Como funciona o processo de censura da App Store

  Minutos depois da gente ter falado sobre Funny Shoppers – um aplicativo de iPhone que mostra o lado bizarro da clientela do Walmart nos EUA –, a Apple deletou o aplicativo da sua loja. Não foi exatamente uma surpresa. Esta é uma história sobre o processo meio esquizofrênico de aprovação e censura da Apple.   

Minutos depois da gente ter falado sobre Funny Shoppers – um aplicativo de iPhone que mostra o lado bizarro da clientela do Walmart nos EUA –, a Apple deletou o aplicativo da sua loja. Não foi exatamente uma surpresa. Esta é uma história sobre o processo meio esquizofrênico de aprovação e censura da Apple. 

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Nós conversamos com Mike McNasby, que gerencia a Alkali Media, a pequena empresa de desenvolvimento que criou o Funny Shoppers para o People of Walmart. Este último, para quem não conhece, é um popular site dedicado a capturar os horrores humanos que perambulam pelos corredores da cadeira de supermercados mais popular da América. 

Segundo Mike, o aplicativo foi lançado semana passada depois de um processo de análise e aprovação que começou em janeiro deste ano. 

Não havia muito a ser analisado. O Funny Shoppers é um aplicativo bem simples. Em um lado, você pode navegar pela infinita galeria de humanos, criaturas parecidas com minhocas e outros invertebrados encontrados no Walmart. No outro, o aplicativo é tipo uma versão deprê de Caça-Fantasmas: você pode fazer upload das almas de quaisquer estranhos que conseguir capturar com a lente do iPhone. 

Quando foi originalmente submetido à aprovação, o aplicativo "foi rapidamente rejeitado pela Apple devido a conteúdo obsceno", disse Mike. Nada surpreendente. A Apple já censurou de tudo, de aplicativos levemente provocantes (não de grandes marcas, como a Sports Illustrated Swimsuit) a publicações famosas, passando por obras literárias de James Joyce e Oscar Wilde. O próprio Steve Jobs já declarou publicamente que quer uma plataforma livre de sacanagem, apesar do fato de que qualquer pessoa pode usar o navegador Safari para acessar qualquer site repleto das mais pesadas formas de pornografia hardcore. 

Reviravolta esquisita

Mesmo assim, a Alkali e o People of Walmart resolveram "dar uma segunda chance, filtrando parte do conteúdo – queríamos ver o que aconteceria se removêssemos o acesso aos posts mostrando as pessoas do Walmart". Esta versão do aplicativo não mostrava nenhum ser humano, apenas objetos inanimados encontrados no mercado. O aplicativo foi rejeitado novamente, com a mesma base: conteúdo obsceno, mesmo não tendo mais nenhum conteúdo obsceno nele. 

As coisas ficaram ainda mais estranhas depois disso. A Apple aprovou um aplicativo chamado Shopper Fail, que estava disponível em uma versão gratuita e uma paga (o Funny Shoppers era apenas gratuito). O aplicativo Shopper Fail era mais ou menos igual ao Funny Shoppers. De fato, imagem após imagem, todo o seu conteúdo era retirado do site People of Walmart. 

O Shopper Fail não foi removido. Ele teve múltiplas atualizações depois de ser lançado, cada uma tendo que passar (e passando) novamente pela aprovação da App Store. Tudo passou sem problemas, apesar de mostrar o mesmo "conteúdo obsceno" que causou as recusas do People of Walmart em janeiro. 

O People of Walmart procurou a Apple a respeito disso: "Por que a apple permitiria a disponibilização de um aplicativo cópia com o mesmo conteúdo da versão oficial, e não esta versão oficial?" A resposta da Apple foi que "não podemos comentar sobre outros aplicativos da App Store". Depois disso, o People of Walmart mandou uma carta de Cease And Desist ao Shopper Fail, e o seu aplicativo foi finalmente retirado da App Store.

Dr. Jobs e Mr. Hyde

Algumas semanas depois, a Apple entrou em contato com o People of Walmart com uma sugestão: se eles fizessem algumas pequenas modificações no aplicativo, a Apple poderia aprovar sem problemas. As mudanças: remover qualquer referência ao Walmart. Segundo os desenvolvedores, "a Apple basicamente insinuou que não queria receber reclamações do Walmart por permitir o aplicativo na App Store, então eles reconsiderariam a aprovação se nós removêssemos todas as ocorrências da palavra Walmart."

O aplicativo Funny Shoppers finalmente foi aprovado na quarta submissão, meses depois deste papo. Demorou tanto que, segundo Mike, eles nem estavam mais esperando. Depois do seu lançamento, o aplicativo "chegou à 36ª posição na categoria Entretenimento e chegou aos 275 aplicativos gratuitos mais vendidos entre todas as categorias" em apenas um dia. E então ele apareceu no Gizmodo.

Foi aí que a Apple ligou para o People of Walmart de novo. Dessa vez, não houve sugestões, somente outra mudança de opinião: eles não poderiam permitir aquele conteúdo obsceno na App Store. O aplicativo que eles tinham acabado de aprovar no dia anterior, depois de um processo de avaliação estúpido e demorado, seria imediatamente removido da loja. Para os desenvolvedores, era como estar lidando com um esquizofrênico. 

"Francamente, eu acredito que a Apple se surpreendeu com a popularidade do aplicativo. Claramente isso não foi um problema com o Shopper Fail [que sobreviveu perfeitamente bem até a carta de Cease And Desist], já que o número de downloads dele não chegou nem perto dos do aplicativo oficial do People of Walmart". Palavras do Mike. 

O povo da Alkali e do People of Walmart acredita que as coisas podem mudar de novo, mesmo se tiverem que passar por mais alguns meses de negociações com a Apple. Afinal de contas, segundo eles, softwares que exibem conteúdo questionável – segundo a definição mutante da Apple – são permitidos na App Store. Coisas como Cyanide and Happiness ou Texts From Last Night. Ou a Playboy.

Mas no fim das contas, o destino deles está nas mãos dos caprichosos deuses da App Store. Deuses que cravam SIMs e NÃOs seguindo pouca lógica ou método, desconsiderando se o desenvolvedor é uma grande publicação impressa ou um artista independente.

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