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Por que sempre queremos apertar o botão vermelho

Qual é a origem do Botão Vermelho? E por que nossa curiosidade doentia sempre nos impele a apertá-lo?

“Não importa o que aconteça, não aperte esse botão.” Esse clichê habita a cultura pop há décadas — e o mundo real também. Mas qual é a origem do Botão Vermelho? E por que nossa curiosidade doentia sempre nos impele a apertá-lo?

O botão da Guerra Fria

Durante a Guerra Fria, o botão vermelho era uma metáfora: caso apertado, os mísseis começariam a cruzar o planeta. É claro que isso nunca existiu. Na realidade, botões vermelhos são normalmente usados para interromper uma situação perigosa, não para dar início a uma. É difícil definir a origem exata dessa ideia, mas os botões vermelhos surgiram junto a tecnologias consideradas perigosas o suficiente para ter uma função de EMERGÊNCIA que pudesse ser ativada de forma rápida e simples.

Esses botões são também conhecidos como “kill switches” – mecanismos de segurança que desligam um equipamento à força durante uma emergência. Em alguns casos, o botão é o último recurso, a única forma de sair de uma crise potencialmente catastrófica.


Um console de operação de um IBM System/360 Model 64 com um Botão Vermelho na parte superior, à direita. Crédito: Wikipedia

Mais uma vez, a data exata do surgimento do Botão Vermelho na vida real é desconhecida. Mas sabemos qual é um dos primeiros exemplos documentados: o computador System/360 Model 65, lançado pela IBM em novembro de 1965. Ele era conhecido por seu “botão de emergência” localizado no topo do console. Ele era grande, assustadoramente vermelho e ficava separado de todos os outros controles e alavancas. De acordo com o manual do computador, aquele botão cortava a energia de todas as unidades do sistema.

O botão vermelho também aparece na forma de freios de emergência em transportes públicos ou carros, e dispara o alarme de perigo — e sua cor vermelha remete aos carros de bombeiros. Muitas vezes o botão serve como um alarme de incêndio, que normalmente fica atrás de vidro para evitar apertões de curiosos.

Algumas usinas nucleares têm algo chamado “botão scram“. Sua função é tentar impedir que um desastre nuclear aconteça: quando apertado, ele solta bastões de resfriamento dentro do reator de forma a interromper a reação nuclear.


Um “botão scram” na Usina Nuclear Crystal River, localizada na Flórida. Crédito: AP

Em 2009, a ex-secretária de Estado Hillary Clinton presentou o ex-ministro de Relações Externas da Rússia, Sergey Lavrov, com um grande “Botão de Reiniciar” para comemorar uma nova fase da relação entre os EUA e a Rússia. Os russos não entenderam a piada, e o clima ficou um pouco pesado. Mas naquele momento os perigosos botões vermelhos já faziam parte da cultura pop americana.

“Não toca nisso, seu idiota!”

O clichê do botão vermelho está lado a lado da casca de banana escorregadia e da bigorna que cai do céu. Muitas vezes um personagem aconselha outro a nunca, sob nenhuma circunstância, apertar o botão. Mas o que acontece logo em seguida? O personagem desobediente e curioso o aperta mesmo assim, é claro, e na maioria das vezes algo explode.

O botão vermelho é um aparato narrativo presente em todos os gêneros, testando nossos impulsos e causando eventos comicamente catastróficos há décadas. O site TVTropes.com divide os botões entre diferentes clichês como  “O Que Esse Botão Faz?“, “Botão que Desencadeia a Trama“, e “Não Toca Nisso, Seu Idiota!”.

Os botões são figura recorrente nos filmes do James Bond, onde eles ejetam assentos de carros ou explodem reatores nucleares. Uma das piadas recorrentes de O Laboratório de Dexter envolve Dee Dee, a irmão mais velha e hiperativa do personagem principal, apertando um botão vermelho apesar dos avisos de seu irmão, o que sempre traz consequências desastrosas.

Em Homens de Preto, há um “botãozinho vermelho” no carro dos agentes, e que K aconselha J a apertar apenas em caso de emergência. Quando ele é finalmente pressionado, o carro se transforma em um veículo supersônico que sobe em paredes e é movido por propulsores. Em S.O.S. – Tem um louco solto no espaço, Dark Helmet é jogado em cima de um Botão Vermelho, o que dá início ao processo de autodestruição da nave.

