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#AgoraÉQueSãoElas: Minas Programam?

Ariane Cor, Bárbara Paes e Fernanda Balbino são as criadoras do projeto #minasprogramam, e contam como é a experiência.

A campanha #AgoraÉqueSãoElas foi criada por Manoela Miklos e sugere que homens cedam seu espaço para que mulheres falem sobre seus direitos e questões relacionados a gênero. O Gizmodo Brasil resolveu participar com a publicação de artigos de mulheres que atuam na área de tecnologia e que têm feito a diferença.

As autoras do nosso segundo texto da série são Ariane Cor, Bárbara Paes e Fernanda Balbino, as criadoras do #minasprogramam, um coletivo que visa incentivar o ensino de tecnologia para meninas e mulheres.  Abaixo, elas contam um pouco a experiência delas ensinando tecnologia para garotas.

>>> #AgoraÉqueSãoElas: Como é ser mulher na tecnologia?

Quarenta e cinco garotas de 14 anos reunidas para participar de um evento na escola, em um bairro do extremo sul da cidade de São Paulo. As organizadoras pedem que as alunas se apresentem e digam o que pretendem estudar, e no que querem trabalhar, em um futuro próximo. A maioria, muito tímida, mal consegue dizer o próprio nome e a carreira que pretende seguir: medicina e pedagogia são as mais citadas; também surge medicina veterinária, design, fotografia, direito e administração. Uma garota diz que pensa em ser professora de informática, outra diz que quer trabalhar com TI, e duas querem ser engenheiras.

– E quem gostaria de trabalhar usando rede social o dia todo?

Aí o gelo é quebrado! Todas levantam as mãos, começam o burburinho e as risadas. Elas não acreditam que exista um trabalho tão legal. A partir desse ponto, professoras e alunas estabelecem um vínculo e passam a compartilhar informações sobre como a tecnologia pode contribuir para desenvolver os pequenos empreendimentos na região. Divididas em grupos, elas aprendem como criar páginas no Facebook para os pequenos negócios locais e a fazer um blog pela primeira vez.

Ao final da atividade, entre beijos coloridos de batom roxo e abraços de despedida, uma garota confessa à professora: “Ah, foi tão legal! Pensei que a gente fosse em mais uma palestra sobre menstruação…”

O evento foi uma oficina focada em Redes Sociais e Empreendedorismo do projeto #minasprogramam, exclusiva para meninas do nono ano do CEU Parelheiros, a convite da Secretaria de Políticas para as Mulheres, e fez parte da Maratona Rod Ada Hacker na primeira edição da São Paulo Tech Week.

O #minasprogramam começou em maio, com o objetivo de incentivar a inserção de mais meninas e mulheres na tecnologia através de uma campanha nas redes sociais. Em agosto, mulheres de destaque na área de TI se reuniram para um debate que foi transmitido ao vivo no site do projeto. Em outubro, 30 mulheres ingressaram em um curso básico de programação que foi estruturado a partir do interesse de 67 pré-inscritas por formulário online.

O silêncio e a timidez das garotas do CEU não foram novidade. A dificuldade de expressão das minas também foi observada nos formulários de inscrição para o curso e demonstra a falta de autoconfiança das mulheres quando o assunto é tecnologia. Em um ambiente majoritariamente masculino, como são os locais de trabalho e estudo na área, essa dificuldade é potencializada. Apenas em ambientes exclusivos para mulheres – e muita persistência – que a troca de experiências* foi possível:

“Quando estudava técnico em Processamento de Dados, eu fiz uma pergunta ao professor e a resposta foi que eu estava no curso de PD errado. Eu deveria estar em Prendas Domésticas.”

“Fiz Ciência da Computação. Ao apresentar minhas dúvidas ouvia dos professores que se não entendia aquilo, melhor que procurasse um curso mais adequado.”

“Na faculdade eu adorava programar, mas no trabalho sou sempre encaminhada para vagas de análise ou negócios.”

“Sou designer e nunca encontro programadora para trabalhar comigo nos freelas. Parece que só tem homem.”

Na infância, os meninos são mais incentivados à ciência, tecnologia e engenharia, enquanto as meninas são socializadas para o cuidado, ensino e relacionamentos. Quando chegam aos cursos técnicos e universidades, eles já têm muito conhecimento acumulado, já sabem muita coisa sobre programação, por exemplo, e encontram mais facilidade para aprender. Esses ataques de professores, colegas e chefes acabam minando toda a trajetória dessas meninas dentro do mundo da tecnologia. Ou seja, além da dificuldade no processo de aprendizado, as meninas também passam por um processo de desvalorização do próprio conhecimento, chegando a acreditar que “meninas não são boas em exatas”.

Entre todas as garotas que estavam na oficina em Parelheiros, apenas uma foi reconhecida pelas colegas como “boa em matemática”, mas ela mesma não se manifestou como tal. Apenas três delas conheciam “gente que mexe com computador”, todos homens. Uma garota escreveu a seguinte mensagem no formulário da página criada para a atividade: “Confesso que eu nunca tinha me interessado por tecnologia, até porque nunca tinha me informado sobre isso. – Julia”

É importante que existam e sejam mostradas as mulheres na tecnologia para proporcionar que garotas como a Julia tenham um leque de possibilidades de escolhas na vida. Para que elas conheçam mulheres “que mexem com computador”. E que elas também mexam muito, desde cedo, não apenas como usuárias ou professoras. Que elas saibam que podem ser engenheiras e desenvolvedoras e que não são menos aptas a isso por serem meninas.

Passado um tempo que as alunas saíram, enquanto as professoras conversavam, um garoto da turma que usaria o espaço em seguida entrou no Telecentro, interrompeu a conversa se apresentando, muito simpático e sorridente, perguntando do que se tratava o evento e qual era a oficina que tinha acontecido. Em seguida contou sobre todas as coisas que gostava de fazer no CEU e passou o endereço do site de um projeto que ele participava.

*As experiências relatadas são reais, vivenciadas e compartilhadas por alunas do curso #minasprogramam.

Foto por kaboompics/Pixabay

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