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USP e UFSCar criam ferramenta que promete identificar fake news via WhatsApp

A circulação de notícias falsas tem marcado o debate público há uns bons meses. Vimos o surgimento de diversas agências de checagem, a tentativa do Facebook emplacar iniciativas que diminuíssem o impacto das mentiras e um cenário em que a emoção faz parte do julgamento de alguns leitores. Em algumas partes do mundo, incluindo o […]

Logotipo do WhatsApp em um smartphone

A circulação de notícias falsas tem marcado o debate público há uns bons meses. Vimos o surgimento de diversas agências de checagem, a tentativa do Facebook emplacar iniciativas que diminuíssem o impacto das mentiras e um cenário em que a emoção faz parte do julgamento de alguns leitores.

Em algumas partes do mundo, incluindo o Brasil, um forte vetor para a distribuição de conteúdos falsos é o WhatsApp – plataforma praticamente blindada para o trabalho de checagem. Alguns pesquisadores da USP e UFSCar desenvolveram uma ferramenta voltada justamente para o aplicativo de mensagens.

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O “Detector de Fake News” das universidades paulistas pode ser acessado pelo WhatsApp ou pela web. Os criadores da ferramenta avisam que a plataforma ainda está em fase de testes e aperfeiçoamento, mas que os estudos indicam que o índice de acerto para indicar se algum conteúdo é verdadeiro ou falso é de 90% .

O projeto se baseia em inteligência artificial e resultou na publicação do artigo Contributions to the Study of Fake News in Portuguese: New Corpus and Automatic Detection Results, apresentado no final de setembro na 13ª Conferência Internacional de Processamento Computacional do Português.

Para ensinar a inteligência artificial, os pesquisadores utilizaram uma base de dados 3,6 mil textos falsos e 3,6 mil verdadeiros, publicados entre janeiro de 2016 e janeiro de 2018 – o conjunto de notícias está aberto para conferência e uso em outras pesquisas.

A partir dos textos, foi realizado um processamento e classificação gramatical de todas as palavras. Os pesquisadores então identificaram características que poderiam ser empregadas para classificá-los em falsos ou verdadeiros, incluindo o número médio de verbos, substantivos, adjetivos, advérbios e pronomes presentes nas notícias.

Segundo os pesquisadores, 36% das notícias falsas possuem erros ortográficos, enquanto apenas 3% das verdadeiras apresentavam essa característica. Esse fator, portanto, tem um alto índice de relevância para a determinação da ferramenta. No entanto, o sistema avalia, simultaneamente, diversas propriedades presentes nos textos.

“A gente sabe que, quando uma pessoa está mentindo, inconscientemente, isso afeta a produção do texto. Mudam as palavras que ela usa e as estruturas do texto. Além disso, a pessoa costuma ser mais assertiva e emotiva. Então, uma das formas de detectar textos enganosos é medir essas características”, conta o professor Thiago Pardo, do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em São Carlos, em um comunicado.

A ferramenta, porém, não é capaz de identificar quando uma notícia é tirada de contexto. O Detector de Fake News do grupo não é capaz de discernir quando um texto contém partes verdadeiras e partes falsas, por exemplo. Ela também não é efetiva na detecção de textos satíricos. Por isso, a ferramenta pode ser um dos mecanismos para checar a veracidade de um conteúdo, mas não a única – é recomendável procurar se aquele conteúdo foi compartilhado por outros veículos de imprensa, conferir a data da publicação e consultar fontes oficiais. Você pode conferir outras dicas aqui.

O grupo pretende avançar com os estudos para desenvolver ferramentas capazes de detectar imagens, vídeos e sons manipulados. O líder do projeto alerta que a tecnologia pode ajudar, mas é preciso ficar de olho. “Nenhum sistema será 100% eficiente. Cada vez que se cria algo para detectar um problema, alguém vai descobrir um jeito de burlar”, disse Pardo.

O projeto Detecção Automática de Notícias Falsas para o Português foi financiado pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) do CNPq e por outras duas agências de fomento brasileiras (CAPES e FAPESP).

Como usar no WhatsApp

Para utilizar o sistema no WhatsApp é preciso acessar este link pelo seu smartphone e autorizar o aplicativo – é exibida uma tela com um botão “Enviar”, basta apertá-lo e, em seguida, enviar a mensagem que aparecerá no seu aplicativo.

Em seguida, você receberá uma mensagem de boas vindas. Depois disso, basta copiar e colar todo o conteúdo da notícia que deseja checar. O aplicativo mostra em segundos se o conteúdo pode ser falso.

O sistema é desativado após 20 minutos de inatividade. Mas basta enviar a mensagem “fake” para ativá-lo novamente.

Como usar na web

Você pode fazer as checagens via web também, por meio deste link.

O funcionamento da ferramenta é praticamente o mesmo: basta colar a notícia no campo de texto e enviar; em poucos segundos uma mensagem diz se o texto pode ser falso ou se deve ser verdadeiro – sempre acompanhado de uma mensagem lembrando o usuário de procurar por mais fontes.

A versão web permite fazer a checagem por dois meios: detecção via palavras do texto ou classes gramaticais. Em quase todos os testes que fiz por aqui, os resultados foram os mesmos em ambos os métodos, com exceção de um texto satírico.

Funciona mesmo?

Testei a ferramenta com diversos conteúdos e tive resultados imprecisos principalmente na versão do WhatsApp. É estranho que, um mesmo texto é considerado potencialmente falso no WhatsApp, mas verdadeiro na versão web (usando os dois métodos disponíveis). Portanto, é preciso ter em mente que a ferramenta ainda está em desenvolvimento, está longe de ser perfeita, mas pode ser interessante para uma primeira checagem – independente do resultado indicado pelo Detector de Fake News, vá atrás de outras fontes e siga as dicas que apontamos acima.

Perguntamos para os desenvolvedores por que acontece essa diferenciação na classificação entre as versões web e WhatsApp. Em um primeiro momento, eles disseram que o bot do app de mensagens estava passando por instabilidades, mas que nos testes que realizaram não encontraram problemas. O doutorando Roney Lira, do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, disse que “o sistema ainda não é tão preciso quando as notícias são curtas e não são totalmente falsas ou totalmente verdadeiras ou fogem do âmbito jornalístico (notícia sobre fatos)”.

Agora nos resta esperar que a ferramenta funcione para as eleições municipais daqui a dois anos. De qualquer jeito, a guerra da informação no WhatsApp já tem um vencedor: a mentira.

Imagem do topo: AP

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