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Seda: o supermaterial da natureza

A maior parte da sua exposição a seda vem, provavelmente, na forma de roupas sensuais desconfortáveis ou teias de aranha de armários empoeirados. Mas no fundo a seda é um material incrível e negligenciado. Mesmo que suas raízes estejam no passado, ela também pode ser bastante útil no futuro. Você provavelmente sabe que insetos como […]

A maior parte da sua exposição a seda vem, provavelmente, na forma de roupas sensuais desconfortáveis ou teias de aranha de armários empoeirados. Mas no fundo a seda é um material incrível e negligenciado. Mesmo que suas raízes estejam no passado, ela também pode ser bastante útil no futuro.

Você provavelmente sabe que insetos como aranhas e bichos-da-seda, entre outros, produzem seda, mas você não deve saber exatamente como. Composta principalmente de uma proteína chamada fibroína e unida por uma proteína pegajosa chamada sericina, a seda é produzida sob demanda: a criatura em questão tem uma glândula que segrega as duas proteínas, inicialmente em forma líquida, que por sua vez se combinam para formar os fios finos encontrados nas teias de aranha.

Fundamentalmente, a seda continua saindo enquanto o fio é puxado de dentro do corpo. Uma aranha usa seu peso corporal para expulsar o material; ele também pode ser tirado pelas mãos humandas dos bichos-de-seda.

Independentemente do método, o resultado final é uma fibra longa e fina que pode ser transformada em teias ou casulos. Ambos têm propriedades mecânicas fantásticas. Um fio de seda de aranha tem resistência a tração de 1.3 GPa, comparável a uma liga de aço de alta qualidade. Também é extremamente maleável, o que significa que pode ser esticada a até cinco vezes seu comprimento original sem quebrar. Estas duas qualidades são combinadas para dar uma resistência altíssima, também, que é uma forma de medir quanta energia é necessária para quebrar alguma coisa. Ela é pelo menos quatro vezes mais resistente do que aço ou kevlar.

É a estrutura da seda que garante essas propriedades impressionantes: fortes ligações de hidrogênio dentro de minúsculos cristais de suas estruturas geram a força; ligações fracas na cadeia de proteínas levam à maleabilidade. O principal: é super leve, com densidade de 1.31 g/cm³, seis vezes mais leve que aço. Adicione a isso o fato de que é biodegradável, e você terá algo como um supermaterial nas suas mãos.

Limpando

Por mais impressionantes que essas propriedades sejam, elas estão associadas a fibras longas e finas que são principalmente boas para tecer uma roupa de cama questionável. Certamente há demanda por seda – minhocas são cultivadas e colhidas para seus produtos alimentarem o comércio – mas a verdade é que ela não está usando da forma que realmente deveria. Existem, no entanto, alguns pesquisadores – entre eles Fiorenzo Omenetto da Universidade de Tufts e Fritz Vollrath da Universidade de Oxford – que estão pensando em usos diferentes do comum.

Eles desenvolveram técnicas para transformar a seda dos humildes farrapos da sua gravata em algo bastante incrível. Ao lavar, tratar e remoldar a seda tirada de bichos-da-seda, cientistas conseguiram criar formas complexas com ela, e até mesmo ajustar suas propriedades de material para torná-la mais resistente, por exemplo, ou ainda mais facilmente biodegradável. Eles mantém segredo do que é usado no processo – o que é compreensível – mas o que é claro é que, assim que a seda é purificada, eles podem usar uma combinação de colas naturais e resinas para transformar esses pedaços de fibra em algo muito mais versátil. O resultado parece algo como plástico, mas mantém as propriedades insanas que a seda oferece – e isso é visível quando vemos as possibilidades de aplicações disponíveis. A maior utilidade da seda no passado pode ter sido o quimono, mas em sua nova roupagem as possibilidades parecem ilimitadas.

