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Google diz para funcionários que denunciam discriminação cuidarem da saúde mental

Denúncias contra o Google foram feitas após diversos relatos de ex-funcionários e funcionários atuais ao canal NBC.

Imagem: Kenzo Tribouillard/Getty Images

Não é nenhum segredo que o Google tem vários problemas internos sérios com racismo e sexismo, mas agora veio à tona que, quando os funcionários apresentam incidentes de discriminação no local de trabalho ao RH, eles costumam receber esta resposta bem desconcertante: faça terapia.

Isso tudo foi divulgado após relatos de ex-funcionários e funcionários atuais do Google que falaram com a NBC News, incluindo duas mulheres negras, Timnit Gebru e April Curley, cujas demissões mal explicadas no ano passado renderam muitas críticas ao Google.

Gebru, que anteriormente coliderou a equipe de Inteligência Artificial Ética do Google, afirma que foi demitida após criticar os protocolos de diversidade da empresa e as tentativas da gerência de censurar pesquisas críticas aos produtos do Google. Antes de sair, Gebru disse que ela repetidamente levantou preocupações sobre como as mulheres eram maltratadas no ambiente de trabalho. Contudo, as respostas dos profissionais do recursos humanos era sempre a mesma: simplesmente a encorajaram a buscar meios de lidar com sua saúde mental.

“Eles ficam tipo, ‘bem, se há algo errado com você, então aqui estão todos esses recursos terapêuticos’”, disse Gebru ao canal. “E eu respondia que nenhum sistema de suporte vai se livrar do ambiente de trabalho hostil do Google. Eu tenho amigos. Eu saio para dançar. Já tenho hobbies e terapia.”

Já April Curley foi discretamente demitida de seu papel como recrutadora de diversidade em setembro de 2020. Em uma sequência de tuítes publicados em seu perfil, que viralizaram, ela apresentou detalhes de sua experiência com o racismo flagrante em toda a cultura corporativa do Google.

Durante seus seis anos por lá, ela revelou que denunciou dois gerentes por supostamente maltratar a ela e sua equipe, que enfrentou resistência por se manifestar, o que incluiu um corte de US$ 20.000 em 2019 junto com um aviso formal sobre seu desempenho no trabalho. Quando ela contou ao RH sobre suas preocupações, em vez de abordar o comportamento inadequado de seus colegas de trabalho, eles sugeriram que ela tirasse uma licença médica para cuidar de sua saúde mental, conforme exposto na NBC.

A reportagem falou com nove outras pessoas. Elas disseram ter tido experiências semelhantes depois de relatar assédio sexual e comentários racistas ao RH. Eles também receberam a mesma sugestão — tirar licença médica para tratar de sua saúde mental — ao levantar preocupações sobre suposta retaliação ou defender a igualdade de remuneração entre funcionários brancos e negros do Google. Outras 12 testemunhas confirmaram à NBC que essa é uma prática se tornou comum na empresa.

Dos trabalhadores que optaram pelo afastamento médico, vários disseram que, ao voltar, descobriam que tinham novos gerentes ou foram transferidos para outros departamentos. Como o Google associa promoções e aumentos às avaliações de desempenho da gerência, esses funcionários alegaram que perderam oportunidades porque seus novos gerentes não os conheciam há tempo suficiente para avaliar adequadamente seu desempenho.

Uma funcionária atual que falou com a NBC sob condição de anonimato relatou que um gerente descartou suas preocupações sobre o fracasso do Google em lidar com as disparidades raciais generalizadas no local de trabalho. Quando a funcionária, uma mulher negra, reclamou com o RH, eles sugeriram que ela instruísse o gerente sobre onde havia errado ou pedisse seu afastamento. “Parecia depreciativo. Não fiquei em choque porque já tinha ouvido isso antes. Eu tinha visto outros líderes da organização tirarem essas licenças de saúde mental e depois desaparecerem”, disse ela ao meio de comunicação. “Estava claro que eles não iriam me levar a sério.”

Outro caso complicado: após Claire Stapleton — uma ex-funcionária que organizou uma paralisação em 2018, como forma de protestar contra a maneira com que o Google lidou com as acusações de agressão e assédio sexual — se queixar de ter sido rebaixada após o protesto para o RH, foi instruída a tentar técnicas de mindfulness (um tipo de meditação) para melhorar seu relacionamento com seu gerente. E que outra sugestão ela recebeu? Pois é, você adivinhou: tirar licença médica para cuidar da saúde mental.

O Google não respondeu imediatamente ao pedido de comentário do Gizmodo. Em uma declaração à NBC, a empresa disse que está comprometida em apoiar seus funcionários que denunciam os maus-tratos no local de trabalho:

“Temos um processo bem definido de como os funcionários podem levantar preocupações e trabalhamos para ser extremamente transparentes sobre como lidamos com as reclamações. Todas as preocupações que nos são comunicadas são investigadas rigorosamente e tomamos medidas firmes contra os funcionários que violam as nossas políticas.”

O Google se recusou a comentar sobre várias alegações na reportagem da NBC, mas disse que a empresa oferece uma variedade de opções para os funcionários levantarem preocupações e investiga todos os relatórios de retaliação. “Se um funcionário deseja obter uma licença ou acomodação no local de trabalho, a equipe de benefícios do Google trabalhará com o indivíduo nas próximas etapas”, disse um porta-voz da empresa ao veículo.

O Google investiu centenas de milhões de dólares em esforços de diversidade ao longo dos anos. Mas até agora, os resultados têm sido desanimadores, de acordo com os relatórios de diversidade da empresa. Entretanto, vale lembrar que seus concorrentes no Vale do Silício também não estão se saindo muito bem. Entre 2019 e 2020, a porcentagem de contratações de negros no Google aumentou em menos de 1%, enquanto a porcentagem de contratações de latinos e nativos americanos diminuiu. No mês passado, a empresa concordou em pagar US$ 3,8 milhões para resolver as acusações de “compensação sistêmica e discriminação na contratação” apresentadas por mais de 5.000 mulheres e engenheiros asiáticos.

A empresa disse recentemente que está lançando novos procedimentos para lidar com saídas de funcionários lesados e revisando suas políticas de diversidade, de acordo com o Axios. A decisão veio após uma investigação interna sobre a demissão de Gebru, cujos resultados o Google se recusou a revelar. Com base nessas últimas alegações, percebemos que há muito trabalho a ser feito pela companhia. Será que posso sugerir terapia? Talvez assim a gestão do Google possa manifestar algumas políticas de diversidade com mais foco.

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