Os planos do Uber para conter sua crise: saída de CEO e mudança cultural

Abusos sexuais, machismo, roubo de tecnologia, dívidas com motoristas e um sistema de vigilância preocupante. Esses foram alguns dos conflitos enfrentados pelo Uber nas últimas semanas, motivados principalmente por uma cultura interna tóxica cultivada pelos altos cargos da companhia multinacional. Nesta terça-feira (13), a empresa reuniu seu conselho administrativo para discutir os próximos passos e […]

Abusos sexuais, machismo, roubo de tecnologia, dívidas com motoristas e um sistema de vigilância preocupante. Esses foram alguns dos conflitos enfrentados pelo Uber nas últimas semanas, motivados principalmente por uma cultura interna tóxica cultivada pelos altos cargos da companhia multinacional.

Nesta terça-feira (13), a empresa reuniu seu conselho administrativo para discutir os próximos passos e anunciar a aprovação de diversas medidas recomendadas pelo escritório de advocacia do ex-procurador-geral dos Estados Unidos Eric Holder, que iniciou uma investigação interna um dia após Susan Fowler, ex-engenheira do Uber, publicar em fevereiro um post descrevendo o assédio sexual que sofreu dentro da empresa. A análise levou em consideração mais de 200 entrevistas com funcionários do Uber, contribuições anônimas de funcionários e também análise de cerca de três milhões de documentos. O documento pode ser consultado na íntegra aqui.

Saída de Travis Kalanick, CEO do Uber

A primeira mudança vem do cargo mais alto do Uber. Travis Kalanick, CEO e fundador da empresa, está afastado por tempo indeterminado. A companhia será liderada por um comitê até que um novo diretor de operações seja escolhido.

“A maior responsabilidade, de onde chegamos e como chegamos aqui, cai sobre os meus ombros”, escreveu Kalanick em um email disparado para toda a empresa e obtido pelo Gizmodo. “Para o Uber 2.0 ter sucesso, não há nada mais importante do que dedicar meu tempo à construção de uma equipe de liderança. Mas se vamos trabalhar no Uber 2.0, eu também preciso trabalhar no Travis 2.0 para me tornar o líder que essa empresa precisa e que vocês merecem.”

Sua saída tem como motivação o trágico acidente que matou sua mãe e deixou seu pai gravemente ferido no mês passado, mas, em seu comunicado, Travis também reconheceu que os escândalos recentes tiveram muito a ver com seu papel dentro do Uber. Ainda não existe uma previsão para o retorno do fundador do aplicativo de transporte, mas ele permanecerá disponível para consultas em decisões estratégicas.

Mudança de cultura

O grande desafio do Uber é mudar a cultura interna da empresa. Alguns dos princípios adotados pela companhia precisarão ser deixados de lado, de acordo com o relatório de Holder. São eles:

• Let Builders Build: a ideia de deixe os desenvolvedores desenvolverem
• Always be hustlin: termo para determinação ou fazer algo com energia, mas que também é uma gíria que remete a ganhar dinheiro a qualquer custo, mesmo que seja preciso faltar com a ética ou cometer atos ilícitos
• Toe stepping: interferir em assuntos que são de responsabilidade de outra pessoa
• Principle confrontation: confronto de princípios, utilizado por Kalanick para justificar os confrontos do Uber com o governo em diversas cidades do mundo

A nova liderança da empresa precisará abraçar a ideia e criar um ambiente mais positivo para todos os funcionários. Ainda de acordo com o relatório, o novo chefe de operações deve ser uma pessoa com experiência em supervisionar empresas com estruturas complexas e que tenha conhecimento em diversidade, ou seja, em liderar times compostos por profissionais de etnias e gêneros diferentes.

O conselho deve ser mais independente, e o atual chefe de diversidade, Bernard Coleman, precisa ganhar mais poder dentro do Uber. Segundo o relatório, ele deverá reportar diretamente ao presidente executivo e ao diretor de operações da empresa. O recrutamento de mais candidatos negros, hispânicos e de mais mulheres é outro tópico abordado. A ideia é que uma mulher e um representante de uma minoria sempre deverão ser contemplados no processo de seleção para uma vaga. O setor de RH também deve ser fortalecido, com a criação de relatórios e registros de reclamações e acusações de abusos dentro da empresa.

O relatório cita, inclusive, a imposição de um limite de gastos dos executivos com álcool. A sugestão é a criação de uma restrição de reembolso para as saídas, reuniões e encontros que estão relacionados ao álcool.

Machismo enraizado

Mudar essa cultura será um grande desafio na empresa. Durante a reunião que anunciava a aprovação do relatório, o membro do conselho David Bonderman reagiu quando Arianna Huffington (a única mulher do conselho) falava sobre a necessidade de incluir mais mulheres em posições de liderança. Em um áudio obtido pelo Yahoo! Finance, Bonderman a interrompe:

“Há muitos dados que mostram que, quando há uma mulher no conselho, é muito mais provável que haja uma segunda mulher no conselho”, disse Huffington.

“Na verdade, o que isso mostra é que é muito mais provável que haja mais falatório”, interrompeu Bonderman.

O detalhe é que Huffington estava comentando sobre a recente adição de Wan Lang Martello, a segunda mulher do conselho do Uber.

De acordo com o New York Times, Bonderman renunciou ao conselho. Ele publicou uma declaração em que diz: “Eu preciso me segurar e adotar os mesmos padrões que pedimos para o Uber adotar. Por isso, eu decidi me demitir do conselho de administração do Uber, a partir de amanhã de manhã”. Ele comentou ainda que o seu comentário “foi dito da maneira oposta a que ele pretendia”, mas que “entendeu o efeito destrutivo que teve”. Arianna Huffington disse que valoriza “David fazer a coisa certa para o Uber em um momento crítico de mudanças culturais na empresa”.

O Uber tem um longo caminho a percorrer.

Imagem do topo: Getty

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