Há quase um ano analisamos o primeiro tablet com Android, o que deveria ser o primeiro grande concorrente do iPad. Com o Android 3.0 “Honeycomb” puro, hardware que em números absolutos superava tudo o que havia na época (leia-se iPad) e a promessa de gerar competição no segmento de tablets, o Xoom original meio que falhou nos seus objetivos. E feio. Agora em versão renovada e com um “2” à frente do nome, será que as mudanças feitas pela Motorola melhoraram tanto o tablet a ponto de torná-lo a referência que seu antecessor não foi?
Hardware
Para evitar dor de cabeça judicial com a Apple e aproveitando o formato bacana do RAZR, temos aqui um form factor que, se não é original, é pelo menos diferente. Os cantos do Xoom 2 são levemente “achatados”, detalhe que não interfere no uso mas ajuda a compôr um visual único em meio à uniformidade dos tablets. E já que tocamos no assunto, em relação ao iPad o Xoom 2 é mais leve (599g) e tem a mesma espessura do iPad 2 (8,8mm).
A borda do tablet é emborrachada e, nas laterais, se estende para a traseira melhorando a pegada do tablet que, a exemplo de todo Android, foi concebido para ser usado primariamente em modo paisagem.
O posicionamento de botões foi levemente modificado para melhor nessa revisão do Xoom — tudo agora parece mais com o Galaxy Tab, da Samsung. A câmera traseira foi centralizada e o botão de travar a tela reposicionado próximo aos de volume. Seriam mudanças perfeitas não fosse a dificuldade de apertar esses três botões — duros, quase indistinguíveis entre si e com baixo relevo, apertar o certo de primeira é um desafio irritante de alguns dias até pegar o jeito e, mesmo depois disso, continua sendo uma operação desagradável.
As portas são três: uma saída de som de 3,5mm no topo e conexões microUSB e mini-HDMI na parte inferior. Ao lado dessas duas, ficam, guardados por uma tampa facilmente removível e segura o bastante (nada do tipo “não olha feio que eu quebro”), slots para cartão microSD e, se for o caso, cartão SIM (3G). Atrás, fica a atualizada câmera de 5 MP com flash de LED e, mais acima, as potentes saídas de som.
Uma das coisas mais criticadas no primeiro Xoom, a tela teve uma bela melhora. No review do ano passado, o Leo comentou que “em situações cotidianas, como no browser, a tela não é exatamente empolgante — não espere muito brilho, contraste ou ângulo de visão no nível do principal concorrente ou dos vindouros tablets coreanos.” No Xoom 2, a tela está a par com as de outros tablets topo de linha e o novo painel IPS garante ângulos muito bons de visualização (diz a Motorola que chega a 178º e eu não duvido). Infelizmente nota-se, especialmente ao lado de outros gadgets, um leve tom que pende para o amarelado. É tão sutil que só percebi ao colocá-lo lado a lado do iPad, mas é o tipo de coisa que depois de vista, não sai da cabeça…
No geral os ganhos em termos de hardware são interessantes e fazem diferença no dia a dia, embora não haja nada que se sobressaia em relação a outros equipamentos do tipo.
Câmera
É sempre estranho falar em câmeras de tablets porque, hey, tirar fotos com tablets é uma coisa estranha. Apesar dessa opinião quase unânime, as fabricantes têm investido em melhorias e com o Xoom 2 não foi diferente.
A traseira tem 5 MP, foco automático e um flash de LED. O app nativo não permite o uso do “tocar para focar”, o que é um tremendo desperdício dado o tamanho generoso da tela. Na hora de fazer fotos, os resultados são medianos: bons em ambientes externos com muita luz, terríveis dentro de casa ou à noite. A câmera também filma em 720p a 30 fps com resultados igualmente medianos. Alguns exemplos (clique para vê-los em tamanho natural):
A câmera frontal tem 1,3 MP e qualidade suficiente para ser bem visto pelo interlocutor — o modelo também ajuda, sabe como é.