É difícil definir a origem desse aparato narrativo, mas um exemplo particularmente antigo é um conto publicado na Playboy em 1970, intitulado “Button, Button” e escrito pelo lendário escritor de ficção científica Richard Matheson (autor de Eu Sou a Lenda e O Incrível Homem que Encolheu). No conto, um casal recebe uma caixa com um botão. Toda vez que ele é apertado, o casal recebe US$ 50.000. No entanto, toda vez que isso acontece, algum desconhecido morre. (Isaac Asimov também escreveu um conto chamado “Button, Button” em 1953, mas as histórias são completamente diferentes.) O conto inspirou um episódio de Além da Imaginação lançado nos anos 80, assim como o filme A Caixa, um suspense bobo lançado em 2009.

A questão é: será que eles devem apertar o botão? Se sim, quantas vezes? O conto é uma das primeiras obras a usar a imagem do botão como metáfora do lado sombrio dos personagens, ou, pelo menos, de uma curiosidade que acaba se revelando violenta.


GIF via YouTube: “Para que serve este botão?”

A psicologia por trás do ato de apertar um botão

Quando há um botão vermelho na nossa frente, ficamos tentados a apertá-lo — especialmente se formos aconselhados a não fazer isso.

“Nós apertamos todo e qualquer botão na esperança de que ele liberará uma descarga de dopamina em nosso organismo”, diz Larry Rosen, psicólogo e professor da Universidade do Estado da Califórnia que já escreveu vários livros sobre psicologia e tecnologia. “Ou pelo menos, que ele reduzirá o cortisol que nos deixa ansiosos — e essa expectativa se mantêm até que finalmente apertamos o botão e descobrimos o que ele faz”.

Em geral, quanto mais somos aconselhados a não fazer algo, maior é nossa vontade de fazer exatamente o que não devíamos. Na cultura pop, essa ideia vai além do Botão Vermelho, passando por clichês como “O fruto proibido“, “A Curiosidade Matou os Personagens” e “Não Faça Essa Coisa Super Legal“.

Na psicologia, isso pode ser explicado pela teoria da reatância, que afirma que quando nossa liberdade de escolha é ameaçada, somos tomados pelo desejo de protegê-la, o que nos dá ainda mais vontade de fazer a tal coisa proibida. A teoria foi aplicada em estudos sobre a idade relativamente alta em que beber álcool é permitido nos EUA (21 anos), algo que incentiva o consumo ilegal de bebidas entre universitários.

Na maioria das vezes, os botões indicam poder. Ao apertá-lo, algo sempre acontece. No mundo real, esse “algo” raramente é negativo. Muitas vezes, o botão chama algo ou alguém. É o caso do botão de serviço de um avião, ou de uma campainha. Nós sentimos o impulso de apertá-los porque achamos que eles podem nos ajudar a conseguir algo. E quando somos aconselhados a não apertar um botão, não é de se espantar que muitas pessoas não consigam controlar seus impulsos. Isso faz parte da natureza humana.

Em abril, o Reddit lançou uma pegadinha de Primeiro de Abril-barra-experimento social chamado “O Botão“. A brincadeira envolvia um timer que contava de 60 a zero. No entanto, se alguma pessoa no lado oposto da internet apertasse o botão, o cronômetro voltava ao início. A brincadeira era um estudo de caso sobre recompensa adiada, já que os usuários tinham que deixar a contagem regressiva terminar para ganhar o jogo. Mas alguém sempre apertava o botão, o que estragava tudo. Em junho, a contagem regressiva finalmente chegou ao zero, depois de meses e milhões de cliques.

A ideia do botão vermelho já foi utilizada de formas mais lúdicas: existem vários “jogos” que tentam te convencer a apertar (ou não apertar) o botão vermelho. Um deles é um aplicativo para Android que já foi avaliado mais de 5.500 vezes.

Mas no cenário atual, os grandes botões vermelhos, as alavancas mortais e as máquinas apocalípticas foram substituídas por um tipo diferente — agora os botões que controlam o mundo são digitais. E, pelo menos no Facebook, esse botão ainda é vermelho: é a notificação que informa que alguém falou com você, ou que alguém curtiu sua foto, ou que alguém te ofereceu alguma forma de afirmação social que você tem que checar logo, é rapidinho!

“Nós reagimos visceralmente ao ‘botão’ que mostra que recebemos uma mensagem ou notificação; é uma reação pavloviana”, diz Larry Rosen. Quer seja um botão físico ou digital, se ele estiver na nossa frente, nós sentiremos o impulso de apertá-lo — porque ao fazer isso, sentimos algum tipo de satisfação. Ou pelo menos é o que a gente pensa.

Ilustração de Jim Cooke

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