Um réquiem para o Orkut

A era do Orkut, esse marco da história da internet brasileira, acaba hoje. Tomados pela nostalgia, relembramos o melhor desta rede social.

Você se lembra da última vez que acessou a sua conta no Orkut? Com a onda de nostalgia que se apossou da internet brasileira desde que o Google anunciou que a rede social só estaria disponível até hoje, provavelmente a sua resposta para essa pergunta é afirmativa.

Eu não consigo entrar no meu Orkut desde 2012. Quando o Google resolveu que era necessário um endereço Gmail para usar a conta, eu tentei fazer a migração, mas alguma coisa deu errado. Eu recebia e-mails da rede social no meu Gmail, mas o login só podia ser feito com meu Yahoo velho de guerra. Um belo dia o Orkut me pediu uma confirmação via e-mail para fazer o login e como meu vergonhoso endereço de e-mail pré-adolescente já estava morto e enterrado havia anos, foi ali que o Orkut morreu para mim.

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Obviamente, isso não impediu que eu fosse tomada de um ataque de nostalgia quando anunciaram o fim da rede social que viu boa parte das minhas pagações de mico na internet. O fim do Orkut foi revelado na esteira daquela onda de criar eventos falsos no Facebook e eu não pensei duas vezes: fui lá e fiz o Mutirão para printar o Orkut inteiro até setembro.

Quase 6.500 malucos “participaram” do evento e eu gastei algumas horas da minha vida respondendo mensagens de tiazinhas que perguntavam como era que ia funcionar. Tentei explicar para elas que se tratava apenas de uma zueirinha e que não existia um evento de verdade, que a gente meio que não ia conseguir printar o site inteiro. Também tive que explicar o que é printar. Várias delas ficaram magoadas, me disseram que fizeram muitas amizades no Orkut e que eu não deveria ficar brincando assim com os sentimentos dos outros. Daí você vê o que foi a influência da rede social rosa e azul-calcinha nesse Brasilzão véio sem porteira.

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Imagem via Unidos pelo Orkut

Os funcionários do Google podem usar o tempo livre no trabalho para criar projetos paralelos e foi assim que Orkut Büyükkökten, engenheiro turco do Google, acabou criando uma rede social que viria a ter 70 milhões de usuários – metade deles brasileiros. Não é pouco, ainda mais levando em consideração que na era de ouro de Orkut os smartphones estavam apenas engatinhando, computadores estavam começando a deixar de ser artigo de luxo nas casas comuns e laptops ainda eram muito caros.

Ah, como éramos inocentes na época do Orkut. Ainda me lembro de como as pessoas ficaram genuinamente felizes quando passou a ser possível upar mais que uma dúzia de fotos – quase sempre fotos horrorosas tiradas com câmeras digitais de qualidade duvidosa. Também havia todo um esforço de marketing pessoal na hora de criar o texto do perfil ou escolher uma frase de efeito para colocar ali e impressionar… bom, quem a gente queria impressionar com nossos perfis de Orkut? Eu realmente não sei. Como eu já disse, era uma rede social azul-calcinha, não era exatamente a coisa mais respeitável do mundo (e reparem que o Facebook é só um pouco menos azul-calcinha que o Orkut).

O Orkut era como um grande fórum, onde as comunidades eram os tópicos que, por sua vez, tinham subtópicos repletos de dedicação mal direcionada, tretas sem fim e, acredite quem quiser, compilações importantes de informações se você soubesse procurar direitinho. Acho que só quem era jovenzinho na época do boom do Orkut, e teve ali seus primeiros contatos com o melhor e o pior da internet, consegue entender do fundo do coração o que essa rede social.

Só uma pessoa jovem, de alma pura e tonta de inocência conseguiu experimentar de verdade a essência do Orkut: o desespero de ter um amigo burro ou sacana que aceitou um depoimento inaceitável, levar a sério o “sem scrap no add”, passar horas discutindo com desconhecidos num tópico e tremer de raiva ao ser chamado de n00bão, aprender os rudimentos do tiopês e fazer grandes investigações sobre os assuntos mais sem noção, contando com a ajuda de outras pessoas que tinham os mesmos gostos fora da casinha. Desde já, saudades pureza do coração jovem e saudades Orkut.

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Imagem via Orkut – Back-up

Para mim, a coisa mais legal do Orkut é que você tinha que pegar a sua enxada virtual e carpir uns lotes se quisesse conteúdo, informação e interações. As coisas não apareciam na sua timeline (até porque não tinha timeline) e era você que ia caçar sarna para se coçar e procurar o que fosse do seu interesse. Era menos mamão com açúcar do que as redes sociais de hoje, mas também criava grupos mais coesos e informações mais compartimentalizadas, então acho que sofríamos bem menos dos males de excesso de informações não requisitadas.

É o fim da festa, a música ruim já começou, mas o Orkut não vai sumir completamente da face da Terra. Você poderá baixar os dados do seu perfil, como fotos e escritos para guardar de recordação, até setembro de 2016 – basta seguir estas instruções. E as comunidades públicas e suas discussões continuarão guardados num acervo para consulta: segundo o Estadão, são mais de 51 milhões de comunidades com um bilhão de interações.

Mesmo assim, a era do Orkut – esse marco da história da internet brasileira – acaba aqui. Por isso, guardamos algumas lembranças dessa rede social, para termos quantas crises de nostalgia forem necessárias:

Divulgação

Imagem inicial via David Miraut/Flickr

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