Como o reator arc do Homem de Ferro (provavelmente) funciona
Como o reator arc do Homem de Ferro é um dispositivo ficcional e, até onde sei, não tem uma explicação científica oficial no cânone do super-herói, podemos chegar a uma tentativa de entendimento. A partir de agora misturarei ciência real com ciência de mentirinha. Então, geeks da física e geeks dos quadrinhos, ignorem eventuais viajadas – tanto de um lado, quanto de outro.
É quase certo que o reator arc de Stark seja uma célula multi-isótopo de rádio-decadência
Vamos dar uma olhada no que sabemos do reator arc com base nos dois primeiros filmes.
O reator arc em tamanho real se parece muito com um sistema de contenção de plasma em formato de toro, como um reator Tokomak para “fusão quente” padrão:
O equivalente no mundo real dele é o reator de fusão ITER:
Esse tipo de reator de fusão existe hoje, mas ainda em nível de pesquisa. O reator da imagem, o ITER, está sendo construído e pretende ser o primeiro reator de fusão grande o bastante para gerar um saldo positivo em energia. Basicamente, ele esmaga dois isótopos de hidrogênio, deutério e trítio juntos a energias tão altas que eles se combinam em um átomo. Quando entram em fusão, a reação produz hélio e um nêutron livre. Criticamente, hélio + nêutron têm menos massa que deutério + trítio, e a massa ausente é convertida em energia. Essa energia pode ser capturada como calor para fazer funcionar uma turbina comum movida a vapor (como em qualquer outra usina de energia).
O que o formato em toro (como uma rosquinha) nos diz? Significa que existem partículas carregadas movendo-se em um círculo, contidas por um campo magnético. Partículas altamente energizadas geralmente têm muita energia porque elas estão se movendo muito rápido e os campos magnéticos conseguem curvar o movimento das partículas carregadas. Curvar o movimento das partículas em um círculo as mantém em um local tempo suficiente para fazer com que elas colidam.
Você talvez note que os designs atuais de fusão nuclear têm um monte de bobinas magnéticas na parte externa do toro, onde o reator arc das Indústrias Stark tem uma janela de visualização. A contenção do plasma é o maior desafio para a fusão quente, mas o reator arc o faz parecer simples. Disso podemos concluir que a tecnologia-chave para um reator arc de grande escala é o fato de ele dar um jeito de conter a reação em um anel autossustentável. Essa linha de raciocínio é definitivamente embasada pelas linhas de campo toroidais desenhadas no projeto do reator arc das Indústrias Stark:
Vemos também uma notável ausência de laços de resfriamento, turbinas ou qualquer outra coisa de que um reator térmico tradicional necessitaria. O que significa que o reator arc produz eletricidade diretamente em vez de gerar calor primeiro. Essa observação casa com o fato de que o reator com escala em megawatt no peito de Tony não frita ele vivo. Então não pode ser um reator de fusão quente, ou um reator de fissão térmica tradicional. De volta à prancheta!
O que mais sabemos sobre o reator arc em miniatura?
- Contém um núcleo de paládio.
- O paládio é danificado por nêutrons, então o isótopo específico é importante.
- Tem bobinas eletromagnéticas em um toro.
- Emite uma luz azul clara.
- Pode ser construído em uma caverna com ferramentas de complexidade moderada.
- Não exige materiais exóticos fora o que você pode conseguir desmontando sistemas de armas convencionais.
- A energia acaba em momentos inconvenientes, o que significa que ele deve ter algum tipo de combustível ou carga consumível.
O paládio tem sido proposto como um substrato para fusão “fria” que não exige plasma quente e toros de contenção, mas esse conceito é largamente desacreditado no mundo real. O paládio, porém, tem algumas propriedades de captura e declínio bem interessantes. Veja na Wikipedia: Isótopos de paládio (em inglês).
O isótopo Pd-103 de paládio produz Rh-103 (ródio) via captura de elétrons. Isso quer dizer que um elétron interno é absorvido pelo núcleo, juntando-se com um próton para produzir um nêutron e um fóton energizado – um raio gama.
