Nordeste mostra que começa a se destacar na cena de desenvolvimento de jogos do país
por Bruno Izidro*
Quando falamos da cena de desenvolvimento de games no país, sempre pensamos nas regiões sul, sudeste e, mais recentemente, Centro-Oeste (com a Behold Studios), mas agora o Nordeste também quer entrar nesse mapa e a produção da região foi mostrada no Sana, evento de cultura pop que aconteceu no último fim de semana, em Fortaleza.
Pela primeira vez em 15 anos do evento, um espaço foi dedicado aos desenvolvedores indies e, segundo o diretor do Sana, Igor Lucena, isso foi possível porque a organização percebeu um crescimento dessa cena na região. O espaço era pequeno, é verdade, ou uma “área embrionária”, como Lucena gosta de falar, mas algo positivo é que nada foi cobrado dos estúdios para que eles expusessem por lá. “A gente não tá aqui pra cobrar do cara e criar mais um problema, a gente tá aqui pra mostrar uma solução”, disse o diretor do Sana ao Gizmodo. “[O espaço para os indies serve] pra mostrar que existe talento e mercado, pra gente isso é muito importante”.
Com isso, dois estúdios do Ceará, a High Five Studios e o Bugaboo Studios, mostraram seus jogos para o público, estimado em mais de 70 mil nos três dias de evento. Conversamos com eles e com a Prosperity Games, da Paraíba, para sabermos um pouco mais de como é esse retrato da cena de jogos no Nordeste.
Apostando no seguro
Os cearenses do High Five e do Bugaboo ainda apostam naquilo que é mais seguro: jogos mobile e desenvolver advergames para empresas. “O cliente não vai te contratar se você não tiver experiência e você não vai demonstrar experiência se não fizer jogo, então fica essa ouroboros, a cobra comendo o próprio rabo”, comenta Ítalo Furtado, da High Five. Com pouco mais de seis meses de atividades, a High Five está com vários projetos com esse objetivo de criar portfólio, mas já começa a desenvolver seu primeiro jogo próprio, chamado DayDream.
A Bugaboo está no mesmo barco, mas aponta também uma caraterísticas curiosa dos estúdios locais. “Tem muito estúdio de games por aqui que a galera não conhece porque eles não se mostram. Até nós mesmo estamos ainda muito escondidos”, fala Wescley Guilherme, game design e artista da Bugaboo.
A razão para tanta timidez, segundo ele, são os estúdios não terem muito o que mostrar, o que – pelo menos no Sana – não era o caso da Bugaboo. Eles estavam no evento para mostrar Dead Fish Escape, o primeiro jogo comercial do estúdio, um runner para iOS e Android que deve ser lançado em breve. Abaixo, o desenvolvedor mostra como é o jogo.
Algo em que tanto Bugaboo quanto High Five concordam é que a cena está melhorando muito por causa do surgimento de cursos voltados para o desenvolvimento de jogos na região e incentivos, como o do Sebrae. “Nós temos apoio e demanda, o Sabrae, por exemplo é uma ferramenta de apoio fortíssima. O problema maior que a gente encontra é de pessoas que queiram investir nisso como carreira profissional”, fala Ítalo Furtado, da High Five. Ainda segundo ele, a região possui muitos bons profissionais em programação e arte, mas poucos com dedicação na área de games.
Deuses nordestinos
Enquanto em algumas regiões do Nordeste os estúdios ainda estão tímidos e só agora começam a mostrar seus trabalhos, em outras os desenvolvedores começam a ganhar notoriedade, é o caso dos paraibanos da Prosperity Games. Eles devem lançar esse ano Full Metal Wars, um jogo online para PC e com enfoque em competições. Não parece muito atrativo falando assim, não é? Mas o interessante é que o game combina elementos de jogos de luta com batalhas estratégicas por turnos.
Não foi à toa que Full Metal Wars ganhou o prêmio Demonnight no BIG Festival do ano passado. O jogo faz uma junção bem inesperada de deuses nórdicos e robôs gigantes (chamados Ragnatron) e segundo o diretor da Prosperity Games, Miguel Oliveira, a ideia é construir um time de três robôs e desafiar os amigos. “No futuro, teremos torneios regionais, campeonatos nacionais, campanhas solo com modo história e muito mais”, conta.
Esse é apenas o primeiro jogo do estúdio e talvez eles já tenham atingido esse nível por estarem em uma região mais propícia como Campina Grande, que possui um polo tecnológico e universidades que já investem bastante em cursos de desenvolvimento. Isso também acontece na Paraíba com seu Porto Digital.
Isso faz com que os problemas enfrentados pelos cearenses, como poucos profissionais empenhados e falta de cursos voltados para a área, não sejam tão sentidos, mas Miguel ressalta outra dificuldade para as desenvolvedores locais: a distância dos grandes centros como São Paulo. “Isso faz com que as empresas do Nordeste precisem enviar pessoas para o Sul e Sudeste para fechar negócios, fazer apresentações, buscar investidores ou até mesmo mostrar os games aos jogadores em eventos”, comenta.
É aí que entra a importância de eventos como o Sana, que possibilita que o próprio público conheça os jogos que estão sendo criados na região. Foi assim que o adolescente Alef Santos, de 14 anos, soube da existência de jogos como Dead Fish Escape. Enquanto eu entrevistava o desenvolvedor da Bugaboo, ele trazia um amigo para experimentar o jogo. “Olha, esse aqui é bem difícil”, falava. Alef foi atraído não só pela dificuldade do jogo como também por estar em um tablet, a plataforma na qual ele mais joga.
A surpresa dele também foi grande ao saber que aquele jogo era feito ali mesmo em Fortaleza. “Normalmente jogos assim são com gráficos mais elaborados, como esse”, apontando para o jogo dos Cavaleiros do Zodíaco que estava exposto bem em frete.
Com dificuldades comuns encontradas nas outras regiões, a cena de desenvolvimento de jogos no Nordeste vai, aos poucos, se mostrando. Ainda há muito para se crescer e como a própria área dedicada aos jogos indies no Sana, o desenvolvimento de jogos na região ainda está em estágios embrionários. Talvez também seja hora de voltarmos mais nossa atenção para lá, onde jogos interessantes começam a surgir.
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Bruno Izidro viajou para o SANA a convite da organização do evento.