Fotos tiradas por aviões espiões na Guerra Fria revelam locais arqueológicos escondidos

Imagens captadas por aviões espiões U2 durante a Guerra Fria ajudaram a revelar locais arqueológicos no Oriente Médio e na Ásia.
Imagens captadas por aviões espiões U2
Imagem de aviões espiões U2 mostram armadilhas na Jordânia, usadas para prender animais há mais de 5.000 anos. Crédito: Emily Hammer e Jason Ur/Advances in Archaeological Practice

Durante a Guerra Fria, os Estados Unidos voou com aviões espiões U2 sobre a Europa, Oriente Médio e centro-leste da Ásia em busca de potenciais alvos militares. Essas missões sem querer reuniram informações históricas, que os arqueólogos estão usando agora para fins científicos.

Uma nova pesquisa publicada no mês passado o periódico científico Advances in Archaeologiccal Practical descreve o primeiro uso arqueológico de informações que deixaram de ser secretas de aviões espiões U2. Os autores do estudo, Emily Hammer, da Universidade da Pensilvânia, e Jason Ur, de Harvard, usaram as imagens históricas para identificar armadilhas de caça pré-históricas, antigos canais de irrigação e antigas aldeias pantanosas.

Voando a 17 mil pés acima do solo, aviões espiões U2 capturaram milhares de imagens durante a década de 1950 e 1960. As fotografias tiradas durante a missão, cujo codinome era Chess, foram finalmente liberadas pelos EUA em 1997, mas os dados não foram imediatamente indexados ou escaneados.

Inspirados por um pesquisados chinês que usaram imagens de aviões U2 para visualizar imagens aéreas históricas de uma cidade, Hammer e Ur decidiram tentar a sorte e verificar se esses dados continham valor científico. Eles tinham boas razões para serem otimistas, pois boa parte da paisagem da Europa, Oriente Médio e da Ásia mudaram desde a Guerra Fria, torando estes registros aéreos importantes tanto historicamente como do ponto de vista da arqueologia.

Para tornar os dados úteis, no entanto, Hammer e Ur tiveram de sistematicamente criar um índice de imagens de U2. Os pesquisadores selecionaram rolos de filme do centro de armazenamento do National Archieves no Kansas, que foram então transportados para uma seção de filmes aéreos de Maryland. Os rolos de filme selecionados incluíam milhares de cenas em baixa e alta resolução — literalmente, centenas de metros de filmes — que eram desenrolados e analisados em uma mesa de luz. Os pesquisadores fotografaram os negativos usando lentes macro de 100 milímetros. As fotos então foram “costuradas”, ajustadas e receberam referência geográfica com a ajuda de um software.

Imagem tirada em avião espião U2 comparada com imagem atualUm antigo canal visto de aviões espiões U2 (acima), e como está a mesma área (abaixo). Crédito: Emily Hammer e Jason Ur/Advances in Archaeological Practice

“Ao girar o carretel de um rolo de filme seguindo o caminho de um avião U2, você pode não saber exatamente o que verá em locais desconhecidos, então há um senso frequente de exploração e descoberta”, disse Hammer em um comunicado. “Em outras ocasiões, os pilotos estavam voando por regiões que eu conhecia por já ter viajado e estudado, e eu prendia um pouco a respiração, esperando que o avião tivesse desviado um pouquinho para a direita ou para a esquerda.”

“As fotos fornecem uma visão fascinante do Oriente Médio há várias décadas, mostrando, por exemplo, a Alepo (Síria) histórica muito antes da destruição ocorrida devido à guerra civil em andamento”, afirmou a pesquisadora.

O índice resultante permitiu que os cientistas fizessem um exame sem precedentes de armadilhas para animais no leste da Jordânia. Há cerca de 5.000 a 8.000 anos estas estruturas de parede de pedra eram usadas para prender gazelas e outros animais. Como Hammer e Ur apontaram no novo artigo, essas e outras estruturas estavam em muito melhor forma durante a Guerra Fria do que hoje.

“Fomos capazes de mapear muitos recursos que foram destruídos desde 1960 e não são mais visíveis nas imagens modernas”, escreveram os autores no estudo. “Isto é particularmente significante em vilarejos, currais e estruturas de rodas, que são menores que as do deserto e mais vulneráveis ao total apagamento pela agricultura e desenvolvimento modernos.”

Os pesquisadores analisaram também sistemas de canal de quase 3.000 anos de idade construídos pelos antigos assírios onde hoje é o Iraque. Esse sistema de irrigação “alimentou as capitais reais, tornou possível a produção de excedentes agrícolas e forneceu água para as aldeias”, observou Hammer no comunicado.

Local onde viviam os árabes do pântanoImagem de aviões espiões U2 mostram armadilhas na Jordânia, usadas para prender animais há mais de 5.000 anos. Crédito: Emily Hammer e Jason Ur/Advances in Archaeological Practice

O índice também ajudou a analisar eventos históricos recentes, mais especificamente uma pesquisa nas comunidades de Árabes do Pântano (Marsh Arabs) durante a década de 1950 e 1960. Essas comunidades desapareceram depois que represas para usinas hidrelétricas foram construídas na Turquia, Síria e no Iraque. Os novos dados permitiram aos pesquisadores visualizarem a disposição, o tamanho e a posição ambiental desses lugares históricos.

Este trabalho agora será colocado online e disponibilizado para outros pesquisadores, que poderão percorrer as imagens e realizar sua própria arqueologia das regiões documentadas — o que é bem legal, especialmente pensando no tanto de trabalho necessário para criar este registro histórico incrível e útil.

[Advances in Archaeological Practice]

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