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Por que tanta gente quer substituir teclado e mouse

Interfaces por gestos, toques, voz e muito mais. Estão tentando acabar com o teclado e mouse - mas talvez essa não seja uma ideia muito boa.

Nas últimas décadas, tudo mudou nos nossos computadores. As telas. Os componentes internos. O tamanho, peso, materiais. O software em si, é claro. Mas uma coisa permaneceu do mesmo jeito desde os primórdios: as ferramentas que usamos para controlá-los. Então é até um pouco estranho que nos esforcemos para acabar com elas.

No começo, duas formas competiam para definir como falaríamos com computadores. De um lado, as linhas de comando e a interface gráfica de usuário. Do outro, o sistema que nos dava uma tela que parecia uma área de trabalho e arquivos que pareciam pequenas pastas, que poderiam ser navegadas pelo uso de teclado e mouse. A segunda opção venceu e desde então reina como principal forma de nos comunicarmos com um PC.

Mas ao longo dos últimos cinco anos as coisas mudaram. Chegaram as telas sensíveis ao toque e as formas de interação gestual como o Leap Motion. E ontem a HP apresentou o Sprout, um computador que consiste em monitor touchscreen, uma câmera RealSense 3D, um projetor e um pequeno tapete sensível ao toque para dar muitas opções de interação. E todos eles têm o mesmo objetivo: acabar com o teclado ou mouse.

Deixe nosso mouse em paz

O Sprout é um sistema interessante e estranho que custa US$ 1.900. Ele está sendo promovido como a ferramenta de criatividade ideal para quem não quer usar teclado e mouse: a câmera superior consegue capturar imagens de objetos colocados no tapete, por exemplo, e esse tapete com sensibilidade ao toque em 20 pontos diferentes permite manipular esses objetos entre o próprio tapete e a tela.

Mas tem muitas coisas que ele não consegue fazer. Você não conseguirá escanear coisas em 3D, apesar da câmera RealSense, até algum momento de 2015. Não há suporte para produtos da Adobe. E mesmo que seja vendido como um computador sem teclado, um teclado projetado no tapete ainda é uma parte fundamental da interface.

O Sprout é um conjunto interessante de sistemas que juntos sugerem para onde a computação está caminhando, mas não é um produto finalizado da futura geração de dispositivos. Em outras palavras, uma experimentação de novas formas de interação, não muito diferente de Leap Motion, Meta e tantas outras interfaces baseadas em gestos, toques ou voz.

Não há como negar que o toque é maravilhoso para usos específicos, como telas móveis que sempre estão perto do nosso corpo. E interação gestual é igualmente sensacional, especialmente para ações orgânicas como realidade virtual, exploração de modelos 3D ou até mesmo um cirurgião que não pode tocar em uma tela real durante uma operação. As possibilidades de uso são infinitas.

Mas essas formas de interação não são apropriadas para muitos outros cenários. Elas ainda são imprecisas. Ainda exigem mais esforço para tarefas específicas do que teclado e mouse. Em alguns casos, elas nos dão muita flexibilidade e controle sobre algo que deveria ser simples, e teclado e mouse funcionam melhor. Em outros, não nos dão controle o bastante. Não são, definitivamente, substitutos para todas as interfaces que usamos hoje.

Valeu, Hollywood

Então de onde surgiu todo esse ódio ao teclado e mouse? Talvez tenha a ver com a forma como imaginamos no futuro – e a forma como ele é apresentado em filmes e programas de TV.

Pense em Minority Report – A Nova Lei e Guardiões da Galáxia. Ou pense em Homem de Ferro, onde Tony Stark navega usando apenas as mãos. Fomos seduzidos pela ideia de ambientes imersivos e que não exigem esforço que vemos nesses filmes. Até Elon Musk gosta dessa ideia. E, como resultado, os filmes que assistimos influenciam a forma como pensamos que a tecnologia deveria ser.

Mas nem todos os designers de efeitos especiais são especialistas em interação humana. Jakob Nielsen – que é especialista – explica os valores de manter o bom e velho mouse por perto em um post que mostra o que cada sistema pode fazer. “Não há um único vencedor”, ele escreve. “Mouses e dedos têm seu lado bom.” E é por isso que devemos projetar os dois sistemas para funcionarem juntos, não escolher entre um e outro.

“O fato da entrada de mouse e toque serem diferentes é uma das muitas razões para projetar interfaces de usuários diferentes para sites em desktop e mobile”, completa Nielsen.

O que imaginamos ser o melhor nem sempre é o melhor

Acontece que seres humanos não são muito bons em prever quais ações serão mais rápidas – temos dificuldade em dizer a diferença entre uma interface que parece ser mais rápida e aquela que de fato é mais rápida.

Em 1989, o especialista em interação humanos/computadores Bruce Tognazzini relatou que usuários tinham dificuldade ao discernir qual forma de interação era de fato a mais rápida. Mesmo que os usuários pensassem que digitar comandos no teclado era mais rápido do que usar o mouse, o oposto se mostrou ser verdade – pensar em um comando de teclado exige o que ele chama de “alto nível de funcionamento cognitivo”, e isso não é necessário no mouse. “Os usuários atingiram um aumento significativo de produtividade com o mouse apesar da própria experiência subjetiva”, disse Tognazzini.

Então o que pensamos que pode ser um método mais moderno e rápido de interação nem sempre se compara com o que realmente é mais rápido. Em certa medida, isso explica por que estamos tão ansiosos para entrar definitivamente na era do toque e dos gestos, mesmo que nossos dedos sejam menos precisos que mouses. No fim das contas, faz muito mais sentido pensar em um futuro com múltiplas formas de interação – não um em que uma única forma de entrada substitui todas as outras. Computadores que incorporam o Leap Motion provavelmente fazem mais sentido do que algo totalmente sensível ao toque ou a gestos como o Sprout.

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