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O quanto eu valho para os anunciantes? Minha busca obsessiva para colocar um preço na minha atenção

Trezentos e dezenove. Esse é o número de anúncios, tanto na internet quanto fora, que me ofereceram ao longo de uma terça-feira de julho. Eu sei disso, pois contei cada um deles. Por que catalogar o ruído informacional que, em muitos casos, nossos cérebros literalmente foram treinados a ignorar? Escondidos à vista de todos, o […]

Trezentos e dezenove. Esse é o número de anúncios, tanto na internet quanto fora, que me ofereceram ao longo de uma terça-feira de julho. Eu sei disso, pois contei cada um deles.

Por que catalogar o ruído informacional que, em muitos casos, nossos cérebros literalmente foram treinados a ignorar? Escondidos à vista de todos, o dinheiro publicitário é a força invisível que subsidia muitos dos serviços dos quais dependemos – especialmente online, onde acompanhar amigos, ler notícias ou ouvir música é ostensivamente “grátis”. Eu queria descobrir exatamente o quanto os meus olhos valem.

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Começando

Depois de desativar os bloqueadores de anúncios nos laptops tanto do trabalho quanto de casa, fiz o melhor que pude em ter um dia normal, sem me esforçar em evitar ou me expor intencionalmente a anúncios. O ato de anotar cada instância da propaganda pode ter diminuído um pouco o meu ritmo habitual de navegação, mas fora isso foi uma terça-feira comum: trabalhei em casa por algumas horas, fui do Brooklyn a Manhattan, andei até encontrar um amigo no East Village depois do trabalho, peguei um táxi de volta e trabalhei mais em casa enquanto assistia TV. Por mais besta que seja essa rotina, ela me coloca diante de uma variedade de anúncios digitais em computadores e dispositivos móveis, além dos chamados “anúncios fora de casa”, que incluem cartazes físicos e outdoors.

Se forçar a perceber e entender cada anúncio que você encontra durante um dia inteiro é, devo dizer, uma experiência completamente inesgotável. Já fazia mais de uma década desde que eu tinha navegado na internet sem plugins como o uBlock Origin e o Canvas Defender.

Gente, como ela virou um lugar confuso e feio! Surpreendentemente, cerca de 75% dos americanos vêem a internet dessa maneira. Dadas as táticas desagradáveis ​​usadas pelos anunciantes (pop-overs, blocos de anúncios que seguem você na rolagem, reprodução automática de vídeos com som), produtos promovidos irrelevantes e um volume crescente de blocos de anúncios por página, não é de admirar que os usuários tenham aprendido a ignorar essas imposições.

Por que eu fiz isso? Captura de tela: Bryan Menegus/Gizmodo

Para tornar esse experimento possível, os únicos anúncios que eu contei foram aqueles em que uma empresa pagava por tempo ou espaço em algum lugar que já não fosse deles. Toldos de lojas, veículos de entrega, resenhas de produtos e pontos de autopromoção da HBO foram excluídos por este motivo. Eu apliquei a mesma exceção a uma mercadoria acidentalmente publicitária, como um cara usando uma camiseta da Pepsi na minha viagem de trem. Claro, essas são ferramentas poderosas para aumentar a notoriedade da marca, mas são difíceis (se não impossíveis) de atribuir valor monetário direto – não que qualquer parte dessa experiência esteja à altura do padrão científico.

Mais uma observação: a maioria das empresas de publicidade não publica suas planilhas de tarifas e não estão dispostas a compartilhar esses números com os repórteres ou com o público em geral. A não ser que dito o contrário, todas as empresas que intermediaram esses anúncios foram contatadas e se recusaram a responder.

Logando

Anúncios de computador constituíram um pouco menos da metade do meu total de anúncios diários e eu esperava que o percentual fosse muito maior. Talvez não devesse ser uma surpresa, dada a pesquisa que a Pew e outras organizações publicaram sobre a maioria dos americanos receberem suas notícias através das mídias sociais.

No meu caso, eu também estava recebendo as notícias do dia, vendo as manchetes dos alertas RSS, do Google e do IFTTT, e notificações dos aplicativos do New York Times, da Reuters, da CNN, do Washington Post e do Wall Street Journal. Clicar em um artigo era muito estritamente reservado para coisas que eu tinha uma forte inclinação para acreditar que seria relevante para as matérias que eu escrevo, e cada história me bombardeava com entre um e quatro anúncios, com base principalmente em quanto eu rolava para baixo na página.

