Depois de afetar humanos, coronavírus se espalha em cervos nos EUA

Há receio de que populações de cervos se tornem reservatórios do vírus - o que dificultaria o controle completo da pandemia entre humanos

O vírus por trás da Covid-19 não se espalha apenas entre humanos. A Dinamarca, por exemplo, precisou sacrificar milhões de minques (ou visons, animais que são muito usados na indústria de pele) por conta de surtos do coronavírus. Uma pesquisa parece confirmar que o Sars-CoV-2 está circulando livremente entre cervos. Os resultados foram publicados na Biorxiv.

Os coronavírus, em geral, são conhecidos por sua capacidade de infectar uma ampla gama de espécies. E, enquanto as verdadeiras origens desta pandemia ainda estão sendo discutidas, está claro que não demorou muito para o Sars-CoV-2 se sentir confortável em outros animais. Há registros de que gatos, cães e até mesmo primatas, como gorilas, já foram infectados pelo vírus.

Na maioria desses surtos relatados em animais, os humanos foram apontados como a fonte inicial de transmissão. Frequentemente, foram incidentes isolados, como zoológicos, onde um trabalhador pode infectar alguns animais antes que a cadeia de transmissão pare ali.

O novo estudo sugere que o vírus realmente se espalhou em pelo menos algumas populações de cervos de cauda branca nos Estados Unidos, e agora está se disseminando amplamente entre eles.

Pesquisadores da Universidade Estadual da Pensilvânia testaram amostras de linfonodos (glândula que faz parte do sistema imunológico) coletadas de cerca de 300 cervos em cativeiro e de vida livre que viviam no estado de Iowa, EUA, em busca da presença de RNA do coronavírus. As amostras vieram de um programa de vigilância para doenças debilitantes crônicas, patologias emergentes em cervos de muitos estados americanas. Entre setembro de 2020 e janeiro de 2021, cerca de um terço dessas amostras testou positivo para o vírus.

Além disso, as amostras de cervos de vida livre tinham maior probabilidade de testar positivo para o vírus do que as populações em cativeiro. E, quando os autores tentaram mapear a distribuição geográfica e a assinatura genética desses casos, determinaram que o micro-organismo havia sido transmitido de humanos para cervos várias vezes durante esses meses, e que estava se espalhando entre os animais de vida livre.

Em agosto, cientistas do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos divulgaram pesquisas sugerindo que até 40% dos cervos em Michigan, Nova York, Illinois e Pensilvânia carregavam anticorpos contra o coronavírus. Mas os autores dizem que o estudo é o primeiro a mostrar que o vírus quase certamente está circulando entre cervos selvagens de cauda branca, variedade mais abundante na América do Norte. E isso poderia trazer alguns desdobramentos sérios para nossa luta contra o coronavírus.

“Nossos resultados sugerem que os cervos têm potencial para emergir como um reservatório importante para Sars-CoV-2, uma descoberta que tem implicações importantes para a diversidade genômica do vírus e a trajetória futura da pandemia”, escreveram os autores.

Como explicam no artigo, os vírus que têm apenas um hospedeiro principal são mais fáceis de rastrear e prever em um nível evolutivo. Contudo, um vírus que se transmite entre várias espécies podem incorporar uma gama mais ampla de mutações à medida que se adaptam. Essas novas mutações, por sua vez, podem tornar o micróbio mais provável a resistir à imunidade de uma pessoa ou mais propenso a causar doenças graves.

Um Sars-CoV-2 que pula entre diferentes organismos também tem oportunidade de se misturar com outras espécies de coronavírus, permitindo novas mutações. Vemos essa dinâmica já acontecer com a gripe, que sofre mutações muito rapidamente, mas também pode trocar genes com os vírus da gripe comum a pássaros e porcos.

Às vezes, essa mistura pode produzir uma cepa pandêmica de gripe além da gripe sazonal com que lidamos todos os anos. O coronavírus também pode sofrer mutação e se tornar mais perigoso para os cervos, embora experimentos de laboratório tenham sugerido que a maioria dos cervos infectados não adoece atualmente.

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Claro, a pandemia ainda está em nossas vidas. Grande parte do mundo permanece não-vacinada, e pode levar anos até que o vírus fique sem humanos não imunizados para se hospedar. O vírus pode não se tornar endêmico em cervos como acontecerá em humanos, mas os riscos potenciais apresentados por outro hospedeiro animal próximo ao coronavírus definitivamente precisam ser acompanhados, dizem os autores.

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