China volta atrás e inocenta médico repreendido por alertar colegas sobre surto de coronavírus

Um médico chinês que foi repreendido por avisar sobre o novo coronavírus durante os primeiros dias da epidemia foi inocentado, em um relatório preparado por investigadores do governo chinês. Não é de surpreender que o documento não vá longe o suficiente para identificar os responsáveis ​​por esse incidente atroz e irresponsável. O oftalmologista Li Wenliang, […]
Bandeira da China. Crédito: Flickr/Remko Tanis
Foto: Flickr

Um médico chinês que foi repreendido por avisar sobre o novo coronavírus durante os primeiros dias da epidemia foi inocentado, em um relatório preparado por investigadores do governo chinês. Não é de surpreender que o documento não vá longe o suficiente para identificar os responsáveis ​​por esse incidente atroz e irresponsável.

O oftalmologista Li Wenliang, do Hospital Central de Wuhan, foi inocentado postumamente por uma equipe de investigação criada pelo governo chinês, segundo a Xinhua News, a maior agência de notícias estatal do país.

No início de janeiro de 2020, Li foi advertido pelas autoridades chinesas por “espalhar falsos boatos” ao tentar alertar seus colegas sobre o surto em um grupo de bate-papo, relata o Guardian. Li acabou contraindo a doença covid-19 no trabalho e faleceu em 7 de fevereiro de 2020, aos 34 anos.

O novo relatório, divulgado nesta semana, descreve Li como “profissional” e “corajoso”, admitindo que ele, na verdade, ele não estava tentando perturbar a ordem pública, como foi inicialmente acusado pelas autoridades chinesas, informou o Guardian.

A morte de Li provocou críticas na China. Cidadãos furiosos desabafaram sobre suas frustrações nas redes. Os censores removeram rapidamente os posts na tentativa de esconder essa demonstração pública de raiva.

A nova tentativa de voltar atrás pode não ser o suficiente para deixar a população satisfeita, no entanto, pois os autores do relatório não exploraram nem identificaram os problemas sistêmicos mais profundos que deram origem ao episódio. Em vez disso, os autores do relatório culpam as autoridades de nível inferior que inicialmente confrontaram Li.

Como relata o Guardian, cidadãos chineses já reagiram à tímida resposta da China:

“Então é só isso?” disse um usuário no Weibo, da China, uma rede semelhante ao Twitter, onde as notícias do relatório foram o principal tópico na quinta-feira (19) à noite, com mais de 160 milhões de visualizações.

“É como se eles não tivessem dito nada”, disse outro.

“Como você pode deixar que policiais de baixa patente levem a culpa?” disse um dos principais comentários sobre o Weibo na noite de quinta-feira. “Eles estavam apenas obedecendo ordens. Não os machuque.”

No início de janeiro de 2020, Li foi convidado a visitar o Departamento de Segurança Pública de Wuhan. Os policiais o acusaram de espalhar “falsos boatos”, forçando-o a assinar um documento admitindo que ele “perturbou seriamente a ordem social” em violação à lei chinesa, relata o Guardian. Li foi repreendido, mas não punido, e ainda pôde voltar a praticar medicina, de acordo com a Xinhua. Até oito pessoas foram disciplinadas dessa maneira, relata o Guardian.

No dia seguinte à morte de Li, o governo chinês lançou sua investigação, cujos detalhes foram divulgados nesta semana e detalhados pela Xinhua.

Em dezembro de 2019, um colega informou Li que vários hospitais em Wuhan estavam tratando pacientes com uma pneumonia cuja causa não podia ser determinada. Ao escrever para um grupo de bate-papo com colegas, Li disse que era um novo surto de SARS (doença causada por outro coronavírus mortal) e que poderia ser rastreado até um mercado de frutas e frutos do mar em Wuhan.

Nas mensagens seguintes ao grupo, Li descreveu uma infecção desconhecida por coronavírus, dizendo a seus colegas para “alertar suas famílias e tomar precauções”, de acordo com os relatos reproduzidos pela Xinhua. Eventualmente, os avisos de Li chegaram ao público — e às autoridades chinesas.

O novo relatório admitiu que as postagens de Li não eram inapropriadas, acrescentando que ele agiu com coragem e profissionalismo. Dito isso, os autores do relatório ainda encontraram uma maneira de criticar o médico, dizendo que ele não havia verificado suas informações antes de compartilhar.

“Deve-se notar que os departamentos e especialistas ainda não tinham feito um diagnóstico definitivo para os casos de pneumonia de causa desconhecida e não haviam entendido com precisão a epidemia na época”, disse uma autoridade estatal sem nome à Xinhua. “Nessas circunstâncias, Li encaminhou as mensagens sem verificação. Parte do conteúdo não correspondia totalmente à realidade.”

Uma recomendação importante do relatório é que os policiais envolvidos sejam localizados e repreendidos, o que aparentemente aconteceu, segundo o Guardian, que citou a rede social Weibo como fonte. O governo chinês diz que lançará outra investigação para entender por que as autoridades demoraram a responder à iminente crise de saúde.

Quanto a Li ser um “ativista anti-establishment”, como foi chamado por alguns cidadãos chineses, o funcionário do estado que falou com a Xinhua disse que isso não é verdade.

“Essas forças hostis com segundas intenções, que tentaram provocar problemas, iludir pessoas e instigar emoções públicas, estão fadadas ao fracasso”, disse o oficial à Xinhua, que, vale dizer, é uma agência de notícias estatal. O artigo da Xinhua teve o cuidado de observar que Li era um membro do Partido Comunista da China.

Estaremos atentos aos resultados das investigações subsequentes, embora, como neste novo relatório, eles provavelmente sejam decepcionantes. De qualquer maneira, a repreensão injusta de Li deve ser um dos episódios mais infames e evitáveis não apenas na história da China, mas na história do mundo.

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