Astronauta Scott Kelly ganhou 5 cm de altura após passar um ano no espaço
O astronauta Scott Kelly passou 340 dias na Estação Espacial Internacional e retornou à Terra esta semana. Pelo visto, a estadia espacial teve alguns efeitos curiosos no corpo dele, pois Scott agora está 5 cm mais alto que o irmão gêmeo.
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Aparentemente, isso era esperado: livre dos limites da gravidade, a espinha de uma pessoa tende a se alongar na ausência de gravidade.
Infelizmente, Kelly não conseguirá manter sua vantagem de altura por muito tempo, agora que ele está de volta à Terra – a menos que ele faça yoga, talvez.
O corpo de Scott está nos ajudando a responder algumas questões sobre o efeito prolongado do espaço em humanos – incluindo o que a ausência crítica de gravidade faz com a nossa visão, e se a radiação adicional mexe em nosso DNA.
Scott passou 340 dias consecutivos no espaço, um recorde para astronautas americanos. Esse é quase o tempo que astronautas terão de ficar em uma nave espacial para viajar a Marte e voltar. Assim, o corpo de Scott ofereceu à NASA uma oportunidade valiosa para compreender o que nossos futuros exploradores de Marte vão enfrentar ao longo do caminho.
Durante a missão de um ano, um pequeno exército de pesquisadores médicos vem monitorando as funções corporais de Scott e comparando o astronauta com seu irmão gêmeo, o astronauta aposentado Mark Kelly. São diversos exames de sangue, exames médicos e avaliações cognitivas.
Visão e fluidos
A missão de Scott pode ajudar a NASA a entender como a redistribuição dos fluidos corporais em gravidade zero impacta a nossa saúde e, principalmente, a nossa visão.
“Eu gosto de chamar isso de a investigação biomédica mais complexa já feita na estação espacial,” diz John Charles, cientista-chefe do Programa de Pesquisa em Seres Humanos da NASA, ao Gizmodo.
Na Terra, a força da gravidade está constantemente puxando nossos fluidos corporais para baixo. Enquanto isso, no espaço, tudo – o sangue, a urina, o fluido intersticial que rodeia nossas células – está livre para se redistribuir uniformemente da cabeça aos pés. Como aponta a NASA no gráfico informativo abaixo, dois litros de líquido nas pernas de Scott Kelly se deslocaram em direção à cabeça dele durante seu primeiro ano no espaço.
Crédito da imagem: NASA
O efeito mais óbvio da redistribuição de fluidos é a “cara de lua”, aquela aparência de bochechas inchadas que os astronautas ganham após um curto período de ausência de peso. Mas existem efeitos potencialmente mais sinistros, incluindo a deterioração da visão.
Como o ex-cientista-chefe da HRP, Mark Shelhamer, explicou ao Gizmodo no ano passado, astronautas vão ao espaço com visão perfeita e muitas vezes voltam para a Terra um pouco míopes.
A NASA acredita que isto é causado por um aumento na quantidade de líquido que rodeia o cérebro, o que exerce uma pressão adicional sobre o nervo óptico, deformando os globos oculares do astronauta. Mas quanto tempo dura o comprometimento da visão? Isso pode se tornar grave? Isso ainda não é bem compreendido.
Durante a missão de Scott, o estudo Fluid Shift da NASA vem investigando isso usando o traje russo Chibis: um par de volumosas calças de borracha que agem como um aspirador de pó, sugando o ar ao redor das pernas para imitar os efeitos da gravidade. O processo, que vem ocorrendo no lado russo da ISS durante anos, foi criado para ajudar os cosmonautas a se reajustarem à gravidade, antes de retornarem à Terra.
Várias vezes ao longo do ano, Scott e o cosmonauta russo Mikhail Kornienko vestiram o traje e sentiram o sangue sair do rosto enquanto cientistas russos e americanos monitoravam a frequência cardíaca, visão e distribuição de fluidos corporais em cada astronauta. “Ao restabelecer a distribuição normal dos fluidos, nós queremos ver se o olho responde rapidamente”, diz Charles ao Gizmodo, acrescentando que, embora “pareça que o experimento teve algum efeito”, sua equipe precisa de mais tempo para analisar os dados.
Um paciente usando uma versão do traje russo Chibis na ISS, via NASA
Mutações no DNA
Enquanto isso, outro estudo está investigando se a radiação adicional no espaço exterior danificou o DNA de Scott. Esta é uma questão importante quando consideramos o envio de pessoas a Marte: por todo esse caminho, elas serão expostas a um nível de radiação ultravioleta centenas de vezes maior do que na superfície da Terra, bem como raios cósmicos ainda mais perigosos.
Como, exatamente, o espaço exterior transforma e altera o nosso DNA? Esse é um assunto que Scott pode nos ajudar a entender, porque ele tem um irmão gêmeo com exatamente o mesmo código genético. “Acho que o aspecto genético irá revelar um dos resultados mais importantes desta missão”, diz Charles.
Ao comparar o DNA de Scott com o de seu irmão, a NASA espera descobrir se uma viagem muito longa no espaço leva a mudanças significativas. Isto inclui alterações nos telômeros dos irmãos Kelly, “tampas” nas extremidades do nosso DNA que protegem nossos cromossomos contra danos. Os nossos telômeros naturalmente ficam mais curtos ao longo de nossas vidas, o que causa o envelhecimento celular. Mas o estresse do voo espacial pode fazê-los se reduzir mais rapidamente, acelerando o relógio biológico de um astronauta.
Os principais resultados do grande experimento de Scott Kelly ainda estão por vir, e a NASA já está pensando em mandar mais astronautas para passarem um ano no espaço. Estamos todos ansiosos para viagens interestelares e colonização de Marte, mas, primeiro, temos muito a aprender sobre como o corpo humano responde ao vazio escuro e frio do espaço exterior.
Primeira foto por NASA/Flickr