_Saúde

Mosquitos geneticamente modificados são soltos na Flórida para controlar doenças

O objetivo é que os insetos de laboratório tornem as fêmeas inférteis, evitando a proliferação de doenças como dengue e zika.

Imagem: Mario Tama (Getty Images)

Imagem: Mario Tama (Getty Images)

Dezenas de milhares de mosquitos machos estão sendo soltos no arquipélago de Florida Keys, no estado da Flórida, Estados Unidos. Mas não são mosquitos comuns: eles são geneticamente modificados e foram plantados em todo o estado de propósito. É parte de um plano para conter doenças causadas por esses insetos, e a ideia é justamente essa: liberar 1 bilhão de mosquitos.

O projeto marca a primeira vez que mosquitos geneticamente modificados foram liberados nos EUA. Trata-se de uma iniciativa do Distrito de Controle de Mosquitos de Florida Keys (FKMCD), em parceria com a empresa privada britânica de biotecnologia Oxitec. É uma tentativa de conter a propagação de doenças como dengue, zika e febre amarela.

“Como estamos observando o desenvolvimento de resistência a alguns de nossos métodos de controle atuais, precisamos de novas ferramentas para combater esse mosquito”, disse Andrea Leal, diretora executiva do Florida Keys Mosquito District, em um comunicado oficial.

A ideia é que os mosquitos de laboratório vão reduzir as populações de Aedes aegypti, que representam apenas 4% do total de mosquitos na região de Florida Keys, mas causaram 70% dos casos de dengue no ano passado. Para isso, caixas com ovos de mosquitos — duas em Cudjoe Key, uma em Ramrod Key e três em Vaca Key — foram colocadas em pontos estratégicos na última quinta-feira (29). A previsão é que os ovos eclodam daqui cerca de uma semana. Novas caixas serão instaladas nos próximos meses, liberando 12 mil insetos por semana durante 12 semanas.

Apenas as fêmeas da espécie Aedes aegypti mordem as pessoas em busca de sangue para amadurecer seus ovos. Assim, os cientistas criaram mosquitos geneticamente modificados, que eles chamam de espécies OX5034, para produzir filhotes fêmeas que morrem como larvas. A Oxitec, empresa por trás dos mosquitos, e o FKMCD esperam que os insetos acasalem com as fêmeas do Aedes aegypti. Uma vez que a prole feminina não consegue sobreviver por tempo suficiente para se reproduzir, isso deve reduzir a população de mosquitos transmissores de doenças.

Esta é apenas a primeira etapa do projeto. A Oxitec obteve uma licença de uso experimental da Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA) para liberar 1 bilhão desses mosquitos geneticamente modificados em 6.600 acres na Flórida e no Texas nos próximos dois anos.

A Oxitec afirma que esse método é “seguro” e “ecologicamente correto”. Possui um histórico de sucesso com testes de campo nas Ilhas Cayman, Panamá, Malásia e aqui no Brasil. A companhia também observa que o projeto foi aprovado pela EPA e pelo Departamento de Agricultura e Serviços ao Consumidor da Flórida, e também tem o apoio do Centros de Controle de Doenças (CDC) e de um conselho de consultores independentes.

Moradores reclamam

Cidadãos residentes de Florida Keys não têm tanta certeza de que a liberação dos mosquitos de laboratório foi uma boa ideia. E eles têm motivos para se preocupar. Os moradores disseram à Vice que não foram notificados sobre onde os insetos seriam deixados — isso só foi descoberto pouco tempo antes de começarem a ser liberados.

Um estudo da Universidade Yale de 2019 também alertou que o tiro poderia sair pela culatra. Os cientistas descobriram que, embora a maioria das crias femininas dos insetos modificados morram, entre 3% e 4% delas geralmente sobrevivem até a idade adulta, e não está claro se são inférteis. Isso significa que, ao acasalar com os mosquitos transmissores de doenças, os mosquitos da Oxitec poderiam criar bebês híbridos que poderiam ser mais resistentes aos inseticidas do que os mosquitos selvagens e, por consequência, piorar a disseminação da doença.

Também existem preocupações sobre como os mosquitos de laboratório vão interagir com os ecossistemas de Florida Keys. Um estudo de campo sobre os mosquitos do Brasil descobriu que os genes modificados pelos insetos se espalharam em populações de mosquitos selvagens. Não está claro quais efeitos ecológicos isso poderia ter em Florida Keys — o que é preocupante, uma vez que a região é o lar de habitats sensíveis. No mês passado, um painel de especialistas defendeu que a EPA ponha um fim ao projeto.

“A liberação de mosquitos geneticamente modificados coloca os habitantes da Flórida, o meio ambiente e as espécies ameaçadas de extinção em risco no meio de uma pandemia”, disse Dana Perls, gerente do programa de alimentos e tecnologia da organização ambiental Friends of the Earth. “Este lançamento é para maximizar os lucros da Oxitec, e não sobre a necessidade urgente de lidar com doenças transmitidas por mosquitos”, completou.

Sair da versão mobile