Software
Aqui a coisa aperta — pra variar. O Xoom foi o tablet flagship do Honeycomb, o responsável por mostrar a força do Android em tablets e… bem, ficou aquela sensação de coisa inacabada, feita às pressas e cheia de bugs. Agora na versão 3.2 (nada de Ice Cream Sandwich por ora), muitas arestas foram aparadas, mas o sistema ainda está longe da responsividade e fluidez que se espera de uma NUI (natural user interface).
A Motorola pegou bem leve na personalização. Não há nada muito mirabolante, apenas alguns ícones trocados (e todos de bom gosto, diga-se) e a inclusão de apps pré-instalados, vários com foco corporativo e alguns mais casuais, como Netflix, leitor de ebooks da Saraiva, NOVA 2 HD e uma versão de 60 minutos de Need For Speed Hot Pursuit.
Na hora de embarcar no Google Play, não há muito o que fazer lá. O bom é que agora ele funciona em modo retrato (aleluia!) , mas são poucos os apps adaptados e a seleção do Google não é lá muito criteriosa, então fica difícil encontrar as raras pérolas que salvam a experiência androidiana em tablets de um completo fracasso. E não bastasse isso, há algumas coisas inexplicáveis como a incompatibilidade de alguns jogos parrudos e recentes da Gameloft, como Aphalt 6 Adrenaline e Block Breaker 3. Paguei 18 centavos neles e nem pude brincar :-/
Merecem destaque, dentre os pré-instalados, o Dijit, que permite usar o sensor infravermelho do Xoom 2 para controlar a TV e funciona muito bem, e o Motocast, que faz o tablet “conversar” com o computador (Windows e OS X). Ele exige o Java no PC para funcionar (boo!) e funciona razoavelmente bem, embora coloque fotos, música e vídeos em uma outra interface, longe dos apps nativos para essas funções, o que cria uma espécie de redundância dentro do Android. De qualquer forma, pelo Motocast também dá para baixar esse conteúdo pela rede wireless e, então, aproveitá-lo nos devidos apps.
A sensação de produto inacabado foi atenuada em mais de um ano de releases até chegarmos à versão 3.2.2 que equipa o Xoom 2, mas ela ainda persiste e continua forte. O Android, por melhor que seja no smartphone (e lá ele está num nível bem legal), em tablets ainda precisa comer muito arroz com feijão — e dividir o rango com os desenvolvedores terceiros, afinal a maior fraqueza da plataforma é a escassez de bons apps para telas grandes.
O que agradou
Há coisas bem legais e únicas neste Xoom 2 e talvez o maior destaque seja o sistema de som. Mesmo com um speaker a menos em relação ao Media Edition, o áudio “3D virtual surround”, seja lá o que for na prática, faz a diferença. Fica longe de substituir caixinhas dedicadas de boa qualidade e, se colocado em volume máximo, faz o tablet vibrar em níveis desconfortáveis, mas está bem acima do que se esperaria de um equipamento do tipo nesse ponto.
Outra coisa curiosa e bem bacana é o sensor infravermelho. Para mostrar o potencial desse item, vem pré-instalado o app Dijit que controla televisores, players de DVD e de TV a cabo. A configuração é simples, basta começar a digitar o modelo do seu equipamento e o app vai filtrando. Com tudo configurado, aparece uma espécie de controle remoto gigante na tela que, wow, funciona perfeitamente. Testamos o recurso em duas TVs, uma LED da Samsung e outra de tubo da Phillips, em ambas correu tudo bem. Não é algo revolucionário e o tamanho do tablet joga contra a ideia de usá-lo com controle remoto, mas pode ser um belo complemento à ideia de uso do Xoom 2 como “segunda tela”, conceito que vem ganhando força nos últimos meses.
O que desagradou (bastante)
Se tem uma coisa que permanece intacta em relação ao primeiro Xoom nessa revisão, é a sensação de que o Android não está pronto para tablets. Comparar este ou qualquer outro com o iPad beira o injusto.