Uma das formas mais comuns pelas quais os anúncios online são cotados – especialmente o anúncio em banner tradicional – é chamado CPM (custo por mil impressões), a quantia de dinheiro necessária para veicular esse anúncio para 1.000 pessoas. Eu levei uma lista desses anúncios, incluindo informações sobre onde eles apareceram em uma página e quais elementos eles continham, para Jillian Schulz, vice-presidente de operações de mídia da Gizmodo Media e Ryan Brown, nosso vice-presidente sênior de desenvolvimento de negócios. Os dois forneceram o que consideraram CPMs de taxa de mercado conservadores para cada um, considerando que os sites que eu visitei eram sites de notícias amplamente estabelecidos e com bom tráfego. Suas estimativas variavam de US$ 5 para anúncios de banner estáticos ao longo do “trilho” da direita – uma seção da tela que muitos usuários ignoram diretamente – até US$ 30 para anúncios em vídeo de reprodução automática.

Incluídos nesta seção estão os anúncios do Reddit, do Google e do leitor de RSS Feedly (descanse em paz Digg Reader). Para mim, navegar pelo Reddit geralmente envolve uma espiada no site através de alguns multi-Reddits que tenho para assuntos específicos, que não estão configurados para promover posts. O CPM absolutamente mínimo de publicidade no Reddit é de 50 centavos de dólar, mas a segmentação na primeira página parece estar disponível apenas por meio de campanhas gerenciadas, o que exige um gasto mínimo de US$ 50.000. Jillian e Ryan consideraram que US$1,50 era um CPM seguro para esses posts. Os anúncios somente de texto no Feedly, que são inseridos no feed, eles cotaram a US$ 0,75 por mil. Os resultados de pesquisa patrocinados do Google têm o preço mais comum por clique, abreviado como CPC. Eu não cliquei em nenhum deles, então eles provavelmente não custaram nada para seus anunciantes.

Custo estimado para anunciantes: US$ 0,824

Indo para o centro

Com pouco menos de uma hora para matar, tenho o costume de ouvir podcasts a caminho do trabalho – nesse caso, dois curtos (The Indicator da NPR e Death, Sex & Money) cada com um anúncio, e metade de um mais longo (My Brother My Brother and Me da Maximum Fun) com dois anúncios. De acordo com David Raphael, o presidente da Public Media Marketing – uma empresa que trabalha com a Maximum Fun, além de programas como This American Life e The Joe Rogan Experience – os anúncios em podcsats tendem a ser mais “pegajosos” do que muitas outras formas de publicidade, o que leva a preços relativamente mais altos como resultado. Pelo que ele disse, normalmente as taxas de mercado variam de US$ 20 a UU$ 60. Sem saber o número de ouvintes de qualquer um desses shows, eu considerei US$ 20 em todos eles.

A próxima parte da equação é o transporte público e, ao contrário dos anúncios digitais, nos quais os olhos e os cliques podem ser rastreados diretamente, os anúncios fora de casa tendem a ser um pouco mais complicados. No que diz respeito ao custo, a única pessoa a responder às minhas perguntas sobre os anúncios do metrô foi Danny Pouladian, diretor de uma corretora de anúncios chamada Blue Line Media, que me enviou o que chamou de “números muito aproximados” para várias campanhas de quatro semanas —normalmente, a compra mais curta para anúncios externos– que tinham o preço de 25% de “share of voice” (SOV), ou seja, um quarto de todas as pessoas em Manhattan. (De acordo com um estudo da Wagner Graduate School of Public Service da NYU, o número total de pessoas na cidade, incluindo passageiros, é de cerca de 4 milhões de pessoas por dia).

Partindo de seus números, o custo diário de um anúncio na lateral de um ônibus custa pouco mais de US$ 35, enquanto os anúncios no interior do metrô – dos quais muitas vezes há uma dúzia ou mais por carro – custam menos de US$ 2 cada. Dada a escala de audiência com a qual estamos operando aqui, tudo isso representa um custo muito baixo. Mesmo usando os números listados no site da Blue Line, que não mencionam especificamente uma meta de porcentagem de SOV, dividir esses custos pelo número estimado de passageiros da companhia de tráfego para a minha parada (15.269) ainda fez pouco em tirar os números de baixo de um monte de zeros.

A maioria dessas campanhas é muito mais cara do que o gasto diário mínimo de US$ 5 do Reddit. A “dominação de uma estação”, a prática terrível de uma marca ocupar quase todos os centímetros quadrados de um metrô (como a Taskrabbit fez com a Union Square neste dia em particular), é estimada pela empresa de Pouladian em cerca de “US$ 25.000 a U$ 75.000 ou mais” para um período de quatro semanas. Contando com um número médio de passageiros nos dias úteis na Union Square de 107.141 pessoas, e cada um desses passageiros vale entre um oitavo de centavo e dois centavos e meio.

