O Plano Pokémon: como um desenho inspirou o Exército americano a inventar uma arma de convulsão

Em 1998, uma análise secreta de inteligência do exército americano sugeriu uma nova maneira de eliminar inimigos: atacá-los com energia eletromagnética até que seus cérebros sobrecarreguem e eles comecem a convulsionar. Incrivelmente, essa foi uma ideia inspirada por um episódio de Pokémon. Aplicação de “pulsos eletromagnéticos” podem forçar todos os neurônios a funcionarem ao mesmo […]

Em 1998, uma análise secreta de inteligência do exército americano sugeriu uma nova maneira de eliminar inimigos: atacá-los com energia eletromagnética até que seus cérebros sobrecarreguem e eles comecem a convulsionar. Incrivelmente, essa foi uma ideia inspirada por um episódio de Pokémon.

Aplicação de “pulsos eletromagnéticos” podem forçar todos os neurônios a funcionarem ao mesmo tempo, causando um “rompimento no controle voluntario dos músculos”, diz a descrição de uma proposta arma de convulsão, contida em um documento não mais confidencial do National Ground Intelligence Center. “Conclui-se que usar um método que atingiria as sinapses dos nervos diretamente com um campo elétrico, essencialmente 100% dos indivíduos seriam suscetíveis à indução de convulsão.”

Esse não é o único método que o Centro sugere para tirar de combate os inimigos. Outros exóticos, porém menos letais, incluem uma arma de mão a laser para curtas distancias para “ações em operações especiais antiterroristas”; uma “inundação” do tráfego da rede que sobrecarregaria servidores e “induziria um pânico na população civil”; e radiofrequências que podem manipular o corpo de alguém e “simular uma febre.”

Os militares precisam de armas como essas porque notícias de TV pressionaram e diminuíram a tradicional propensão militar de matar pelo caminho da vitória: agora você vive em um mundo que diz “você não ganha a não ser que a CNN diga que você ganhou”, o relatório lamenta. Mas enquanto o Pentágono ainda lamenta o impacto dos sistema de notícias 24h por dia sobre os militares americanos, ele dificilmente pensa que armas menos letais são a solução para isso. Em fato, os Estados Unidos mantêm a maior parte de seu arsenal eletromagnético fora do campo de batalha, em parte por causa da ideia de que raios de dor invisíveis ficariam bem estranho se comentados por um âncora de telejornal.

O Danger Room adquiriu esse estudo secreto sobre tecnologias não letais graças a um cidadão comum, que preencheu um pedido do Ato de Liberdade de Informação, e que agora deseja permanecer anônimo. Por coincidência, Sharon Weinberger escreveu um relatório em 2008 no Danger Room após independentemente adquirir um pedaço do documento – um adendo descrevendo o uso de uma arma chamada “Voz de Deus”, movida por ondas de rádio, para “implantar” uma sugestão na mente de alguém. E essa não está nem perto de ser a sugestão mais estranha para armas exóticas.

Talvez o item mais perturbador na lista de desejos de armas não letais do exército: uma arma que possa interromper as vias químicas no sistema nervoso central e induzir a convulsão. A ideia parece ter vindo de um episódio de Pokémon

A ideia seria a convulsão ser induzida por um estímulo elétrico específico ativado por um nervo óptico. “O início da sincronia e perturbação do controle muscular é aparentemente próxima de instantânea”, diz o relatório do exército de 1997. “A excitação é diretamente no cérebro.” E “100% da população” é supostamente suscetível aos efeitos – em distâncias de “até centenas de metros” – “espera-se que os tempos de recuperação sejam consistentes com, ou mais rápido que, aqueles observados em convulsões epilépticas.”

Isso não é muito tempo – a análise do exército notou que uma convulsão causada por uma crise tônico-clônica normalmente dura entre um e cinco minutos. Mas a análise especula que armas de convulsão possam ser “ajustadas considerando o tipo e grau de influencia corporal” e afetar “100% da população.” Ainda, o documento admite, “nenhuma evidência experimental está disponível para esse conceito.”

O documento alerta que a eficácia de incapacitar o sistema nervoso humano com um pulso eletromagnético (EMP) “não foi testado.” Mas a análise especula que “50 até 100 kV/m em ondas bem agudas” seria provavelmente o “suficiente para ativar neurônios ou fazê-los ficarem mais suscetíveis a ativação”. E uma arma que aproveitasse uma convulsão induzida por um EMP poderia trabalhar de maneira oculta a “centenas de milhas” de distância.

