Adolescentes teriam sido forçados a trabalhar horas extras para montar dispositivos da Amazon na China

Em julho, uma estudante de ensino médio de 17 anos na China estava colando um filme protetor em três mil unidades do alto-falante inteligente Amazon Echo por dia, em uma fábrica da Foxconn em Hengyang. Ela trabalhava dez horas por dia e seis dias por semana. E ela estava entre mais de mil estudantes empregados […]
Fachada de fábrica da Foxconn na China
Getty

Em julho, uma estudante de ensino médio de 17 anos na China estava colando um filme protetor em três mil unidades do alto-falante inteligente Amazon Echo por dia, em uma fábrica da Foxconn em Hengyang. Ela trabalhava dez horas por dia e seis dias por semana. E ela estava entre mais de mil estudantes empregados pela fábrica para trabalhar na montagem de dispositivos Amazon.

“Eu tentei contar ao gerente da minha linha que eu não queria fazer horas extras”, contou a estudante, que usa o pseudônimo Xiao Fang, aos pesquisadores anônimos que vazaram suas descobertas e as transcrições das entrevistas com os trabalhadores à Chinese Labor Watch. “Mas o gerente notificou o meu professor e o professor me disse que se eu não trabalhasse nas horas extras, eu não conseguiria um estágio na Foxconn e isso afetaria minhas candidaturas à graduação e às bolsas de estudo na escola. Eu não tinha escolha, eu só poderia suportar isso”.

O relatório da China Labor Watch, publicado na última quinta-feira (8), cobre uma investigação de 2019 na fábrica Foxconn de Hengang e o Guardian foi autorizado a analisar os documentos. Entre as descobertas do relatório estava a alegação de que os estudantes de ensino médio com idades entre 16 e 18 anos de diversos colégios foram recrutados para trabalhar na fábrica, e que os professores tinham a tarefa de pressioná-los a aceitar as horas extras ou os turnos noturnos. Isso significava ataques físicos e verbais aos estagiários, aponta o relatório.

Assim como Xiao, alguns dos estagiários tinham como tarefa montar dispositivos Echo, Echo Dot e Kindles, e eram empregados por dois meses para ajudar a preencher a falta de funcionários na fábrica.

Xiao Chen, 18, foi outro estudante que trabalhou na fábrica da Foxconn, de acordo com o relatório. Em setembro do ano passado, sua escola vocacional suspendeu as aulas para que todos os estudantes pudessem fazer estágios na fábrica. Alguns alunos reportaram o caso ao Gabinete de Educação de Hengyang. A segunda vez que Xiao trabalhou na fábrica foi por conta própria – ele trabalha em turnos à noite e monta dispositivos Echo para ajudar a pagar as despesas com os estudos. Ele trabalha durante dez horas por dia, seis dias por semana.

A investigação da China Labor Watch descobriu que a Foxconn recrutou 1.581 estagiários de escolas vocacionais até o dia 26 de julho. Os estagiários recebiam cerca de US$ 1,42 (R$ 5,60) por hora, um salário menor do que o do ano passado. Eles também não recebiam nenhuma bolsa ou bônus, algo que tinham em 2018. Os professores recebiam um subsídio de US$ 425 (R$ 1.675) da fábrica, e as escolas ganharam US$ 0,42 (R$ 1,60) por cada hora que um estagiário trabalhava, então havia um certo incentivo tanto para a fábrica quanto para a escola para que os estudantes trabalhassem por mais horas.

Embora não seja ilegal uma pessoa de 16 anos trabalhar na China, a prática viola a lei trabalhista do país pelo trabalho extra e os turnos à noite. Em notas de uma reunião a respeito do problema de potencialmente falhar nos objetivos de produtividade caso os estudantes deixassem de trabalhar nos turnos proibidos, a gerência deixou claro que estavam cientes do problema.

O Guardian cita um executivo da Foxconn dizendo aos participantes dessa reunião que “líderes da linha noturna deveriam fazer checagens com estagiários e professores com mais frequência e reportar quaisquer situações anormais para que os professores pudessem persuadir os estudantes a trabalhar à noite e fazer horas extras”.

Essa não é a primeira vez que a Foxconn se encontram em meio a uma controvérsia sobre suas práticas ilegais de trabalho com relação a jovens trabalhadores. Em 2017, seis estudantes entre 17 e 19 anos afirmaram que vinham trabalhando em turnos de 11 horas em uma planta da Foxconn na China como parte de um programa obrigatório de três meses de suas escolas. Os estudantes estavam em um grupo de três mil estagiários que tinham como tarefa montar o iPhone X.

O Gizmodo entrou em contato com a Amazon e um porta-voz nos enviou a seguinte nota:

Não toleramos violações do nosso Código de Conduta para Fornecedores. Regularmente avaliamos os nossos fornecedores, utilizando auditores independentes como é apropriado, para monitorar a adequação e melhorias – se encontramos violações, tomamos as medidas necessárias, incluindo a solicitação de correção imediata das ações. Estamos investigando com urgência essas alegações e checando com a Foxconn no nível mais sênior. Times adicionais de especialistas já chegaram ao local nesta semana para investigar, e iniciamos auditorias semanais sobre este problema.

Um porta-voz da Foxconn, parafraseado pelo Guardian, disse que a empresa “aumentaria o número de trabalhadores regulares e revisaria os salários imediatamente”.

Além de violar as leis trabalhistas da China, a prática de explorar estudantes para cumprir com as necessidades de produção durante os picos de demanda é uma droga, especialmente quando lembramos quanta grana a Amazon vai lucrar a partir do trabalho mau remunerado, cansativo e sem valor acadêmico desses estudantes.

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