Giz Explica: células-combustível e a caixa milagrosa da Bloom Energy

A Bloom Box é o mais recente milagre que parece ser bom demais pra ser verdade: debutando com um segmento de arregalar os olhos no programa 60 Minutes, ela promete ser limpa, barata e acessível, ou seja, a solução para os nossos problemas energéticos. Mas do que se trata?

A Bloom Box é o mais recente milagre que parece ser bom demais pra ser verdade: debutando com um segmento de arregalar os olhos no programa 60 Minutes, ela promete ser limpa, barata e acessível, ou seja, a solução para os nossos problemas energéticos. Mas do que se trata?

O coração da caixa é uma célula-combustível. Mas o CEO da Bloom Energy, K.R. Sridhar – um ex-cientista da NASA – diz que é um novo tipo de célula-combustível. E apesar de ser mais limpa que qualquer motor a combustão por aí, ela ainda depende de combustíveis fósseis e biocombustíveis. Ainda assim, o pessoal da Bloom está fazendo algo que talvez possa tornar a redução de emissões uma realidade primeiramente para grandes empresas, e em seguida para casas.

Para se ter uma boa ideia do porquê de nos preocuparmos com este treco, vamos primeiramente olhar o básico sobre a tecnologia de células-combustível.

Elementos da célula-combustível
Assim como uma bateria, uma célula-combustível é uma célula eletroquímica, o que basicamente significa que ela extrai energia de reações químicas. Sanduichado entre dois eletrodos – um ânodo e um cátodo – fica um material condutor de íons chamado eletrólito. O combustível flui por um lado sobre o ânodo. Um oxidante flui pelo outro lado sobre o cátodo. O que acontece, em extremo resumo, é que o combustível e o oxidante reagem, como se fossem estranhos travando olhares do outro lado de uma sala. As centelhas metafóricas que voam deste encontro são elétrons de fato, que fluem para o circuito da célula-combustível. Bingo, temos eletricidade. Assim como qualquer reação molecular, a recombinação de átomos produz resíduos também – como água e dióxido de carbono. Ou seja, apesar de ser mais limpa, definitivamente há um subproduto.

Só pra ficarmos claros, uma célula-combustível não é como uma bateria; é mais como uma usina de energia. Uma vez tendo convertido combustível em energia, ela envia esta energia para fora. E, deste modo, ela requer alguma maneira periférica de fisicamente armazenar os ingredientes do combustível e alguma maneira de capturar a eletricidade produzida – tal como uma bateria.

Existem diversos tipos de célula-combustível – o que não é nenhuma surpresa, visto que elas foram inventadas em meados da década de 1830. Em geral, elas são categorizadas de acordo com o material que compõe o eletrólito, mas às vezes elas são chamadas de acordo com seu combustível e oxidante, o que também varia. Você provavelmente está mais familiarizado com “células-combustível a hidrogênio”, como as que existem para carros e pequenos aparelhos eletrônicos. Estas são, de fato, células-combustível com membrana de troca de prótons (PEM), que por acaso usam hidrogênio como combustível e oxigênio como oxidante (a célula-combustível PEM é a especificamente diagramada acima).

Células-combustível de óxido sólido
Os Servidores de Energia da Bloom Energy são do tipo de célula-combustível de óxido sólido (SOFC). Existem duas maneiras de se fazer uma destas: um design tubular, como a que você pode ver acima, ou um design plano, como a que você pode ver abaixo, e que é o que a Bloom usa, visto que este design permite que elas sejam empilhadas em caixinhas arrumadinhas.

Uma célula-combustível de óxido sólido é feita inteiramente de materiais no estado sólido – ou seja, todo grande componente é feito de algo tipo cerâmica. A Bloom Energy diz que suas células-combustível são feitas de “areia” cozida em quadrados cerâmicos, e uma SOFC é exatamente isso. O material exato é um molho ligeiramente secreto, assim como as “tintas” preta e verde que recobrem as placas cerâmicas. A Bloom preparou uma animaçãozinha em Flash bem bacana para mostrar o processo básico.

