Nossos hackers ainda precisam de uma boa dose de jornalismo

Hoje um grupo de hackers, que alegam ser do Anonymous Brasil, invadiu o perfil do Twitter do G1, portal de notícias das Organizações Globo, e postou uma série de mensagens de “protesto” contra a Rede Globo, a forma como eles tratam manifestantes, e outras coisas. Tá bom, e daí? Há pouco mais de dois anos […]
O hacker adolescente.

Hoje um grupo de hackers, que alegam ser do Anonymous Brasil, invadiu o perfil do Twitter do G1, portal de notícias das Organizações Globo, e postou uma série de mensagens de “protesto” contra a Rede Globo, a forma como eles tratam manifestantes, e outras coisas. Tá bom, e daí?

Há pouco mais de dois anos um outro grupo de hackers do Lulzsec invadiram uma série de sites governamentais e alguns bancos. Na época, o nosso ex-editor-chefe Pedro Burgos escreveu este belo post falando que eles precisavam aprender um pouco de jornalismo. A série de ataques parecia mais brincadeira de moleque do que qualquer forma de protesto, não levou nada a lugar nenhum e o tal do Lulzsec já foi esquecido. E agora, dois anos depois, ataques parecidos atingem perfis de veículos de imprensa no Twitter (o perfil da Revista Veja também foi invadido há algum tempo). De que adianta fazer esse tipo de coisa?

Vamos deixar nossas possíveis divergências com a linha editorial da Globo e da Veja de lado e analisar o que significa uma invasão ao perfil do Twitter: nada. Postar mensagens contra a Globo no Twitter do G1 não vai fazer ninguém parar de assistir a Globo, não vai fazer com que a Globo mude a sua linha editorial, não vai fazer absolutamente nada. Na verdade só vai ter uma consequência, que é a mudança na senha do G1 e um cuidado maior com isso. E só.

Muito do que o Pedro escreveu em 2011 vale para 2013: os hackers podem usar seus conhecimentos para coisas melhores:

Na teoria, jornalistas honestos e a chamada nova geração de hackers “idealistas” fazem basicamente a mesma coisa: lutam por uma maior transparência do governo e publicam informações à revelia de quem está fazendo coisa errada, para que a sociedade sempre deixe os donos do poder em xeque. Antigamente, para se conseguir acesso às informações era preciso um trabalho enorme de apuração, conhecer as pessoas certas e fontes confiáveis. Hoje, quando há cada vez mais informações guardadas em redes de computador – abertas ou não – as pessoas que têm habilidade de peneirar tantos bytes e conseguir acesso a áreas ocultas podem desempenhar a mesma função ideal dos jornalistas. E isso é ótimo para a democracia.

O problema é que, ao menos nos incidentes recentes, na prática tem havido uma grande diferença no modo de atuação dos dois grupos, que tem desmoralizado bastante este novo “movimento” hacker, ao menos no Brasil: há um bocado de baderna pela baderna, excesso de vaidade e pressa em divulgar os “feitos”.

Sim, baderna por baderna e excesso de vaidade ainda caracterizam esses ataques recentes. Ao invadir o perfil do G1, os hackers logo se identificam: são do Anonymous Brasil. E daí? Tomar o controle de um perfil do Twitter apenas permite que esses hackers enviem mensagens para os seguidores do G1 e nada mais.

Muita coisa está errada no Brasil, e você pode até achar que a Globo e a Veja são culpadas por parte desses problemas. Mas há formas mais eficazes de descobrir e denunciar o que há de errado, e, se você acha que a Editora Abril e as Organizações Globo (ou qualquer outro grupo de mídia) não fazem o que devem, então eis uma boa notícia: você pode fazer algo. Voltemos ao que o Pedro sugeriu em 2011: muitos dados do governo estão disponíveis na internet, portais de transparência foram criados com informações sobre um monte de coisa que o governo faz – nas esferas federais, estaduais e municipais.

Compare o patrimônio declarado de políticos em diferentes estágios de sua carreira (exemplo), veja os financiadores de campanha e cruze com alguns de seus projetos ou emendas orçamentárias aprovadas na câmara, por exemplo. De novo, não é tão difícil. Antigamente (antigamente, há pouco mais de 5 anos) quase nenhuma dessas informações era aberta. Hoje, ao contrário, uma enorme parte do que o governo faz está aberto para consulta pública. Pode estar em PDFs assustadores como no Diário Oficial, no SIAFI, com dados acessíveis a qualquer cidadão pela web ou, de maneira um pouco melhor organizada, no Portal da Transparência. Mas há um monte de corrupção, contratos nebulosos e todo tipo de irregularidade abaixo dos nossos narizes, no meio de todas as páginas pouco úteis da rede.

Portanto, os hackers que invadem contas no Twitter não estão fazendo nada para ajudar a melhorar a transparência no Brasil, a combater a corrupção ou seja lá qual for a bandeira levantada. Na verdade, eles só reforçam a ideia de que devemos ter mais cuidado com as nossas senhas, seja de um perfil pessoal ou do perfil de veículos no Twitter. Tirando isso, não contribuem em nada. Os hackers que se consideram “ativistas” no Brasil precisam, urgentemente, encontrar formas mais inteligentes de contribuir para melhorar o país – e o caminho não vai ser encontrado no Twitter. [Imagem: olly/Shutterstock]

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