A história de Sebastião Salgado vista por 20 fotos que consagraram o fotógrafo

Sebastião Salgado largou o emprego de economista para se aventurar na fotografia e se tornou um dos maiores nomes da história. Veja 20 fotos marcantes
Imagem: Sony Pictures/Reprodução

Sebastião Salgado, o maior fotógrafo brasileiro, morreu nesta sexta-feira (23), aos 81 anos, em Paris. De acordo com a família, ele morreu em decorrência de complicações da malária, doença que contraiu na Indonésia em 2010.

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À época, Sebastião Salgado produzia seu Projeto “Gênesis”, que visitava os lugares mais inóspitos do planeta. “Gênesis” é o penúltimo grande trabalho de Sebastião Salgado desde quando o fotógrafo mergulhou na fotografia documental.

A tribo dos nenetses, da Sibéria, fotografada por Sebastião Salgado em 2011 para o projeto “Gênesis”. Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

Contudo, a gênese de Sebastião Salgado não começou diretamente na fotografia. Nascido em Aimorés, Minas Gerais, Sebastião Salgado Júnior é o único homem entre sete mulheres, recebendo, portanto, o nome do seu pai.

Sebastião Salgado documenta a história do Brasil

O nordeste do Brasil pelas lentes do fotógrafo. Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

O início

Aimorés, no Vale do Rio Doce, se ligava ao Brasil pela estrada de ferro da Companhia Vale do Rio Doce. A fazenda onde nasceu Sebastião Salgado pertencia à sua família por gerações.

“Minha infância ainda é, para mim, um período fabuloso. Continuo nutrindo um amor imenso por aquela terra”, afirma Salgado no livro Da Minha Terra à Terra, de 2013.

O livro conta a trajetória de Sebastião Salgado desde o interior de Minas Gerais até ganhar o mundo com suas fotografias. Aliás, há coincidências extraordinárias em sua história.

Sebastião Salgado, o pai, se envolveu na luta política, defendendo o grupo político de Minas Gerais na Revolução de 1930. O filho, documentou a Revolução dos Cravos, que derrubou a ditadura Salazarista de extrema-direita em Portugal.

Seu avô, comerciante, morreu de malária e “em um lugar bem longe de casa, a dois ou três meses de distância”. Sebastião Salgado morreu na França, a mais de oito mil quilômetros de Minas Gerais, onde se radicou desde 1969.

Sebastião Salgado se formou em economia e trabalhou como secretário da Aliança Francesa em Vitória, no Espírito Santo, onde conheceu sua esposa, Lélia Wanick Salgado, em 1964.

Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

De economista a fotógrafo

Contudo, veio a ditadura, que obrigou o então economista a migrar para a França, em 1969. Lélia cursava arquitetura na França e precisava fotografar alguns prédios. Ela compra uma Pentax Spotmatic II, com uma lente objetiva Takumar de 50 mm.

Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

A lendária câmera japonesa  transformou a vida de Sebastião Salgado em 1973, quando precisou usá-la em uma viagem de trabalho na África.

Na viagem, Lélia estava grávida do primeiro filho do casal. Ela não comeu uma carne contaminada durante uma passagem pelo Níger, mas o fotógrafo comeu. Resultado: toxoplasmose. Portanto, ao mesmo tempo que Sebastião Salgado começa sua carreira como fotógrafo, os percalços aparecem.

“Uma de minhas imagens agradou muito ao CCFD (Comitê Católico contra a Fome e para o Desenvolvimento): uma mulher à contraluz, perto de uma árvore, levando um pote na cabeça. O CCFD decidiu fazer um pôster dessa foto e com ela ilustrar a campanha “La terre est à tous” [A terra é de todos]. Assim, minha fotografia foi afixada em todas as igrejas da França.”

A primeira fotografia premiada. Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

Sebastião Salgado, com o dinheiro da fotografia, comprou todas as câmeras da marca alemã Leica, de 24 x 36 mm, que o acompanharam até a era digital.

Imagem: Sony Pictures/Reprodução

“Outras Américas”: Sebastião Salgado começa a desbravar o continente

História da teologia da libertação na América Latina por Sebastião Salgado

Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

Apesar do começo da sua carreira ser documentando o sofrimento ex-colônias francesas e belgas da África, Sebastião Salgado se encontra enquanto fotojornalista bem perto de casa.

“Para alguns, sou um fotojornalista. Não é verdade. Para outros, sou um militante. Tampouco. A única verdade é que a fotografia é minha vida. Todas as minhas fotos correspondem a momentos intensamente vividos por mim.”

Aliás, um desses momentos intensos começa em 1977, quando Sebastião Salgado decide conhecer as veias abertas da América Latina.

Sebastião Salgado fotografa velório de criança no Nordeste

Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

“As diversas regiões da América do Sul eram diferentes do Brasil, mas eu precisava senti-las. Desde pequeno, sempre ouvira falar das montanhas do Chile, da Bolívia, do Peru. Elas faziam parte de meu universo onírico. Eu precisava conhecê-las, vivê-las. Foi o que fiz — e voltei várias vezes entre 1977 e 1984. Também visitei o Equador, a Guatemala e o México.”

No Equador, Sebastião Salgado conheceu um padre, que o permitiu explorar o país e outras áreas dos Andes, se aproximando de grupos indígenas, camponeses e da igreja católica.

Freira alfabetiza camponês no Equador. Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

Com suas Leicas, Sebastião Salgado registrou fotos que ficaram na história dos países da América do Sul. Porém, o auge seria na volta para casa.

