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Como foi a audiência do Facebook no Congresso dos EUA sobre o projeto Libra

Na quarta-feira (23), Mark Zuckerberg compareceu a uma audiência de cinco horas no Congresso dos EUA para esclarecer questões com foco no projeto Libra.

mark zuckerberg, ceo do facebook, em audiência no congresso americano. ele parece estar com uma expressão contrariada.

Crédito: Andrew Harnik/AP

Na quarta-feira (23), Mark Zuckerberg compareceu a uma audiência intitulada “Uma análise sobre o Facebook e seu impacto nos setores de serviços financeiros e imobiliários”. Os 62 membros do Comitê de Serviços Financeiros da Câmara dos Estados Unidos interrogaram o CEO do Facebook por cinco horas, focando em questões como a Libra, privacidade de dados, desinformação em anúncios políticos, e a violação de leis contra a discriminação no setor imobiliário.

Caso você esteja curioso (e com tempo sobrando) para ouvir as cinco horas de audiência, o vídeo está disponível aqui:

Caso contrário, reunimos abaixo os principais pontos discutidos.

Por que regulamentar a Libra

O Facebook alega ser a favor da regulamentação, mas não como um banco. Afinal, Zuckerberg defende que a Libra é um “sistema de pagamento”. O problema é que a criptomoeda não seria atrelada ao dólar, o que pode colocar em risco a supremacia da moeda norte-americana. Uma das representantes do Comitê Madeleine Dean referiu-se à Libra como uma “moeda não regulamentada que operaria mais como um governo”.

Felix Shipkevich, diretor da Shipkevich PLLC, disse ao Lifehacker que as instituições financeiras são fortemente regulamentadas porque, caso contrário, elas ameaçariam usurpar a função do governo. Ao comprar a Libra, os usuários estariam entregando sua moeda local, o que significa que, dependendo da situação econômica de um país, a empresa pode acabar se apoderando de uma porcentagem significativa do capital de uma nação.

Outra questão levantada na audiência foi o motivo de a Libra ser baseada na Suíça em vez dos Estados Unidos, onde a sede do Facebook e de seus parceiros estão localizadas. O Lifehacker aponta que as operações internacionais do Facebook, assim como de outras empresas norte-americanas, estão baseadas na Irlanda para evitar impostos. Então, a ideia de um “sistema de pagamento” baseado na Suíça parece, no mínimo, suspeito.

Quem é dono da Libra?

Durante a audiência, Zuckerberg insistiu em dizer que o Facebook é apenas parte de um grande grupo que controla a nova criptomoeda. Mas, aparentemente, ele não foi muito convincente. A representante Ayanna Pressley apontou que Zuckerberg tem controle de votos no Facebook, que por sua vez controla a Libra. “A Libra é o Facebook, e o Facebook é você”, disse.

Em geral, o CEO do Facebook não foi capaz de mudar a opinião do Comitê. Ao ser acusado de “controlar” o CEO da Calibra David Marcus, Zuckerberg riu e disse que Marcus é seu funcionário, mas que “controlar” é uma palavra muito forte. Ou seja…

Outras implicações da Libra

O Congresso também se mostrou preocupado com o fato de que o caráter criptográfico da nova moeda possa facilitar transações ilegais, especialmente lavagem de dinheiro, financiamento do terrorismo e tráfico sexual.

O discurso do Facebook de criar a Libra para ajudar os “desbancarizados” também não convenceu. O deputado Sherman não poupou palavras para criticar o projeto e Zuckerberg:

[…] Para o homem mais rico do mundo vir aqui e se esconder atrás das pessoas mais pobres do mundo, e dizer que é quem você está tentando ajudar? Você está tentando ajudar aqueles para quem o dólar não é uma boa moeda: traficantes, terroristas e sonegadores de impostos.

Se é verdade ou não que a Libra foi criada para gerar lucros para o Facebook, o fato é que seu plano de evitar taxas, tornando-se um serviço financeiro digital gratuito, vai obviamente resultar em custos mais altos e preocupantes para o mundo, e é isso que o Congresso teme.

