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Cientista brasileira descobre relação entre número de neurônios e cognição

Quando se trata do cérebro, a massa por si só e o número de neurônios não significam inteligência e cognição.

Tamanho é documento? Quando se trata do cérebro, a massa por si só não significa inteligência e cognição. Nem mesmo o número de neurônios presentes em uma espécie. O tamanho do cérebro dos animais tem sido estudado pela neurocientista brasileira Suzana Herculano-Houzel há anos: ela já descobriu a relação que isso tem com o período de sono de cada espécie e descobriu também quantos neurônios o cérebro humano realmente tem. Em seu estudo mais recente, Suzana investigou por que o cérebro do elefante é maior, tem três vezes mais neurônios que o do homem, mas não nos supera.

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Em um artigo publicado pela revista Nautilus e extraído do livro The Human Advantage: A New Understanding of How Our Brain Became Remarkable, lançado pela MIT Press, a neurocientista dá detalhes sobre sua investigação em relação ao cérebro do elefante africano e as diferenças que temos em relação a outros mamíferos e primatas. Parte do segredo está na localização de todos os neurônios. Para chegar a essa conclusão, Suzana precisou esmiuçar um hemisfério do cérebro de um elefante africano, que pesa mais de 2,5 quilos. E, para quantificar a quantidade de neurônios em cada região do cérebro, era preciso analisar tecidos de 3 a 5 gramas por vez, cortados a mão para evitar perdas de material.

Ainda foi preciso separar estruturas internas e processar todo esse material. Com tanto volume e muito trabalho a ser feito, Suzana reuniu alunos e ofereceu uma recompensa pela ajuda na análise. O estudo mostrou que os elefantes africanos possuem 257 bilhões de neurônios, três vezes mais do que nós, com 86 bilhões de neurônios. No entanto, 98% dos neurônios no cérebro do elefante estão localizados no cerebelo, na parte de trás. Segundo Suzana, todos os outros mamíferos analisados até agora também apresentaram a maior parte dos neurônios nessa mesma região, mas nunca ultrapassando uma taxa de 80% de concentração.

E daí a resposta: apenas 5,6 bilhões de neurônios dos elefantes estavam no córtex cerebral, enquanto os humanos possuem 16 bilhões nessa região – concentrados em um cérebro muito menor. “As capacidades cognitivas superiores do cérebro humano em relação ao cérebro do elefante podem simplesmente – e apenas – serem atribuídas ao número incrivelmente grande de neurônios em seu córtex cerebral”, escreve Suzana na Nautilus.

Apesar de não existirem dados sobre as capacidades cognitivas para comparar todas as espécies de mamíferos, é possível fazer algumas previsões com base nos animais já estudados. Aparentemente, o número absoluto de neurônios no córtex cerebral é a principal limitação para as habilidades cognitivas, e, se isso for verdade, Suzana prevê um ranking de espécies como este:

Imagem: Nautilus

Para Suzana, existe algo que apenas nós, humanos, fazemos e que foi decisivo para acumular tantos neurônios no córtex cerebral: nós cozinhamos. Com isso, escapamos da restrição energética que limita os outros animais ao menor número de neurônios no córtex que podem ser garantidos com uma dieta crua na natureza selvagem. Essa relação já foi estabelecida em outro estudo da neurocientista, que analisou a quantidade de sono das espécies e o tamanho dos cérebros. Com a técnica do cozimento de alimentos, os humanos conseguem ingerir mais calorias em menores períodos, sobrando mais tempo para outras atividades, como o desenvolvimento tecnológico.

Esse novo estudo é o primeiro grande trabalho de Suzana Herculano-Houzel depois de ter deixado o Brasil. A cientista havia contado em entrevista ao Gizmodo Brasil as grandes dificuldades de ser cientista por aqui, como a falta de orçamento, bolsas de estudo miseráveis e a necessidade de se estudar fora do país para complementar o ensino acadêmico. Em maio de 2016, ela anunciou que iria para os Estados Unidos e expôs profundos problemas da ciência brasileira.

[Nautilus]

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