Fotógrafo Sebastião Salgado registra os Andes

Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

“Serra Pelada”: o retorno ao Brasil

Fotógrafo Sebastião Salgado vai ao Nordeste

Casamento em Juazeiro. Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

Em 1979, a Lei da Anistia permitiu que Sebastião Salgado voltasse ao Brasil e o fotógrafo já começou fotografando as comunidades indígenas, os trabalhadores, e o sertão.

Dimensão da Serra Pelada. Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

O retorno de Sebastião Salgado ao Brasil e as famosas imagens da Serra Pelada são, também, um retorno do Sebastião Salgado de Minas Gerais. Serra Pelada, que provocou uma corrida do ouro no país, foi descoberta em 1980.

Fotos da história da Serra Pelada pelo fotógrafo Sebastião Salgado.

Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

No entanto, a Ditadura Militar proibia o acesso do fotógrafo. Com a redemocratização, a mina passou para a Cooperativa dos Garimpeiros, em 1986. Neste ano, graças a um amigo do pai de Sebastião Salgado, que era um dos milhares de proprietários de terra, o fotógrafo pôde visitar o local.

“No dia em que cheguei, um garimpeiro me perguntou de onde eu vinha. Respondi: “Do Rio Doce”, pois este é o nome de meu vale natal. Sem que eu percebesse, imediatamente se espalhou pela mina o rumor de que eu havia sido enviado pela empresa Vale do Rio Doce, que era a proprietária legal da concessão. Essa companhia (hoje chamada Vale) tira seu nome do vale em que nasci, onde é proprietária das maiores minas de ferro do mundo.”

Novamente, com a Leica e a Pentax, com os filmes Tri-X 400 da Kodak para as câmeras 24 x 36, Sebastião Salgado registrou uma imagem que chamou a atenção do cineasta alemão Wim Wenders.

Fotografia que chamou atenção de Wim Wenders. Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

No início dos anos 1990, Wim Wenders se esbarrou com uma imagem mostrando “a febre do ouro” em uma galeria. O cineasta comprou a cópia e dirigiu o documentário “O Sal da Terra”, sobre o trabalho de Sebastião Salgado.

Do digital ao analógico, mas sem perder a ternura

Tuareg cega. Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

O documentário de 2014 mostra toda a trajetória de Sebastião Salgado, contendo entrevistas com o pai do fotógrafo, que como todo matuto, não entendia inicialmente por que o filho deixou de ser “doutor”. Além disso, o filme acompanha os projetos de Sebastião Salgado e sua transição do analógico para o digital.

“No meio do Projeto “Gênesis”, passei do analógico para o digital. Uma revolução. Ainda mais porque, para esse projeto, eu já havia enfrentado dois grandes desafios: fotografar o que até então nunca havia fotografado — paisagens e animais —, e mudar o formato do filme.”

Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

Em 2008, a Canon cedeu uma câmera digital a Sebastião Salgado, que, segundo o fotógrafo, não mudou nada em seu trabalho.

“A única diferença é que, em vez de carregar uma maleta de 28 quilos, transporto agora setecentos gramas em cartões de memória que não temem os raios X”.

Faz sentido, pois a identidade de Sebastião Salgado é algo que a reprodutibilidade técnica não consegue alcançar. As fotos em preto e branco, os ângulos e a abordagem estética fizeram tornaram um ex-economista mineiro em um dos brasileiros mais laureados do mundo.

Acampamento do MST no Paraná. Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

Sebastião Salgado considerava a descoberta da fotografia como sorte, mas não dele. A sorte é nossa.

“Um dia, meu pai me disse: ‘Sebastião, você é um fotógrafo reconhecido, mora em Paris. Mas você já se perguntou o que teria acontecido se eu tivesse vendido a fazenda quando você ainda era menino, na época da grande inflação, quando tantos outros se deixaram levar? Você seria hoje um motorista de trator numa fazenda vizinha ou então viveria numa favela da cidade grande’. Ele tinha razão. Tive muita sorte de poder viver o que vivi, de poder visitar mais de 120 países. É o que chamo de grande coerência, ou então de grande sorte.”

Instituto Terra: fotógrafo por acaso, Sebastião Salgado se torna ambientalista 

Imagem: Sony Pictures/Reprodução

O legado de Sebastião Salgado não está apenas nas fotografias marcantes, mas no instituto de reflorestamento que o fotógrafo criou no local onde nasceu.

Imagem: Sebastião Salgado/Reprodução

Em 2000, com a ajuda do governo de Minas, da Vale (ironicamente) e de organizações internacionais, Sebastião Salgado lançou uma iniciativa de reflorestamento, plantando um milhão de plantas por ano. A meta do fotógrafo era ajudar a replantar 50 milhões de árvores no Vale do Rio Doce até 2050.

Foi durante a criação desse projeto que Salgado surgiu com a ideia de “Gênesis”. Embora ateu, Sebastião Salgado usou este nome para seguir a ideia do pai da evolução.

“Não acredito num grande criador que tenha ordenado a natureza e todo os seres vivos. Acredito muito mais na evolução, sou um discípulo de Darwin. Acredito que existam certas leis. Que as coisas se formam graças à dialética, ao acúmulo de experiência, à maturação. Mas nem todos os processos de maturação seguem num curso positivo. Ainda não temos uma explicação para o instante primordial, mas o que vem a seguir pode ser cientificamente explicado. “Gênesis” me deu a oportunidade de observar a idade do planeta. No Saara, vi pedras talhadas há 16 mil anos; na Venezuela, montanhas de 6 bilhões de anos. A vida adquire outra dimensão. Percebemos que ela não passa de uma brevíssima passagem.”

Pablo Nogueira

Pablo Nogueira

Jornalista e mineiro. Já escreveu sobre tecnologia, games e ciência no site Hardware.com.br e outros sites especializados, mas gosta mesmo de falar sobre os Beatles.

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