16 de agosto, o dia sinistro da música mundial

Elvis Presley, Dorival Caymmi, Aretha Franklin. Por coincidência, a quantidade de artistas brilhantes que morreram nesta data têm mais peso do que qualquer outro dia. Listamos aqui as perdas mais notáveis
Elvis Presley. Imagem: Wikimedia Commons/ Reprodução
Imagem: Wikimedia Commons/ Reprodução

O dia 16 de agosto tem um significado triste para a música popular mundial. Por coincidência, a quantidade de artistas brilhantes que morreram na data tem mais peso que outros 365 concorrentes (contando 29 de fevereiro, é claro). O adeus de Elvis Presley em 1977 é o mais marcante, mas outros três gênios – o bluesman Robert Johnson, o compositor brasileiro Dorival Caymmi e a rainha do soul Aretha Franklin – também se foram neste dia.

O outro dia que mais se aproxima é 8 de dezembro, com as mortes de John Lennon (1980) e Tom Jobim (1994). Um tiquinho mais abaixo em importância está 3 de julho, com Brian Jones, fundador dos Rolling Stones (1969), e o vocalista Jim Morrison, da banda The Doors (1971). Mas, no quesito “Outros”, 16 de agosto teve também mais nomes dignos de nota.

Recordemos um pouco do que os desaparecidos em 16 de agosto fizeram em vida para serem lembrados quando este dia chega.

-1938: Robert Johnson

A fama e o status de mito sagrado do blues veio muitos anos depois de sua morte aos 27 anos. Robert Johnson tinha gravado duas sessões para a gravadora Columbia em 1936 e 1937, mas seguia como músico itinerante em 1938.

Passando por Greenwood, estado do Mississippi, deu o azar de se esticar o olho na direção da mulher de um marido ciumento num bar. A versão hoje consagrada diz que o tal marido envenenou a garrafa da qual Johnson bebia naquela noite.

Logo, Johnson começou a se contorcer de dor enquanto seu organismo era lentamente destruído pelo veneno. Gemendo de dor, se arrastava pelas ruas andando de quatro. A agonia durou três dias e Robert deixou este mundo mau em 16 de agosto de 1938.

Ele tinha 27 anos. Com isso, inaugurou involuntariamente o “Clube dos 27”, composto por artistas da música que morreram com essa idade (Brian Jones, Jimi Hendrix, Janis Joplin, Jim Morrison, Kurt Cobain, Amy Winehouse…).

Mas Robert Johnson foi o primeiro e maior revolucionário do blues negro. Com seu violão, fazia riffs, temas e andamentos que anteciparam a popularização da guitarra elétrica entre os bluesman e também a existência do rock.

Praticamente anônimo fora do nicho do blues sulista nos anos 1930, Johnson foi redescoberto quando a Columbia reuniu suas gravações em dois álbuns nos anos 1960. Covers feitas por Rolling Stones e Eric Clapton (com o John Mayall’s Bluesbreakers e o Cream) só ajudaram a popularizar o mestre.

O rosto de Robert foi um mistério para o público até a descoberta de duas fotografias dele por volta de 1990. Uma em que ele posa com seu violão, outra com um cigarro pendurado. Finalmente o homem que estava à frente de seu tempo tinha uma face para ser reconhecida.

Em 2011, foi feito um gracioso clipe de animação que praticamente conta a vida de Johnson durante os 2 minutos e 37 segundos de sua gravação de “Cross Road Blues”.

-1956: Béla Lugosi

Você pode dizer que Béla Lugosi não era músico. Sim, é fato. Mas o ator que nasceu húngaro (hoje seria romeno) e se consagrou como o maior Drácula de Hollywood nos anos 1930 foi tema de um grande hit gótico, “Bela Lugosi’s Dead”, que a banda inglesa Bauhaus lançou em 1979.