Forte e de apoio

A seda é claramente bem útil em situações que exigem materiais com bastante força e peso leve, claro, mas pode aparecer como surpresa na próxima geração de colete a prova de bala. Pesquisadores desenvolveram um material que usa uma folha leve de seda como base, onde células da pele geneticamente modificadas podem ser cultivadas. O resultado é um material relativamente fino e leve, completamente flexível e que consegue parar uma bala calibre .22 a uma velocidade de mais de 500km/h. É impressionante, e significa que soldados podem um dia não precisar nem usar uma armadura extra. As roupas podem ser o suficiente para protegê-los.

Mas e se a bala atravessas a seda do mesmo jeito? Já há solução. Uma equipe de pesquisadores de Oxford criou uma empresa chamada Orthox que é especializada em transformar a seda em formas usáveis de articulações substitutas. As unidades são fortes e de longa duração, o que é ótimo – elas também são biocompatíveis, o que significa que podem ajudar no crescimento de tecidos, e com o tempo se tornar uma parte viva do corpo. Elas podem até ser dopadas com drogas para tornar a transição o mais suave possível. Outra empresa, a Neurotex, usa pequenos filamentos de seda para criar pontes entre nervos danificados. Os experimentos mostram que nervos cortados crescem junto com filamentos de seda biocompatíveis como plantas ao redor de uma treliça – e elas podem até criar novas conexões funcionais que levam sinais eletrônicos para o cérebro.

Macio e grudento

Esta não é a única capacidade interessante da seda. Pesquisadores da Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, por exemplo, estão usando a seda para desenvolver uma nova geração de eletrônicos fundíveis. Projetada especificamente para se tornar um tecido vivo, os pesquisadores estão usando filmes de seda como uma base flexível para eletrônicos já que, diferentemente de silício, a seda pode ser misturada e torcida sem quebrar. O objetivo a longo prazo é desenvolver eletrônicos ultra-finos diretamente na superfície do cérebro – onde a seda seria dissolvida e quebraria pelos tecidos ao redor. Felizmente o que fica para trás é um sistema eletrônico incorporado, que poderia ser usado para monitorar e tratar condições como epilepsia.

E existem ainda mais possibilidades excitantes para serem exploradas. O fato da seda de tornar grudento com pouca eletricidade, por exemplo, cria um campo elétrico próximo apropriado, e você pode transformar as propriedades do polímero que faz a seda para poder alternar entre ser grudenta e firme. Não está claro o quão pode ser confiável, mas é uma propriedade de material nunca antes vista pedindo por uma aplicação. Ainda há esperança que, se a seda puder ser feita em larga escala em quantidades suficientes, pode ser usada em qualquer coisa que pouco peso e força sejam necessários. Isso significa tudo de painéis de carro a pneus de bicicleta.

Olhe, é uma cabra-aranha!

Mas com todas essas oportunidades abertas, você deve imaginar como essas pobres aranhas e bichos-de-seda vão fazer para surprir tamanha demanda. Felizmente para elas, pode ser que não seja necessário – graças a uma fazenda cheia de cabras, e uma modificação genética esperta de um pesquisador chamado Randy Lewis.

Quando Randy ordenha suas cabras, ele não consegue uma coisa que pode ser usada para fazer queijo. Em vez disso, ele consegue um líquido branco que contem as mesmas proteínas usadas por aranhas na criação de teias de aranha. Ele modificou as cabras especialmente para criar seda; tudo o que ele precisa fazer é tratar as proteínas – limpá-las, secá-las e adicionar alguns solventes – e ele tem uma seda quase idêntica à criada por aranhas. Chamada BioSteel, a fazenda agora é lar de 30 cabras que criam a coisa, e a esperança é que com o tempo elas consigam criar seda o suficiente para suprir a demanda (e para salvar alguns bichos-de-seda de um desconforto).

Então, parece que não teremos falta de material, nem de aplicações para ele. O futuro não é feito de seda ainda – mas em breve poderá ser.

Imagem via Eric Kilby sob licença Creative Commons

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