
Novo estudo destaca DNA dos brasileiros como o mais miscigenado do mundo
Nós, brasileiros, sabemos desde criança que o nosso povo é o mais miscigenado do mundo devido à história de nossa colonização. Porém, agora, um estudo comprova essa tese sobre o nosso DNA.
Cientistas da USP, em parceria com o Instituto de Biologia Evolutiva da Espanha (IBE), decodificaram o genoma da população brasileira. O trabalho não foi fácil, já que o DNA brasileiro é extremamente miscigenado, reunindo genes africanos, indígenas e europeus.
Publicado na revista Science no último dia 15, o estudo representa o maior dataset genético do Brasil: 2.723 análises completas de genomas, representando comunidades diversas das cinco regiões do país.
Os cientistas realizaram o sequenciamento de ampla cobertura com cada genoma analisado 35 vezes. As amostras são de pessoas que vivem em áreas urbanas, rurais e ribeirinhas. Além de ter o DNA mais miscigenado, os cientistas descobriram que o brasileiro possui mais de 8 milhões de variantes genéticas até então desconhecidas, com 36 mil sendo nocivas à saúde.

Imagem: USP/Science/Reprodução
Os cientistas detectaram variantes nocivas em 450 genes associados a doenças cardiovasculares e obesidade. Em 815 genes, há marcadores de infecções como malária, hepatite, gripe, tuberculose e leishmaniose.
“O Brasil tem a maior diversidade africana no continente americano, com um alto nível de miscigenação. Estudar esse fenômeno pode ajudar a compreender a saúde da população brasileira”, declarou Tábita Hünemeier, geneticista brasileira que liderou o estudo.
DNA mais miscigenado do mundo: a rápida evolução genética dos brasileiros
Além disso, o estudo revelou sinais de ações recentes da seleção natural em genes relacionados à fertilidade, imunidade e metabolismo. Diferentemente do típico processo evolutivo, que ocorre durante milênios, o caso do DNA brasileiro mostra uma seleção acelerada em poucos séculos.
Obviamente, essa evolução genética se dá sobretudo a partir da colonização europeia, que trouxe novas doenças à população indígena.
Portanto, o panorama genômico do Brasil é um reflexo dos eventos históricos. A chegada de cinco milhões de europeus e a mesma quantidade de africanos que vieram à força, bem como o declínio da população nativa, são visíveis nos dados genéticos.
Distribuição genética
Embora o DNA brasileiro seja o mais miscigenado do mundo, algumas regiões apresentam diferentes recortes genéticos.

Imagem: Pexels/Reprodução
O norte tem mais ancestralidade indígena, enquanto o nordeste apresenta um genoma africano maior. No sul, genes europeus são mais comuns, enquanto o sudeste e o centro-oeste apresentam o DNA mais miscigenado. A média do DNA nacional é 60% europeia, 27% africana e 13% indígena.
Os cientistas chegaram a esses resultados observando evidências genéticas de reprodução assimétrica. Ou seja: linhagens paternas europeias dominam os cromossomos Y, enquanto as linhagens africanas e indígenas estão presentes no DNA mitocondrial.
Genomas do Brasil
Tais dados refletem o comportamento dos portugueses no período colonial. No entanto, o estudo identifica que o DNA brasileiro se torna o mais miscigenado do mundo durante os séculos 18 e 19.
Esse período corresponde a eventos como o Ciclo do Ouro, que intensificou a migração portuguesa, além do aumento do tráfico de escravizados. O auge da miscigenação tem como característica principal uniões entre europeus e mulheres indígenas e africanas.

Imagem: Pexels/Reprodução
Contudo, gerações mais recentes apresentam uma tendência de relacionamento com parceiros do mesmo grupo ancestral. E isso ocorre em todas as regiões, mas, conforme os autores, o genoma dos brasileiros representam um mosaico global de haplótipos.
Lygia Pereira, uma das autoras do estudo, destaca a necessidade de tal pesquisa. “Não é porque o brasileiro é algum tipo de marciano; é porque a gente até agora só sequenciava DNA de gente branca”, afirma.
De fato, a maioria dos bancos de dados genéticos globais é composta por dados de populações brancas do norte da Europa e dos EUA. Por isso, o banco de dados genético brasileiro oferece uma ferramenta poderosa para pesquisas futuras devido ao DNA super miscigenado.
O estudo faz parte do projeto Genomas do Brasil, do Ministério da Saúde, no âmbito da iniciativa “DNA do Brasil”, da USP. A intenção é sequenciar o genoma de 100 mil brasileiros.