“O fenômeno da convulsão fótica induzida foi demonstrada em 16 de dezembro de 1997 na televisão japonesa, quando centenas de espectadores foram expostos, inadvertidamente, a convulsão fótica induzida”, a análise cita. O desenho citado é Pokémon, e o incidente recebeu atenção global. Cerca de 700 espectadores demonstraram sintomas de epilepsia – a maioria vomitando – algo que pode acontecer, mas de forma incomum, com programas de TV e videogames com muitas luzes piscando rapidamente.

O interesse do exército americano na tecnologia não parece ter ido para frente. Quando o Danger Room perguntou ao Joint Non-Lethal Weapons Directorate, o comando que supervisiona as armas que não podem matar você do Pentágono, se eles teriam desenvolvido ou explorado um raio de convulsão EMP, a porta-voz Kelley Hughes terminantemente respondeu “não”. Mas, no mínimo, é bizarro pensar que os militares americanos cogitam a ideia de um armamento neurológico.

O raio da convulsão foi apenas uma das armas futurísticas não letais que o National Ground Intelligence Center imaginou. Outro favorito: “armas portáteis a laser” para explodir luzes focalizadas contra terroristas próximos. Esses não devem ser do tipo de lasers que podem queimar através de aço – afinal, aproximadamente 15 anos após o relatório de inteligência do exército, a marinha ainda não tem um canhão laser pequeno o suficiente para montar em um navio. Os lasers “mire e atire” são supostamente armas de direcionamento de energia, para perturbar sensores do corpo ou mesmo cegar assaltantes a até 50 metros de distância. Infelizmente, o documento lamenta, causar “cegueira permanente” foi proibido por tratados internacionais, então o desenvolvimento de armas de energia direcional portáteis seria restrito.

Depois vieram as “cyberarmas”. A inteligência do exército reportou precisamente a predição ao uso de “tecnologia da informação como armas não letais.” Isso tinha em mente “uma campanha para desmantelar a infraestrutura de uma nação para os fazer pensar que não têm a capacidade de criar um conflito planejado.” Não, o exército não estava pensando em algum tipo de proto-Stuxnet. Ele tinha em mente mandar torrentes de tráfego para “inundar” servidores estrangeiros até “um pânico na população civil”, agora sem acesso à internet, “persuadindo os militares adversários a não executar um plano de ataque”. Preste atenção, Darpa e o U.S. Cyber Command. Alternativamente, os militares poderiam acabar com as capacidades do inimigo de controlar suas forças através de uma inundação de informações erradas na internet – “tanto através da distribuição de desinformação ou ilegalmente alterando páginas na internet para espalhar a desinformação.” Não é claro se o relatório diz se é destinado a restringir essa atividade “ilegal” a páginas estrangeiras.

E só então vem a febre. O relatório especula que explosões de ondas de frequência de radio podem “imitar uma febre” ao ponto de incapacitar os inimigos. (“Nenhum órgão é danificado”, garante o documento.) “Temperaturas no núcleo de aproximadamente 41 graus Celsius são consideradas adequadas” – o que é assustadoramente próximo a indução de um coma ou a danos cerebrais.

A ideia envolveria um “gerador de microondas altamente sofisticado” que poderia induzir um “aquecimento uniforme e cuidadosamente monitorado” de “15 a 30 minutos”, dependendo do peso da pessoa e os tamanhos das ondas empregadas. “A sensação subjetiva causada por esse aumento de temperatura é bem mais desagradável que aqueles que acompanham a febre,” o relatório garante. Ainda assim os militares teriam de ser cuidadosos para não causar nenhum dano permanente aos órgãos com armas assim – o que precisaria de monitoramento cauteloso, já que o documento nota que aumentar um único dígito na temperatura acima de 42 graus Celsius seria provavelmente fatal.

Como foi descoberto, os militares poderiam desenvolver armas de microondas – o Active Denial System. Trata-se de uma arma de microondas que, como aprendi em primeira mão em uma fatídica tarde, faz as vítimas sentirem que foram colocadas em uma fornalha. Mas as frequências são tão baixas que não conseguem penetrar a pele, nem mesmo um pacote de pipoca. (Isso foi testado.) Mesmo assim, a ideia de ser aquecido com algo por 15 minutos até meia hora é insuportável: eu durei talvez dois segundos antes dos meus reflexos me forçarem a sair do caminho do raio. E em 2010, o aparelho foi retirado do Afeganistão quando comandantes disseram que ele era um pesadelo de relações públicas. Ele tinha uma das grandes desvantagens dessas armas que o relatório de 1998 do exército não considerou. Claro, algumas coisas envelhecem pior do que previsões para o futuro.

Este post foi publicado originalmente no Danger Room, da Wired. Wired.com tem expandido a mente humana com notícias de tecnologia, ciência e cultura geek desde 1995.

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