Formigas agricultoras fazem ninho de todo tamanho e regeneram o solo

Pequenas agricultoras que cultivam fungos como alimento há milhões de anos, formigas cultivadoras de fungo pertencentes à tribo Attini constroem lares tão diferentes quanto quitinetes e arranha‑céus, influenciando diretamente a saúde dos solos e o ciclo de nutrientes.

Pequenas agricultoras que cultivam fungos como alimento há milhões de anos, formigas cultivadoras de fungo pertencentes à tribo Attini constroem lares tão diferentes quanto quitinetes e arranha‑céus,  influenciando diretamente a saúde dos solos e o ciclo de nutrientes. Ao radiografar 49 ninhos, pesquisadores acharam desde câmaras solitárias a 30 cm da superfície até túneis com 2,05 m de profundidade que ventilam o solo, reciclam nutrientes e guardam pistas sobre a própria evolução desses insetos‑fazendeiros. O novo estudo foi publicado nesta sexta‑feira (20 de junho) no Brazilian Journal of Biology.

banner

As formigas, de cinco gêneros diferentes, foram seguidas até as entradas dos ninhos, localizados no campus da Unesp em Rio Claro, São Paulo, Brasil, que foram marcadas e escavadas manualmente, e medidas como largura, profundidade e tamanho das câmaras foram registradas. Operárias e materiais encontrados nas câmaras, como fungos, larvas e pupas, foram levados ao laboratório para observações adicionais.

Também participaram pesquisadores da Uesb (Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia), UFV (Universidade Federal de Viçosa), Uema (Universidade Estadual do Maranhão) e Udesc (Universidade do Estado de Santa Catarina), em colaboração com a Uner (Universidad Nacional de Entre Ríos, Argentina).

A arquitetura dos ninhos mostrou-se altamente adaptável, variando conforme a linhagem evolutiva de cada gênero. Estruturas profundas e multi‑câmaras, como as do gênero Trachymyrmex (31 ninhos), aumentam a ventilação natural e aceleram a decomposição da matéria orgânica. Já ninhos superficiais, como os de Cyphomyrmex (4 ninhos) e Mycetarotes (3 ninhos), provocam impactos ambientais mais localizados.

Entender esse espectro ajuda a prever como as formigas responderão a mudanças climáticas, a calibrar práticas de recuperação de solos degradados e até a inspirar projetos de ventilação passiva em obras subterrâneas. Também foram analisados ninhos de Mycocepurus (7) e Myrmicocrypta (4).

“Essa variação revela que a construção do ninho é altamente adaptativa e não um traço fixo, o que surpreende e amplia nossa compreensão sobre a nidificação dessas espécies”, explica Aldenise Alves Moreira da Uesb, autora do estudo desenvolvido como parte de seu pós-doutorado, com a supervisão de Odair Correa Bueno, na Unesp. Para ela, o resultado aponta que, embora todas cultivem fungos, as estratégias de construção diferem bastante, refletindo distintas trajetórias evolutivas e ecológicas dentro do grupo Attini.

A pesquisadora ressalta que essas descobertas ajudam a entender melhor as relações históricas desses insetos. “Ao comparar as estruturas, é possível inferir padrões de ancestralidade e divergência entre os gêneros estudados”, diz. “As informações sobre os ninhos complementam dados genéticos e morfológicos, possibilitando uma visão mais integrada da evolução das formigas cultivadoras de fungos”, acrescenta. Moreira acredita que os dados podem ajudar a construir uma linha do tempo até as características observadas atualmente. “Isso ajuda a identificar como mudanças na organização do ninho podem ter sido respostas adaptativas a pressões ambientais ou funcionais, fornecendo pistas sobre a história natural desses insetos”, argumenta.

A investigação também pode ter papel na formulação de estratégias que levem em conta o impacto desses insetos sobre a agricultura e os ecossistemas florestais. “As formigas dessa tribo cultivam fungos porque eles metabolizam o material forrageado que as operárias coletam, transformando-o em alimento digerível”, explica. “Entender como fazem isso permite compreender a forma como organizam seu espaço, o que influencia o fluxo de nutrientes, a decomposição da matéria orgânica e a estrutura do solo”, diz. Como exemplo, cita que ninhos mais complexos, como os de Trachymyrmex, podem acelerar a ciclagem de nutrientes e favorecer a fertilidade do solo em ambientes florestais.

A equipe pretende, agora, ampliar o número de espécies analisadas para obter um panorama mais completo da diversidade estrutural. “Os próximos passos incluem o estudo das variações arquiteturais dentro das espécies, para entender o comportamento de escavação dos ninhos, a investigação da relação entre a arquitetura do ninho e a produtividade dos fungos cultivados e a exploração de como essas diferenças influenciam o papel ecológico das formigas em diferentes habitats”, conclui Aldenise Moreira.

DOI: https://doi.org/10.1590/1519-6984.294155

fique por dentro
das novidades giz Inscreva-se agora para receber em primeira mão todas as notícias sobre tecnologia, ciência e cultura, reviews e comparativos exclusivos de produtos, além de descontos imperdíveis em ofertas exclusivas