O que pensam Democratas e Republicanos

Se os Democratas adotaram uma abordagem agressiva contra Zuckerberg, os Republicanos, por outro lado, se mostraram muito mais amigáveis – inclusive apoiando o discurso do CEO do Facebook em alguns momentos.

A ideia defendida pelos representantes republicanos é que o mundo precisa de um concorrente norte-americano para competir com a criptomoeda da China, apoiada pelo governo – um argumento já utilizado pelo próprio Zuckerberg.

Além disso, eles concordaram que o sistema financeiro atual está estagnado e que, mesmo que o Facebook não seja a entidade ideal para dar uma agitada na situação, alguém vai ter que fazer isso. E, já que o Facebook possui os recursos necessários para isso e está disposto a realizar esse ato benevolente em prol do mundo, por que não?

Obviamente, o sistema financeiro atual sustentado pela corrupção e exploração dos mais pobres não está em linha com os valores defendidos por Democratas. O Facebook diz que quer combater esse sistema e, mesmo assim não consegue apoio desse grupo. Contraditoriamente, seu projeto que pretende lutar contra os bancos recebeu apoio (ainda que discreto) dos Republicanos. Ou seja, a nova criptomoeda tem causado conflitos de valores dentro dos próprios partidos, que precisam considerar inúmeras variáveis, possíveis consequências e tentar desvendar os verdadeiros interesses por trás do projeto.

O que mais foi discutido

Se os Republicanos apoiaram o Facebook em relação a Libra, essa mesma atitude não foi mantida quando o assunto foi “liberdade de expressão”. Os representantes desse grupo acusam a rede social de censurar discursos por meio de resultados de pesquisa rebaixados, rótulos anexados a sites de desinformação conhecidos e classificação algorítmica.

Democratas, por outro lado, acusam o Facebook de não controlar os discursos na plataforma o suficiente, permitindo campanhas de desinformação em anúncios políticos. A empresa já afirmou que não faria uma checagem de fatos, o que obviamente não agradou ao Comitê.

Alexandria Ocasio-Cortez questionou quais mentiras especificamente ela poderia dizer em anúncios políticos. A resposta de Zuckerberg foi que ela não poderia pagar para direcionar anúncios a bairros predominantemente negros e dizer a eles a data errada da eleição, porque o Facebook proibiria anúncios de privação de direitos ou supressão de votos.

Mas e se forem anúncios, nas eleições primárias, alegando que os Republicanos votaram a favor do Green New Deal (projeto de autoria de Ocasio-Cortez com propostas econômicas para ajudar a combater as mudanças climáticas e a desigualdade econômica)? “Acho que provavelmente sim”, gaguejou Zuckerberg.

Outro momento constrangedor foi quando diversos representantes acusaram o Facebook de permitir que anúncios imobiliários fossem segmentados de acordo com raça e classe social. Zuckerbeg ainda foi questionado sobre direitos civis e sobre a diversidade do seu próprio time. A reação do CEO do Facebook mostrou que ele não estava nem um pouco preparado para tratar desses assuntos ou fornecer propostas para redimir as violações cometidas pela empresa até agora.

Diante da falta de propostas por parte de Zuckerberg, a deputada Katie Porter deu uma sugestão ao falar sobre as condições degradantes a que os moderadores de conteúdo são submetidos, prejudicando sua saúde mental. Ela pediu que Zuckerberg se voluntariasse para passar uma hora por dia, durante um ano, monitorando o conteúdo em sua plataforma. O CEO recusou a proposta, afirmando que isso não parecia ser um bom uso do seu tempo.

O que vem a seguir

A audiência desta semana tinha o objetivo de esclarecer algumas questões sobre o projeto Libra e mostrar ao público algumas preocupações válidas levantadas pelo Congresso e como o Facebook pretende lidar com elas. No entanto, o debate foi mais um interrogatório com Zuckerberg evitando confrontos e se limitando a respostas básicas e sem muitas explicações ou propostas.

O cenário já não estava muito favorável para o projeto Libra e, após essa audiência, ficou claro que o Facebook terá muitas batalhas pela frente até que sua criptomoeda se torne realidade. Resta saber se o projeto continuará sendo viável ou se a empresa e suas parceiras acabarão desistindo.

[Lifehacker]

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