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Cientistas querem estabelecer uma nova definição para vidros

“Vidro é um sólido amorfo que flui como um líquido”, é o que você diria caso alguém te pedisse definir o material. Mas isso é verdade? E se eu te dissesse, por exemplo, que o mito que diz que vidros antigos são mais grossos na base porque o material “vazou” um pouco, fosse falsa? Vidro […]

“Vidro é um sólido amorfo que flui como um líquido”, é o que você diria caso alguém te pedisse definir o material. Mas isso é verdade? E se eu te dissesse, por exemplo, que o mito que diz que vidros antigos são mais grossos na base porque o material “vazou” um pouco, fosse falsa? Vidro é um físico incrivelmente complexo que se esquiva de uma fácil definição.

Uma dupla de cientistas pretende redefinir o que é o vidro, para que estudantes possam entender o que acontece nesta estranha matéria. Demais pesquisadores não sabem dizer se estão prontos para aceitar uma nova definição, mas uma coisa é certa: vidro não é um “sólido” ou um “líquido” como você talvez acredite ser.

“Ele combina características de sólidos e líquidos”, explica ao Gizmodo John Mauro, autor da pesquisa, cientista da Penn State e inventor do Gorilla Glass para a Corning Incorporated. “Propomos uma nova definição para o vidro para precisamente capturar ambas características”.

Mauro e Edgar Zanotto, da Universidade de São Carlos, em São Paulo, propõem uma simples e oficial definição: “Vidro é uma matéria em estado de não-equilíbrio, não-cristalino que tem aparência sólida durante um pequeno período mas continuamente caminha para o estado líquido”. Em um nível mais avançado, eles sugerem que “vidro é um estado de matéria não-equilíbrio, não cristalino que exibe uma transição em vidro. A estrutura dos vidros é semelhante aos líquidos super-resfriados (SCL), e eles espontaneamente caminham para o estado SCL. Seu estado final é a solidificação, ou cristalização”. Eles recentemente publicaram a explicação no Journal of Non-Crystalline Solids.

A crise de identidade começa com o fato que, não importa quão sólido ele pareça ser, vidro sempre “relaxa”, caminhando ao estado de líquido super-resfriado. Estes líquidos se resfriam abaixo do ponto de solidificação, mas não se enquadram em padrões de cristalização. Alguns pesquisadores consideram vidros líquidos super-resfriados porque eles também se movem (incrivelmente devagar) e não possuem estruturas cristalinas comuns. Mas existe ainda uma vagamente definida temperatura – a temperatura de transição do vidro – em que o vidro se torna mais maleável e algumas de suas propriedades inatas se modificam. Vidro também armazena mais energia que um líquido super-resfriado na mesma temperatura.

A principal diferença entre vidro e outros sólidos amorfos é a presença desta temperatura de transição do vidro, uma em que as propriedades notoriamente mudam de vidro para líquido super-resfriado. Outros sólidos amorfos não possuem essa característica.

Pense em um teatro cheio de humanos aleatoriamente posicionados. Eles recebem a instrução de segurar as mãos de quem está próximo, se quiserem, independente de onde estão. Isso é o vidro – mas isso é uma bagunça e seria muito mais simples se todo mundo segurasse a mão de quem está ao seu lado. A temperatura do local começa a aumentar, e todo mundo recebe a nova instrução que pode soltar as mãos de quem segura e segurar as mãos de quem está ao seu lado assim que eles começarem a sentir calor. A temperatura de transição do vidro é melhor descrita quando as pessoas começam a se soltar e passam a segurar as mãos de outras pessoas ao seu lado – e neste período, ele é um líquido super-resfriado. Existe o “período de transição de vidro”, que é exatamente quanto tempo leva para chegar a essa transição de temperatura.

Os pesquisadores de vidro param a observação neste momento, mas assumem que, eventualmente em todos os casos, todo mundo acaba segurando as mãos de quem está ao seu lado e o sólido se transforma em cristal.

A definição final dos pesquisadores visa capturar tudo isso, já que eles supõem que definições anteriores não fizeram um bom trabalho. Robert Brow, pesquisador da Universidade de Ciência e Tecnologia Missouri, disse ao Gizmodo que a pesquisa é “ótima” e não vê problemas nesta ciência. Ele diz, no entanto, que os pesquisadores ficaram muito próximo de quase chamar vidro de líquido, dado quão sólido ele realmente é. A quantidade de movimento é incrivelmente lenta – vidros de catedrais são mais grossos em suas bases porque são mais pesadas nestes locais e foram instalados desta forma. O fluxo do vidro se move poucos nanômetros em bilhões de anos, explica Brown. Essencialmente, algumas coisas apenas evitam se definir, e o vidro é uma delas. “A não ser que a sua definição tenha apenas quatro página, ela pode ser mal interpretada”, diz.

Então, existe uma nova definição para o vidro – mas, como lembrete, ainda há muitos cientistas que não sabem sobre vidro ou o que ele é. Ele é um pouco complexo demais em seu comportamento para ser facilmente compreendido por um livro de química do ensino médio.

[Journal of Non-Crystalline Solids]

Imagem de topo: Nesster/Flickr

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