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Por que a Apple está tão interessada em uma lei de proteção de dados nos EUA

Depois de a União Europeia aprovar a GDPR, lei de proteção de dados pessoais, outros países começaram a se movimentar para criar suas próprias legislações voltadas à privacidade. Foi o caso do Brasil, que no ano passado aprovou a LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados. Agora, os Estados Unidos estão discutindo algo similar. […]

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Depois de a União Europeia aprovar a GDPR, lei de proteção de dados pessoais, outros países começaram a se movimentar para criar suas próprias legislações voltadas à privacidade. Foi o caso do Brasil, que no ano passado aprovou a LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados. Agora, os Estados Unidos estão discutindo algo similar.

Nesta quarta-feira (16), o senador republicano Marco Rubio apresentou a American Data Dissemination Act, uma lei que obrigaria a FTC, órgão de proteção ao consumidor e de regulação do comércio, a submeter recomendações detalhadas com as exigências de privacidade às empresas de tecnologia.

A ideia é similar às outras legislações que citamos. Como os Estados Unidos ainda não possuem diretrizes federais para a proteção de dados, a nova lei criaria um marco regulatório para a coleta, tratamento e uso de dados pessoais no país inteiro. Há controvérsias sobre o modelo da legislação, pela atribuição ao FTC e por retirar autonomia dos estados. Ainda assim, é um dos primeiros passos dos legisladores americanos na tentativa de regulamentação das empresas de tecnologia.

Tratam-se de regras que afetam diretamente o modelo de negócios de muitas companhias, de pequenas a grandes.

À par das movimentações do congresso americano, o CEO da Apple, Tim Cook, publicou uma carta na Time Magazine pedindo a aprovação da legislação. Na missiva, ele desafiou empresas para que interrompam a coleta de dados pessoais de consumidores.

Você poder ler um trecho carta de Tim Cook na íntegra abaixo:

Em 2019, chegou a hora exigir o direito pela privacidade – a sua, a minha, de todos. Consumidores não devem tolerar outro ano de companhias acumulando de forma irresponsável grandes perfis de usuários, vazamentos de dados que parecem fora de controle e a impossibilidade de controlarmos a nossa própria vida digital.

Esse problema tem solução – ele não é muito grande, muito desafiador, nem está muito tarde. Inovação, ideias grandiosas e grandes funcionalidades podem andar de mãos dadas com a privacidade dos usuários – e devem. Perceber o potencial da tecnologia depende disso.

É por isso que eu e outros pedimos para que o Congresso dos Estados Unidos aprove uma abrangente legislação federal de privacidade – um pacote de referência de reformas para proteger e dar poder ao consumidor.

Confira a versão na íntegra, em inglês, na Time Magazine.

Essa não é a primeira vez que a Apple sai em defesa do direito à privacidade. Durante a CES 2019, por exemplo, a companhia comprou um espaço publicitário enorme em um dos edifícios próximo a um dos locais da feira para afirmar que “o que acontece no seu iPhone, fica no seu iPhone”. O próprio Tim Cook disse que acredita que a privacidade é “um direito humano fundamental”.

Imagem: David Becker/AFP

A privacidade é, de fato, um dos valores da Apple. É uma das vantagens comerciais de seus produtos. Justamente por isso, a companhia defende a pauta com unhas e dentes.

As principais concorrentes da empresa são dependentes do modelo de negócios baseado na coleta e tratamento de dados.

O Facebook, que se envolveu em todos os tipos de escândalos relacionados aos dados pessoais no ano passado, gera praticamente todas as suas receitas com anúncios publicitários. No terceiro trimestre de 2018, US$ 13,5 bilhões foram arrecadados com publicidade, enquanto pagamentos e outras taxas representaram US$ 188 milhões em receitas.

E o Google, que talvez seja um rival mais pesado para a Apple, não foge desse cenário: 85,8% dos US$ 33,7 bilhões que entraram na empresa no terceiro trimestre de 2018 vieram da venda de publicidade, que são precisas graças à coleta pesada de informações a partir de todos os seus produtos.

Isso só para citar duas grandes corporações, donas dos serviços mais populares em computadores e celulares do mundo inteiro. Há ainda empresas menores dependentes, em parte, desse modelo: Spotify e Netflix, para não fugirmos dos serviços que devem ser oferecidos pela Apple. E embora Amazon e Microsoft dependam menos da coleta de dados, não são empresas que vendem privacidade.

A Apple, por sua vez, tem o grosso de sua receita na venda de hardware – e hardware caríssimo. Dos US$ 62,8 bilhões em receitas no quarto trimestre de 2018, 61% vieram de vendas internacionais. Uma legislação que regulamente a coleta de dados é interessante para derrubar os concorrentes e fortalecer a estratégia atual.

Outro mercado de interesse para a empresa da maçã e que se vale pesadamente da coleta de dados é a saúde. Os marcos regulatórios de privacidade são importantíssimos na área para impedir abusos. Em uma recente entrevista à CNBC, Tim Cook disse que quando as pessoas olharem para trás dirão que “a contribuição mais importante da Apple para a humanidade foi no setor de saúde”.

A privacidade é produto, e um produto caríssimo.

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