A principal distinção entre uma SOFC e outro tipo de célula-combustível é que a composição do material significa que elas podem ficar insanamente quentes – até 980ºC, diz o Departamento de Energia dos EUA – e precisam disto, visto que os materiais cerâmicos não se tornam ativos até atingirem uma determinada temperatura. Somente a esta temperatura é que elas conseguem formar as reações químicas com o combustível e o oxidante conforme mostramos acima. O problema com as altas temperaturas operacionais é que, tradicionalmente, isto leva a custos de manutenção mais elevados. Sabe, as coisas se quebram de vez em quando. O objetivo desta tecnologia é ter um “aproveitamento” de 99,99%, conforme citado por Scott Samuelsen, diretor do Centro Nacional de Pesquisas de Célula-Combustível da Universidade da Califórnia em Irvine. O próprio ensaio da Bloom com o Google cita um aproveitamento 98%.

Os tipos de célula-combustível sobre os quais mais se ouve – as de “metanol” que já alimentam laptops – realizam a reação com uma temperatura muito mais baixa. A Toshiba possui uma que em geral opera entre 49º e 93ºC. Apesar da tecnologia da Bloom obviamente não ser uma que poderia servir de fonte de energia para um laptop, a temperatura operacional mais elevada da Bloom Box é uma grande vantagem em relação à tecnologia “mais antiga” de células-combustível. O Vice-Presidente de Marketing e Produtos da Bloom Energy, Stu Aaron, me contou que isto confere a eles “flexibilidade de combustível”. Eles podem usar biogases de aterros de lixo ou combustíveis fósseis como propano – até agora, nas demonstrações, tem sido meio a meio o uso dividido entre biogases e gás natural – enquanto as células-combustível de baixa temperatura requerem hidrogênio em um estado muito mais puro, ou seja, basicamente ele precisa ser refinado ou extraído via processos químicos.

Apesar de algumas outras SOFCs usarem a exaustão quente gerada pela reação mais ou menos como um cogerador – um meio de capturar calor emitido por um gerador de energia, para que este também possa ser convertido em energia – os Servidores de Energia da Bloom Energy simplesmente reciclam o calor dentro da célula, já q a temperatura gerada pela reação é quase exatamente a temperatura necessária para que a reação ocorra. O valor nominal de eficiência para o servidor de energia atual deles é superior a 50%, comparado com algo entre 10% e 15% de eficiência para a energia solar (apesar de pesquisadores da Universidade de Delaware recentemente terem atingido o recorde mundial de 42,8% para solar).

Novamente, para ficarmos claros, a energia gerada não é inteiramente livre de emissões: estes servidores geram uma pequena quantidade de CO2 quando convertem gás natural ou biogás. No entanto, é uma quantidade menor do que seria liberada caso o mesmo combustível fosse usado para uma combustão padrão. Os clientes podem escolher qual dos dois tipos de combustível eles gostariam de usar; o dilema fica entre “otimizar o custo ou a redução de carbono”, dependendo das prioridades da empresa, diz Aaron.

Eletricidade na Bloom

Neste momento, a única caixa que a Bloom está vendendo é um servidor de energia de 100kWh (você pode dar uma olhadinha nele aqui). Dentro existem milhares de células-combustível de óxido sólido – cada uma capaz de alimentar uma lâmpada. As células ficam dispostas em pilhas, que então são agregadas em módulos, e por aí vai, com uma entrada em comum de combustível. No momento, eles servem apenas para corporações – como Google e Coca-Cola – e custam entre 700 mil e 800 mil dólares cada. O objetivo é fazer com que cheguem a custar apenas 3 mil dólares, quando então ficariam aptos a uso doméstico. Isto pode ainda soar como muito custoso, mas eles acabam se pagando em um período de 3 a 5 anos, diz Aaron, com um custo de energia de 8 a 9 centavos por kWh em relação aos 13-14 centavos que geralmente custa na Califórnia (isto rendeu ao eBay uma economia de 100 mil dólares na conta de luz).

Mas o custo destes servidores é onde entra o verdadeiro ceticismo. Células-combustível não são uma tecnologia vodu. Elas funcionam. Elas produzem energia. O que os analistas – e outros – estão se perguntando é se a Bloom realmente descobriu o segredo de como torná-las baratas, ou se algum dia conseguirão fazê-lo. O crítico que discursava no 60 Minutos da CBS, Michael Kanellos da Green Tech Media, diz que apesar de haver uma chance de 20% de termos uma caixa de célula-combustível nos nossos porões em 10 anos, “ela provavelmente terá ‘GE’ escrito nela”. O que por mim está ótimo, porque significa toda uma nova temporada de piadas de 30 Rock.

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