Um dos anúncios mais frequentes fora de casa que eu (e provavelmente todos os outros nova-iorquinos) vejo são os outdoors iluminados em miniatura no topo dos táxis, chamados de “taxi toppers”. John Schweikert, presidente da Strong Digital Media – uma das maiores corretoras desse tipo de anúncio – teve a gentileza de fornecer um CPM aproximado de US$ 1. Pontos de ônibus também funcionam como pontos de anúncios, e já que ninguém estava disposto a comentar os custos locais, optei por usar o CPM de Los Angeles (designada “Área de Mercado # 2”, logo atrás de Nova Iorque) da tabela de preços da Clear Channel. Muitas calçadas em Nova York agora possuem terminais Link NYC para carregar seu telefone e acessar Wi-Fi. A lateral deles conta com banners digitais direcionáveis, com CPMs médios de anúncio entre US$ 8 e US$ 12, valor que a empresa me forneceu por telefone e, em seguida, tentou voltar atrás em um e-mail. Até mesmo o elevador do prédio em que o Gizmodo funciona tem uma tela que circula continuamente entre anúncios, que são fornecidos por uma empresa chamada Captivate. Eles me forneceram um CPM estimado em US$ 10,60 para os prédios do nosso bairro, uma das ofertas mais caras, mas, bem, o que mais você consegue fazer com um elevador?

Na corrida de táxi, também me deparei com um outdoor tradicional, localizado na rua Delancey, em direção à ponte de Williamsburg. Lamar, a empresa que aluga o outdoor, estima um custo de US$ 10.500 a US$ 17.500 para uma campanha de quatro semanas em tamanho e estilo na área metropolitana de Nova York. O mais recente relatório dos Volumes de Trânsito de Ponte da Cidade de Nova York afirma que 105.645 veículos passam pela Ponte Williamsburg todos os dias, e a Administração Federal de Rodovias calcula 1,7 passageiros como a média de ocupação por veículo. Alguma aritmética leve, e isso varia de US$ 0,002 a US$ 0,0036 por motorista.

A última categoria fora de casa é provavelmente a mais estranha, pois é responsável pelo anúncio e sua própria infraestrutura: Citi Bike. Cada bicicleta e estação de bicicleta são cobertos pela Citi, e o Citigroup investiu um total de US$ 11,5 milhões para apoiar o projeto de compartilhamento de bicicletas de 2013 até 2024. Ao invés de calcular por bicicleta, eu contei por estação: das 750 que existem atualmente eu passei por duas. O New York Times estima que andar um quarteirão leva aproximadamente um minuto, e olhar para a estação de bicicleta durante aquele minuto custa ao Citigroup pouco mais de dois décimos e meio de centavo. Alguém no Citigroup calcula o valor de uma bicicleta assim? Provavelmente não, particularmente porque uma pessoa que vê uma estação de bicicletas azuis indestrutíveis não impede que outra pessoa a veja também. Mas para essa pesquisa sem fim eu não poderia chegar a uma estimativa melhor, porque o pequeno volume de dados de tráfego que eu encontrei para Nova York é lamentavelmente incompleto.

Custo estimado para anunciantes: $ 0,1852388

Subtotal: US$ 1,0092388

O retângulo da tristeza

Uma parte grande do uso do meu smartphone se resume em verificar as redes sociais. E, diferentemente do cliente de desktop do Tweetdeck, o Twitter no celular está repleto de anúncios. Instagram e Tumblr ainda passam pela minha minúscula tela, com menos frequência hoje em dia, mas raramente vejo o Facebook em parte, graças, a uma experiência similarmente tola.

Um representante do Tumblr teve a gentileza de confirmar que os anúncios da rede são todos precificados com base no CPC (Custo por Clique). Mais uma vez, eu realmente não clico (ou aperto) em anúncios, então isso não vale nada. Surpreendentemente, Jillian e Ryan indicaram que esse era o caso de muitos anúncios estáticos em redes sociais – os únicos diferentes seriam tweets promovidos com vídeos que tocam automaticamente e histórias do Instagram (que também reproduzem automaticamente). Eles sugeriram um CPM de US$ 20 para qualquer coisa dessa natureza. Os anunciantes do Instagram tendem a agrupar duas ou três histórias em um único pacote de anúncios e, como eu acho que tocar na tela é mais rápido do que deslizar, todos foram incluídos no total.

A maior dor de cabeça nessa parte do projeto, que de outra forma seria bem vaga, foi a presença das “tendências promovidas” – a maneira de permitir que as marcas comprem suas próprias campanhas de hashtag. Neste dia em especial, o #christopherrobin estava nas tendências a pedido da Walt Disney Corporation (obrigado, pessoal). Os únicos dados públicos sobre o custo dessas campanhas vêm do início de 2013, quando a base de usuários do Twitter era cerca de metade do que é hoje, e a empresa ainda não havia se tornado pública. Naquela época, uma hashtag promovida custava cerca de US$ 200.000. Naquela época, o serviço havia atingido recentemente 200 milhões de usuários, o que nos rendeu um bom número redondo de US$ 0,001 cada.

