Estudo controverso diz que o cérebro humano produz novos neurônios até o momento da morte

Um novo estudo publicado nessa terça-feira na Cell Stem Cell deve aquecer o debate que questiona se o nosso cérebro é capaz de desenvolver novos neurônios conforme envelhecemos. A pesquisa descobriu que as pessoas, até mesmo aquelas na melhor idade, regeneram seus estoques de neurônios até o momento da morte – aparentemente contradizendo os resultados […]

Um novo estudo publicado nessa terça-feira na Cell Stem Cell deve aquecer o debate que questiona se o nosso cérebro é capaz de desenvolver novos neurônios conforme envelhecemos. A pesquisa descobriu que as pessoas, até mesmo aquelas na melhor idade, regeneram seus estoques de neurônios até o momento da morte – aparentemente contradizendo os resultados de um grande estudo publicado em março.

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Pesquisadores da Universidade Columbia estudaram cérebros doados logo após a morte de 26 pessoas, de idades entre 14 e 79 anos. Eles especificamente observaram o giro denteado, uma região do hipocampo (a parte do cérebro que auxilia na coordenação da nossa capacidade para a memória) em que diversas pesquisas em ratos e humanos há tempo sugerem que novos neurônios regularmente são gerados. Eles encontraram evidências do desenvolvimento de novos neurônios, ou neurogênese, em todos os cérebros, além da evidência de angiogênese, ou a formação de novos vasos sanguíneos. Mais do que isso, eles também encontraram que a idade do indivíduo não parece desacelerar esse desenvolvimento.

“As pessoas que eram velhas e as pessoas que eram novas possuíam em média a mesma quantidade de novos neurônios e células progenitoras, algo em volta dos milhares”, disse Maura Boldrini, primeira autora e neurobióloga na Universidade Columbia, ao Gizmodo.

Cérebros mais velhos pareciam possuir um reservatório de células-tronco menor, uma angiogênese reduzida, e menos neuroplasticidade (a habilidade dos neurônios em produzir novas conexões com outros neurônios) que os mais jovens, no entanto.

Bodrini não é novata no contínuo debate sobre a neurogênese. Ela se lembra de passar por diversas escolas e ser ensinada que o cérebro humano simplesmente não poderia produzir novos neurônios. Mas quando estudos do início dos anos 1980 começaram a descobrir que novos neurônios crescem a todo momento em animais como ratos e pássaros, Boldrini estava entre os muitos cientistas inspirados em testar se o mesmo acontecia em humanos.

Ela e outros pesquisadores conduziram estudos no decorrer dos anos indicando que isso de fato também ocorre em adultos. Ela também colaborou em pesquisas que sugerem que a falta da produção de neurônios pode ter um papel em condições mentais como depressão ou idealizações suicidas, e certos tratamentos como o uso de antidepressivos podem ajudar o processo a ser reiniciado.

No entanto, um estudo publicado na Nature no mês passado refuta a teoria. A equipe, que incluiu um pesquisador que já ajudou a provar que a neurogênese em animais era real, analisou amostras do hipocampo doado por 59 pessoas, tanto vivas quanto mortas, e não encontrou evidências do crescimento de neurônios no cérebro humanos depois dos 13 anos de idade.

Boldrini insiste que as descobertas de sua equipe não são uma forma de atacar a credibilidade dos pesquisadores da Nature. “Eu conheço o grupo de Buylla”, ela diz, se referindo ao pesquisador Arturo Alvarez-Buylla da Universidade da Califórnia em San Francisco, primeiro autor do estudo mencionado. “Nós nos conhecemos, já estivemos nos mesmos encontros. É um grupo fantástico”.

Em vez disso, ela diz que os resultados diferentes podem ser devido aos cérebros diferentes que cada grupo avaliou.

“Eles possuíam cérebros de quatro lugares diferentes do mundo, como a Ásia, Europa, e os EUA. E eles dizem que analisaram de três a cinco setores do hipocampo. Então eles não analisaram todo o hipocampo, é claro”, ela diz. “Estes cérebros também foram tratados com diferentes químicos, e eles foram comparados uns aos outros. E cada um destes químicos usados para preservar o cérebro pode afetar as células que você observa – é como comparar um frango assado com um frango que foi frito”.

Os cérebros analisados no atual estudo são de uma única coleção mantida pela equipe de Boldrini, cada um preservado da mesma maneira 24 horas após a morte, e todos sem problemas de saúde identificados, explicou Boldrini. O estudo da Nature, por sua vez, obteve amostras de pessoas que receberam cirurgia para tratar epilepsia, além de cérebro coletados 48 horas após a morte. Estes fatores podem ter influenciado no resultado, ela diz.

“Nós temos o cérebro completo doado pela família. E isso é crucial, inclusive, para poder estimar o número total de células que você quer observar”, ela explicou. “É impossível de fazer isso se você tem apenas pedaços do cérebro”.

Longe de ser apenas uma luta nas páginas de periódicos, Boldrini diz que é importante saber com certeza se o cérebro pode voltar a crescer.

“Se os neurônios estão lá, então temos o potencial de aprender como as coisas funcionam quando existe uma patologia”, ela diz. “Por exemplo, nós estudamos cérebro amadurecidos saudáveis. Mas não podemos comparar estes dados com o cérebro de pessoas que possuíam a doença de Alzheimer. Nós podemos então tentar entender os mecanismos que regulam a maturação destes neurônios. Assim se algo der errado, podemos manipulá-los e então curar as pessoas”.

Boldrini diz que a melhor maneira de resolver este debate é com os pesquisadores colaborando juntos para conduzir uma pesquisa de fácil reprodução em uma maior, mas ainda semelhante coleção de cérebros doados. Ela cita os esforços de coleta como os do Brain Initiative começados em 2013 pelo National Institutes of Health como um bom exemplo.

“Precisamos estudar o mesmo material”, ela diz. “Isso é fundamental”.

Os autores do estudo Nature responderam a questão em um comunicado:

“Enquanto o novo estudo de Boldrini oferece uma interessante evidência do crescimento de vasos sanguíneos no hipocampo adulto, nós contestamos a interpretação dos experimentos celulares como evidência de novo neurônios no cérebro adulto.

Identificar novos neurônios é tecnicamente desafiador – em nosso próprio estudo recente fizemos observações semelhantes as de Boldrini, mas depois de executar extensivas análises adicionais, incluindo [análises de] microscópios de elétrons e expressão genética, determinamos que estas células de fato neurônios novos ou neurônios progenitores, mas diferentes tipos de célula.

Por enquanto, nós não acreditamos que este novo estudo questiona o que conluímos em nossas próprios recentemente publicadas observações: se a neurogênese continua no hipocampo de um humano adulto, este é um fenômeno extremamente raro”.

[Cell Stem Cell]

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