Outro isótopo, Pd-107, produz Ag-107 (prata) via declínio beta, liberando um elétron quando um nêutron vira um próton. (É meio que a reação oposta à citada acima.) Agora, na física do mundo real, os elétrons equilibram os núcleos atômicos resultantes – prata e ródio têm números diferentes de prótons em relação ao paládio e os elétrons produzidos/consumidos apenas equilibram a contagem de prótons, portanto não há um fluxo positivo de eletricidade.
Proponho que Howard Stark encontrou uma forma (usando a física das histórias em quadrinhos) de usar o declínio beta dos íons Pd-107 como uma fonte de elétrons para a captura de elétrons Pd-103, gerando assim um circuito elétrico entre dois diferentes isótopos radioativos.
O Pd-103 é muito radioativo (meia-vida de 17 dias) comparado ao Pd-107 (meia-vida de 6,5 milhões de anos), então deveria haver muito mais do isótopo mais pesado para compensar a disparidade nas taxas de declínio.
O núcleo de paládio do dispositivo muito provavelmente seria Pd-107, que emite elétrons de alta energia na medida em que declina em prata. Este é um isótopo bastante estável que esperaríamos estar presente em paládio normal (não separado) que Tony pudesse extrair de uma arma convencional.
Como sabemos que o dispositivo usa partículas carregadas viajando dentro de um anel de eletroímãs, presumo que uma pequena quantidade de Pd-103 é ionizada por um arco elétrico (daí o nome do reator, “arc”, e a exigência de energia para iniciar), que então permite ao Pd-103+ circular em alta velocidade dentro de outro anel do dispositivo. A ionização serve para atrasar a etapa de captura do elétron até que o átomo encontre um elétron livre e a alta energia cinética, devido à velocidade, aumenta as chances do elétron ser capturado, o que ocorre uma vez que o elétron é encontrado. O declínio radioativo do Pd-103 pode ser iniciado, interrompido e preso pelo dispositivo simplesmente controlando a ionização e a circulação do Pd-103.
A geometria e os campos eletromagnéticos do dispositivo direcionam os elétrons altamente energizados do núcleo o Pd-107 em direção ao anel externo. Existem elétrons que são capturados por íons altamente energizados Pd-103. O processo de captura desse elétron emite raios gama, que são desviados para dentro para catalisar o declínio beta do núcleo Pd-107. Temos boas evidências dessa emissão de raios gama porque a arma de raio unidirecional no peito da armadura é claramente a emissão de um grande número de fótons altamente energizados diretamente do reator arc. Normalmente, raios gama são direcionados para dentro a fim de catalisar a operação do dispositivo, mas eles podem ser direcionados para fora em uma arma de energia concentrada:
Então, para resumir: elétrons são projetados para fora do núcleo interno e os raios gama, para dentro a partir do anel externo. Por essa contracorrente elétron/fóton criar um déficit de elétrons (relativo aos prótons) no núcleo, um potencial eletrostático massivo é desenvolvido e o núcleo de paládio atrai elétrons pouco energizados da fiação da armadura. A ejeção de elétrons do núcleo em direção ao aro do dispositivo produz uma célula elétrica capaz de gerar corrente e voltagem enormes.
Aqui está a proposta do processo completo de ignição do reator:
- Usando energia externa, o Pd-103 é ionizado por um arco elétrico e acelerado a alta velocidade no anel externo. Pode haver também alguma produção de raios gama (com energia externa) para iniciar o núcleo interno.
- O Pd-107 do núcleo interno é iniciado para emitir elétrons altamente energizados na medida em que declinam para Ag-107. Os elétrons escapam do núcleo e são direcionados por campos magnéticos em direção ao anel externo. A falta de elétrons cria um saldo de carga positiva no núcleo, que reduz a emissão (prevenindo uma fuga do declínio) até que os elétrons possam ser reabastecidos externamente.