Custo estimado para anunciantes: US$ 0,401

Subtotal: $ 1,4102388

Mudando para o vídeo

Sendo um millenial, é meu dever moral evitar a TV a cabo a todo custo e substituí-la por uma série de serviços de streaming de vídeo igualmente ruins. No decorrer daquela terça-feira, meu consumo de vídeo consistia no YouTube, no Twitch e na assinatura de nível mais baixo do Hulu suportada por anúncios, que eu pego emprestada de um amigo.

Para os anúncios nos dois primeiros, Jillian e Ryan de novo me forneceram um CPM de US$ 30, embora o YouTube também use sobreposições de banners pequenas e semi-opacas dentro da tela do vídeo (US$ 1,50) e banners de aba direita sugerindo o próximo vídeo (US$ 5).

O Hulu é bem reservado sobre suas taxas de anúncios, mas uma reportagem do Digiday publicada em novembro do ano passado cita CPMs “na faixa entre US$ 30 e US$ 40”. Sendo conservador, vamos dar o valor de US$ 35, e dada a agressividade com que o serviço insere anúncios uma sequência de episódios do reality show de fabricação de facas Forged in Fire, é mais do que um dólar.

Custo estimado para anunciantes: US$ 1,2825

Total: US$ 2,6927388

Conclusões

Naturalmente, havia algumas coisas que eu não poderia sequer arriscar um palpite. O custo dos banners de vinil em torno da Union Square, em Nova York, para uma série de apresentações musicais (também patrocinada pelo Citigroup) permanecem um mistério, assim como anúncios em escada rolante do metrô e ao lado dos cada vez mais escassos telefones públicos de Nova York. E eu cheguei a US$ 2,69 usando estimativas conservadoras. Mesmo se assumíssemos que o custo real esteja mais próximo do dobro disso, devido à defasagem das fontes dos preços desses anúncios, ainda não pagaria um café e um salgado.

Mais do que qualquer outra coisa, checar os números dessas várias campanhas me fez pensar sobre a poluição de informação e a enorme quantidade de espaço em nossos dias que é alugada. A introdução de limites parece bastante razoável – quem não gostaria de ver menos anúncios? – mas isso também poderia fazer a balança pender ainda mais a favor de grandes marcas com grandes orçamentos para gastar nos espaços de anúncio que se tornariam mais caros por causa de uma escassez artificial. Talvez a densidade de publicidade agressiva possa ser taxada como são o cigarro, a poluição do ar ou qualquer outra coisa com externalidades negativas. Não sou a primeira ou a última pessoa a ver a dependência da publicidade – especialmente on-line – como sendo falha, e todos devemos nos preocupar profundamente com a forma como ela incentiva o tipo de coleta de dados em massa que o Facebook e o Google fazem.

O total baixo que cheguei parecia, a princípio, ser um motivo a favor da criação de barreiras monetárias para o mundo em geral. Eu pagaria US$ 3 por dia para nunca mais ver um anúncio para o resto da minha vida? Num piscar de olhos. Mas esse total representa apenas parte da história. US$ 2,69 é o que custa para as marcas comprarem aquele espaço e fazer com que ele atinja um ser humano vivo, não o valor da publicidade para essas marcas –e para chegar a esse número seriam necessários os dados proprietários de cada campanha, e seus objetivos. Eu imagino que o valor seja consideravelmente maior. E de qualquer forma, colocar barreiras monetárias em todos os principais sites seria a) um pesadelo para o consumidor e b) uma abordagem necessariamente classista que provavelmente prejudicaria quem tem menos acesso a bibliotecas, boa educação pública e outras fontes tradicionais de informação. A publicidade não é a minha área de especialização, nem a economia, e por enquanto não posso propor um caminho melhor adiante.

Enquanto experiência pequena e pseudocientífica, eu comecei essa pesquisa achando que meus olhos e ouvidos custaria mais. Isso me deixa um pouco mal-humorado, e dado o fato que eu escrevo para um site para ganhar a vida, sou um pouco culpado do meu salário ser, ao menos em parte, dependente de um modelo que cria inconveniência e irritação no frequentador de um site quando ele está apenas tentando descobrir o que diabos está acontecendo no mundo. E se você está buscando avaliar seu próprio valor no mundo, não recomendo a publicidade como um caminho para encontrá-lo.

Ilustração do topo por Sam Woolley/Gizmodo

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