosse por ela estaria escura e mofada. Eu vejo um rosto perfeito logo acima do meu; cascatas de glitter caindo por entre os seus longos cabelos dourados enquanto ela acaricia o meu rosto e me pede: “Say my name”. Ela sussurra, “Say my name”.

“Beyoncé?”…

Eu tenho três amigos que são talentosos e bem sucedidos romancistas. Dois deles cortaram completamente o acesso à internet em suas casas. O outro deixa seus gadgets em casa e vai para um café sem Wi-Fi, com uma caneta e uma pilha de papel por várias horas por dia. Eles sabem que mesmo as suas impressionantes habilidades de concentração não conseguem competir com um computador conectado.

As estratégias deles estão funcionando por enquanto, mas a internet em tempo real está se esgueirando. Todos eles têm filhos, e os outros pais querem poder remarcar da última hora os planos de um ir brincar na casa do outro, então ele compraram smartphones. As suas editoras exigem que eles usem mídia social para promover as suas obras, então eles entraram no Twitter e no Facebook. Seus olhos marejaram quando eu falei que o Google lançou uma nova rede social.

Eles podem pressentir o inevitável. Os luditas estão com os dias contados. Eles podem fugir, mas não podem se esconder.

…Eu pisco com força algumas vezes. Ouço uma voz dizer, “uau, esse cara tá mal mesmo”. Então eu sinto um iPad (o da primeira geração, mais pesado) me acertar na cabeça. A próxima coisa que eu me lembro de ver é o interior de um porta-malas…

Recentemente eu ouvi a proposta do fundador de uma empresa que, como muitas start-ups atuais, tem o objetivo de capturar uma boa porcentagem do mindshare das pessoas sobre a segunda tela. A segunda tela é como os caras de mídia chamam o seu computador quando você está assistindo TV. Para eles, a ideia de que você está só assistindo TV, sem fazer mais nada ao mesmo tempo, soa tão provável quanto você estar lendo hieroglifos com uma tocha.

O fundador descreveu uma situação. Digamos que você está assistindo ao último episódio de Mad Men. Nós podemos te conectar a milhares de outras pessoas que estão assisindo ao mesmo tempo. Você pode discutir o episódio, publicar opiniões e propor enquetes. Enquanto isso, nós varremos a web e entregamos as últimas fofocas e notícias sobre o John Hamm, para que você leia enquanto assiste ao episódio.

Eu olhei para ele e disse: “Me fala a verdade. Você não gosta mesmo de TV, né?”

A ideia de ler fofocas sobre o John Hamm enquanto se assiste a um programa tão bom quanto Mad Men pode parecer louca, mas a verdade é tanto eu quanto a minha mulher quase sempre assistimos TV com os nossos laptops abertos. E nós somos mais velhos do que o público alvo dessas empresas. Vários amigos já me disseram que os seus filhos adolescentes absolutamente nunca assistem TV, mesmo quando eles alugam um filme de ação. Alguma outra tela está sempre ligada.

Se você é um criador de conteúdo, você tem algumas opções. Pode criar conteúdo que seja simples o bastante para ser facilmente absorvido durante uma série de curtas passadas de olho dos telespectadores cuja atenção está dividida, pode tentar fazer com que o seu conteúdo seja tão absurdamente incrível que mesmo o melhor representante da Geração Tempo Real não consiga tirar os olhos dele (estou falando aqui de programas como Game of Thrones, que é essencialmente uma hora de nudez frontal intercalada com decapitações explícitas), ou pode ainda oferecer conteúdo de segunda tela para atacar dos dois lados.

Mas onde eu quero chegar com essa pilha de palavras, enquanto estou há quatro parágrafos da minha última cena de ação?

…Água fria como gelo bate na minha cara e eu acordo descobrindo que o meu peito está amarrado a uma cadeira de frente para uma mesa nova da Ikea, vazia a não ser por um bloco de papel amarelo e um lápis número 2 perfeitamente apontado. Do outro lado da mesa, vejo um semi-círculo de caras meio nerds, cada um segurando uma pistola em uma mão e um iPhone na outra…

Há não muito tempo, um cara que atende por Lezevo e frequentemente compartilha no YouTube vídeos dele jogando Call of Duty, decidiu compartilhar os detalhes do seu divórcio recém-finalizado. Alguém tão acostumado com jogos de tiro imersivos como Lazevo sabe o quão improvável é as pessoas pararem para ouvir treze minutos de alguém falando sobre uma união que ruiu. Então ele gravou a sua voz e colocou por cima de um vídeo em que ele mesmo, no jogo, atirava contra prédios, derrubava helicópteros e criava uma trilha de sangue com seus inimigos. O espectador é entretido pelas explosões e batalhas cheias de ação, enquanto o homem abre o seu coração sobre os altos e baixos que levaram à implosão do seu casamento. Kaboom.

Além de inventar uma metáfora bastante satisfatória para a sensação causada por muitos divórcios, Lazevo pode ter criado o manual de instruções que precisamos sobre como pensar sobre compartilhar detalhes da nossa vida. O conteúdo pode ser extremamente pessoal. A audiência ainda pode ser completamente pública. E depois que você passa de 140 caracteres, não vai conseguir prender a atenção de ninguém sem metralhadoras.

…O nerd diretamente à minha frente clica a sua arma e a aponta para o bloco de anotações em cima da mesa. “Dave”, diz ele, “Nós precisamos do próximo post”. Eu agora reconheço esses editores e leitores e vozes na minha cabeça, e imediatamente reclamo que tenho estado bastante ocupado ultimamente e que recentemente tive um bloqueio criativo de escrita muito forte.

“Você enviou 12.000 emails, publicou 1.800 tweets e mandou 30.000 palavras via instant messenger desde a última vez que nos enviou um trabalho. É isso que você chama de bloqueio criativo de escrita?”

Todos eles riem, enquanto olham alternadamente para mim e para as telas dos seus iPhones.

“Desculpa, camarada. Você vai sentar aí e vai escrever até que tenha algo pra gente postar. Sem twittar, sem navegar, sem telas, sem Angry Birds, nada, até acabar.”

Eu pego o lápis de cima da mesa. Antes de começar a escrever, preciso saber uma coisa: “Então, quer dizer que a Beyonce não fez parte disso, afinal?”

“Nah. Mas você deveria incluí-la no seu post mesmo assim. Chama atenção.”

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