Cientistas criam “caixa preta” para registrar atividades de células

O corpo humano é feito de trilhões e trilhões de células. E nestes trilhões de células, existem centenas de tipos diferentes, cada uma com sua própria função, desde formar tecidos órgãos a reprodução e combate a infecções. Elas providenciam estrutura para o corpo, absorvem nutrientes e criam energia. Basicamente, é tudo sobre a célula. Mas […]

O corpo humano é feito de trilhões e trilhões de células. E nestes trilhões de células, existem centenas de tipos diferentes, cada uma com sua própria função, desde formar tecidos órgãos a reprodução e combate a infecções. Elas providenciam estrutura para o corpo, absorvem nutrientes e criam energia. Basicamente, é tudo sobre a célula.

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Mas o que de fato acontece dentro destas células quando elas estão trabalhando? A resposta para essa questão pode nos ajudar a melhor entender o envelhecimento e doenças.

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Para espiar dentro de uma célula, cientistas do Broad Institute of MIT e da Harvard desenvolveram uma espécie de “caixa preta” tanto para células humanas quanto para células bacterianas. De forma muito semelhante como o registro de um voo, ou caixa preta (que na verdade é laranja), armazena dados, esse registro celular pode armazenar informação sobre eventos da vida de uma célula. O trabalho delas aparece em um novo estudo publicado nessa quinta-feira (15) no periódico Science.

“Existem muitas questões na biologia que podem ser esclarecidas se você não precisa observar mudanças nas células conforme elas acontecem, mas pode, em vez disso, registrar e lê-las no seu ritmo mais tarde”, disse David Liu, primeiro autor do estudo, ao Gizmodo.

Mas existem desafios ao fazer isso.

Desta forma, Liu e sua equipe passaram a registrar a atividade dessa célula invisível conforme mudanças de longo prazo alteravam o DNA de uma célula. Para conseguir isso, Liu e seu coautor Weixin Tang usaram o sistema de edição genética CRISPR, tipicamente utilizado para tratar doenças, para registrar a atividade celular.

Eles projetaram dois sistemas diferentes para isso, chamados de CAMERA 1 e CAMERA 2, cada um utilizando componentes diferentes do CRISPR. No CAMERA 1, eles usaram o composto cortante do sistema CRISPR-Cas9. Disso, as coisas ficaram um pouco mais complicadas. O objetivo era conectar o sinal celular que eles queriam monitorar ao corte do CRISPR. Eles injetaram pequenos círculos de DNA chamados plasmídeos em células bacterianas que são replicadas pela célula. Eles então usaram dois plasmídeos diferentes que possuíam a mesma origem mas com algumas pequenas divergências genéticas.

A célula, pelo visto, naturalmente mantém o mesmo número de copias totais destes dois plasmídeos. Assim, caso o CRISPR-Cas9 corte um deles, a célula produzirá mais do outro. Ao programar o CRISPR para cortar o plasmídeo em resposta a um estímulo, você obtém uma maneira de monitorar a atividade celular. Em células bacterianas vivas, eles mostraram que a proporção destes dois plasmídeos mudou com o tempo em resposta ao sinal monitor, permitindo aos pesquisadores decifrar se uma célula estava exposta a coisas como antibióticos ou nutrientes.

“Você pode inclusive deduzir se uma célula foi exposta ao período de uma hora de sinal, ou duas horas, ou se o sinal estava com apenas 60% de sua potência total”, diz Liu.

No sistema CAMERA 2, eles usaram o que é conhecido como bases editoras – que podem mudar letras individuais do código genético – para registrar eventos celulares conforme ocorriam mudanças a sequência do DNA. Aqui, o objetivo era conectar os sinais celulares que eles queriam observar com a produção de bases editoras. Quando certos sinais ocorrem, a base editora mudava letras individuais do DNA de maneira específica, em lugares pré-programados. Usando este sistema, eles puderam monitorar a exposição da célula para antibióticos, nutrientes, vírus e luz em células humanas e bacterianas.

Cientistas vem há tempos buscando por dispositivos que registrem as atividades celulares, e outros sistemas já foram criados no passado. Essas duas metodologias, entretanto, são significantes avanços, pois combinam diversas funções dos sistemas passados, como permitir o registro da intensidade do sinal celular, registrar diversos sinais de uma só vez, registrar a ordem em que estes sinais ocorrem e trabalhar com células humanas.

“Isso é brilhante!”, disse Eric Topol, geneticista na Scripps Research Institute que não esteve envolvido com a pesquisa, ao Gizmodo. “Uma maneira completamente nova de potencializar o CRISPR-Cas9, agora para manter registros com alguma duração do que está acontecendo nas células, seja monitorando funções normais, exposição à drogas, ou estimulo ambiente. Isso realmente não era possível antes”.

Topol disse que apesar da pesquisa ser meramente uma demonstração dos métodos em funcionamento, ela pode ser importante para a base de muitos outros estudos no futuro.

O geneticista de Harvard George Church, que também não esteve envolvido no estudo, o chamou de “criativo”.

Liu disse já estar utilizando os sistemas CAMERA em seu próprio laboratório para responder algumas questões básicas sobre células-tronco, como entender o que acontece com uma célula conforme ela se transforma.

Com a janela aberta para a atividade celular, Liu espera que esse canto escuro da biologia seja finalmente iluminado.

Imagem de topo: Stuart Caie/Flickr

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