Huawei rebate EUA lembrando de escândalo de espionagem revelado por Edward Snowden
“PRISM, PRISM meu, existe alguém mais confiável do que eu?”, disse o presidente rotativo da Huawei, Guo Ping, no palco do Mobile World Congress 2019, na terça-feira (26). Mas Guo não estava falando da Branca de Neve. Ele estava brincando com os enormes programas de vigilância mantidos pelos Estados Unidos.
A Huawei está sob pressão em todo o mundo, com países como Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Nova Zelândia e Austrália questionando supostos laços estreitos da empresa de tecnologia com o governo chinês e alertando sobre o potencial de espionagem de Pequim. O Departamento de Justiça dos EUA até mesmo acusou a Huawei de fraude, obstrução à justiça e roubo de segredos comerciais da T-Mobile durante uma estranha coletiva de imprensa no mês passado. Porém, em sua apresentação em Barcelona, Guo deixou claro que a empresa não permanecerá na defensiva.
Isso ficou claro quando Guo zoou os Estados Unidos com comentários sobre os esforços de vigilância em massa por parte dos americanos, especificamente um programa da Agência Nacional de Segurança que Edward Snowden revelou em 2013. Guo afirmou que a Huawei não só está implantando as tecnologias mais inovadoras do mundo, como também opera ambientes seguros para todos. Guo insistiu ainda durante seu discurso de abertura de 17 minutos que a empresa “não plantou e nunca plantará backdoors“, o que está se tornando rapidamente uma frase repetida da empresa.
Muito do conflito em torno da Huawei gira em volta da implementação da sua rede 5G. Os EUA expressaram preocupação de que uma infraestrutura 5G criada usando a tecnologia Huawei daria ao governo chinês habilidades de varredura para vigiar ou até controlar a rede mundial de comunicações de última geração.
“A ironia é que o Cloud Act, dos EUA (legislação sobre computação na nuvem), permite que suas entidades governamentais acessem dados além das fronteiras”, disse Guo. Ao falar sua frase “PRISM, PRISM meu, existe alguém mais confiável do que eu?”, uma brincadeira com o programa PRISM, da NSA, apareceu em uma tela atrás do executivo. O público, antes comedido, começou a soltar alguns aplausos aqui e outros ali.
“É uma questão importante. E, se você não entende isso, pode ir perguntar a Edward Snowden,” Guo continuou, arrancando risadas da plateia. “Não podemos usar prismas, bolas de cristal ou política para gerir a cibersegurança. É um desafio que todos nós compartilhamos.”
Guo reiterou esses comentários em um artigo de opinião publicado pelo Financial Times nesta semana, em que argumenta que “quanto mais equipamentos da Huawei são instalados nas redes de telecomunicações do mundo, mais difícil se torna para a NSA ‘coletar tudo'”.
Tanto no MWC quanto no Financial Times, Guo não mencionou os programas enormes de vigilância, censura e internação da China, é claro.
Você pode assistir a um clipe dos comentários de Guo no YouTube.
Snowden revelou o programa PRISM, da NSA, em junho de 2013, como uma das ferramentas da comunidade de inteligência americana para espionagem em todo o mundo. Após seu histórico vazamento de documentos classificados da NSA, Snowden fugiu para a Rússia e permanece lá em exílio, embora tenha declarado publicamente que gostaria de retornar aos Estados Unidos.
A Huawei está na defensiva há algum tempo, e executivos de alto escalão como o fundador e CEO da empresa, Ren Zhengfei, deram entrevistas raras à imprensa americana neste mês para insistir que a companhia não está agindo de acordo com os interesses do governo chinês.
A diretora financeira da Huawei, Meng Wanzhou, foi detida em Vancouver em 1º de dezembro de 2018, a pedido do governo dos EUA. Vale apontar que Meng é filha do CEO da Huawei, Ren Zhengfei, e o governo chinês afirmou que as acusações apresentadas pelo Departamento de Justiça dos EUA eram infundadas e politicamente motivadas. O presidente Donald Trump não ajudou em nada ao sugerir que Meng poderia ser libertada como parte de seu acordo comercial com a China.
Não há fim à vista para a batalha entre Huawei e o Ocidente. E à medida que os países do “outro” lado da Nova Guerra Fria (como a Rússia) cortam ainda mais sua internet do resto do mundo, é provável que vejamos uma balcanização da comunidade tecnológica que não existe desde os tempos da União Soviética.
O estereótipo da última Guerra Fria era de que o “outro” lado não tinha senso de humor. Mas isso parece ter mudado drasticamente, como Guo demonstrou. As empresas chinesas podem cantar rimas da Branca de Neve à vontade. Só não perguntem a elas sobre o Ursinho Pooh.