- No anel externo, os elétrons livres altamente energizados colidem com íons altamente energizados Pd-103+. Isso causa a captura instantânea do elétrons e a emissão de raio gama. Os raios gama são defletidos para dentro em direção ao núcleo, catalisando ainda mais a emissão de elétrons e produzindo uma reação autossuficiente. Note que a reação é autossustentável, porém muito lenta enquanto o reator está ocioso.
- O fluxo de elétrons do núcleo interno para o externo cria uma diferença no potencial elétrico. Quando um circuito é criado através das cargas elétricas da armadura, o anel externo tem um excesso de elétrons e o núcleo interno uma carência de elétrons. Isso cria corrente.
- A corrente elétrica através de uma carga externa alivia os acúmulos de carga eletrostática que inicialmente retarda as reações. Então quanto menos energia a armadura suga, mais lentamente a reação produz declínios radioativos; e quanto mais energia a armadura usa, mais rapidamente as reações são catalisadas. Dessa forma, a saída de energia se regula automaticamente de acordo com a demanda.
- O paládio lentamente converte para Rh-103 e Ag-107 e a reação fica sem energia quando o paládio é totalmente consumido.
O conceito de reator arc miniaturizado
Não posso falar do “novo elemento” do reator arc da próxima geração, mas presumivelmente ele substitui os isótopos de paládio com um hipotético elemento que também é submetido a um declínio beta mediado por raios gama, mas menos tóxico e com uma saída maior.
Diversas outras linhas de evidências também apoiam esse tipo de reação de fluxo de elétrons/declínio como sendo o mecanismo do reator art. Primeiro, o brilho do reator:
Ele poderia ser gerado pela ionização do arc, mas acho que a radiação Cherenkov é uma explicação muito melhor. Trata-se de um tipo especial de emissão de luz que ocorre quando uma partícula energética (como um elétron) entra em um meio (como a água ou o ar) a uma velocidade maior que a da luz naquele meio. O fluído de elétron altamente energizado dentro do reator arc seria um espaço natural para gerar esse efeito. Esta é a foto de um reator nuclear de verdade produzindo radiação Cherenkov:
Reparou na semelhança? Diferente de arcos elétricos, a luz da radiação Cherenkov é silenciosa, azul e fantástica. Não há muito o que discutir: o brilho do reator arc é definitivamente produzido por um fluxo de elétrons altamente energizados.
Outro aspecto do modelo original do reator arc de paládio era o envenenamento devido à “toxicidade do paládio”. É bem possível que o paládio esteja sendo simplesmente ejetado do dispositivo para o sangue de Tony por todas as colisões altamente energizadas que acontecem, mas isso não explica as medonhas linhas de circuito em seu peito, nem por que os médicos não podem ajudá-lo.
Tenho uma teoria que se encaixa melhor nesses sintomas. Lembre-se, as reações de declínio do paládio propostas produzem ródio e prata. O excesso de prata internamente é conhecido como pele azul:
Compostos de ródio também mancham a pele e são altamente tóxicos. (Propriedades químicas e efeitos ambientas e à saúde.) Na realidade, pelo fato de que a maioria das pessoas tem essencialmente zero exposição ao ródio, a toxicidade do ródio é pouco compreendida. Isso explica perfeitamente por que Tony não procura ajuda da medicina para o seu acúmulo de metais pesados e tóxicos – porque ele sabia que os médicos não saberiam como lidar com o envenenamento por ródio. Tony Stark não estava envenenado por paládio apenas, ele estava envenenado pelo “produto do declínio do paládio”!
Tudo se encaixa perfeitamente. As evidências todas indicam que o reator arc confia em células do declínio radioisotópico de Pd-103/Pd-107 para produzir a corrente elétrica. Começarei a montar meu próprio protótipo de reator arc e atualizarei vocês quando conseguir uma réplica funcional.
Qual o conceito/teoria por trás do “reator arc em miniatura” construído por Tony Stark? Foi publicamente originalmente no Quora. Siga o Quora no Twitter, Facebook e Google+.
Esta resposta foi levemente editada para correções gramaticais e maior clareza.