A tela inicial parou de dar aquelas engasgadas constrangedoras, mas ela ainda guarda algumas anomalias bobinhas que, juntas, tornam a experiência um tanto frustrante. Ao voltar de algum aplicativo ou tendo alguns abertos, ícones e widgets precisam ser “redesenhados” na tela; vira e mexe o wallpaper padrão, o mosaico verde, reaparece rapidamente ao entrar e sair de apps mesmo quando outro está sendo usado; a lentidão para rotacionar a tela é irritante… São esses pequenos detalhes que se estendem por todo o sistema que prejudicam a experiência. Ainda tem a impressão de que não importa o quão poderoso seja o hardware, a responsividade dos toques não se iguala à do iPad ou mesmo à do Android em telas menores.
No quesito apps (ah, os apps…), não bastasse a oferta ser baixa, os poucos adaptados são bem ruins, mal feitos. Testei Firefox, WordPress, TweetCaster, Plume e alguns outros e nenhum chegou perto do nível de excelência relativamente comum no iOS. Uns podem dizer que é culpa dos desenvolvedores, eu vejo isso como uma falha da plataforma — se ela é incapaz de estimular os devs, tem algo errado num nível mais profundo, certo? A única coisa que funciona lindamente são alguns apps nativos do Google (Gmail, GTalk) e o navegador, ou seja, pouco para salvar o tablet.
Quando a Apple anunciou o iPad muitos o chamaram de “iPhonão” e, bom, acabou que não era bem assim. No Android a impressão de que estamos brincando com um “Androidão” é muito mais evidente, e nem digo pelos apps populares que esticam e parecem linguições ou versões WAP; todo o sistema passa essa sensação e até áreas que seriam vantagens se bem exploradas, como as telas iniciais e os widgets, são esquisitas para dizer o mínimo.
Conclusão
O Xoom 2 parece mais com o Xoom que deveria ter saído um ano atrás: erros de projeto (ou más escolhas) foram revisitados e corrigidos, as configurações agora estão a par com a do restante da categoria, o software, embora continue ruim, pelo menos não parece mais estar em estágio beta.
Apesar dos avanços, o Xoom 2 evidencia, como fazem outros tablets Android premium, o quanto a plataforma ainda é prematura, carente de atenção de quem importa (desenvolvedores) e fora de órbita no que diz respeito a preço — a Motorola pede absurdos R$ 1.899 no Xoom 2 em configuração única por aqui (3G, 32 GB). Procurando no varejo dá para achá-lo em promoções por até R$ 1.400, mas ainda assim é muito caro. Agora com o iPad 2 barateando em preparação à chegada do novo modelo, o único perfil de usuário que vejo comprando o Xoom 2 conscientemente é o fã incondicional de Android que detesta a Apple na mesma proporção. Para todos os demais o tablet da Apple é uma escolha melhor.
Ao Xoom 2 falta o Android rodar mais liso, falta uma adaptação melhor a telas grandes e, principalmente, faltam apps que explorem todo o potencial de 10,1″. Com exceção dos nativos do Google, é dificílimo encontrar algo que preste, mesmo entre os ditos (e poucos) já adaptados. Talvez seja a hora, também, de rever alguns padrões como a proporção 16:10, que é uma droga tanto em modo retrato, quanto em modo paisagem — tudo fica sempre apertado ou esticado, sem meio termo.
Se o primeiro Xoom era um exercício de fé no seu lançamento, o Xoom 2 exige ainda mais dos corajosos fiéis que insistirem nessa sequência, ainda no aguardo de algum acontecimento cataclísmico capaz de reverter o atual cenário do Android em tablets. Ele melhora bastante em pontos onde o modelo anterior era fraco, mas ainda fica muito, mas muito aquém de você-sabe-quem. Não foi dessa vez, Google e Motorola.