O rock “dark” (como se falava no Brasil em meados dos anos 1980) do Bauhaus teve muitos anos de vida útil em pistas de dança. Aqui, uma apresentação da música na TV britânica em 1982:

“Bela Lugosi’s Dead” também foi tema de abertura do filme de vampiros chiques “Fome de Viver” (“The Hunger”, 1982), com direito a uma espécie de clipe com o vocalista Peter Murphy enquanto os nomes dos atores (como David Bowie) e atrizes (como Catherine Deneuve e Susan Sarandon) passavam pela tela.

Béla já estava morto muito antes desse tributo. Após o auge dos filmes de Drácula em Hollywood, Béla virou um viciado em morfina e aceitou papéis bizarros em comédias e filmes de terror classe C, além de virar parceiro de Ed Wood Jr., célebre dono do título de “pior cineasta de todos os tempos”.

Muito debilitado, Lugosi filmou algumas cenas sem som para “Plan 9 from Outer Space”, de Ed Wood, mas morreu de enfarte em 16 de agosto de 1956, aos 73 anos.

Wood, que não era de desperdiçar seu orçamento curto, utilizou as cenas mudas no filme, que foi completado com dublês que em nada se pareciam com Lugosi. Apenas uma de muitas bizarrices de um dos filmes mais toscos já feitos.

-1977: Elvis Presley

O Rei do Rock. Que mais pode ser dito sobre Elvis?

Ele tinha apenas 42 anos em 16 de agosto de 1977 quando seu coração entregou os pontos enquanto Elvis estava sentado no “trono” em seu banheiro na mansão Graceland, em Memphis. Resultado de anos de uma dieta alimentar nada recomendável e coquetéis diários de remédios para tudo e para nada que ele engolia como balas Kid’s.

Não é essa memória que deve ficar. Melhor é um dos melhores momentos de toda a carreira de Elvis, o especial de TV para a emissora NBC em 1968, no qual ele mostrou que ainda rugia depois de servir ao exército e fazer filmes bobos nos dez anos anteriores.

Três momentos inigualáveis do especial de TV. Primeiro, um medley de “Heartbreak Hotel / Hound Dog / All Shook Up”:

Uma versão de paixão pura e intensa de “Tryin’ To Get To You”:

E a mais que clássica “Blue Suede Shoes”:

-2007: Max Roach

Um dos mais fantásticos bateristas da história do jazz, Max Roach foi vencido pela doença de Alzheimer em 16 de agosto de 2007, aos 83 anos.

Gigante, Roach tocou com outros gigantes. Foi um dos pioneiros da revolução bebop nos anos 1940. E seu currículo parece uma enciclopédia, incluindo gravações com Duke Ellington, Dizzy Gillespie, Miles Davis, Thelonious Monk, Bud Powell, Sonny Rollins, seu parceiro Clifford Brown, Dinah Washington, Charles Mingus e Stan Getz, entre muitos outros.

Mas Max não foi coadjuvante. Manteve seu próprio grupo ativo de 1953 a 2002 com diferentes formações (de trio a sexteto) por décadas.

Aqui vai um clipe de 1994 com Max Roach fazendo miséria com apenas um chimbau e duas baquetas em “Mr. Hi Hat”:

E um solo com bateria completa na apresentação com seu sexteto no Festival Jazz Lugano, na Suíça, em 1990:

2008: Dorival Caymmi

O compositor e cantor baiano Dorival Caymmi criou várias das grandes canções da MPB: “O Que É Que a Baiana Tem?”, “Samba da Minha Terra”, “Marina”, “Modinha para Gabriela”, “Maracangalha”, “Só Louco”, “É Doce Morrer no Mar”, “O Mar”, “Saudade da Bahia”… E tem muito mais além dessas.

Caymmi conviveu por nove anos com um câncer renal até sair de cena em 16 de agosto de 2008, aos 94 anos.

A canção “Marina” teve Dorival e seu vozeirão num especial da TV Cultura de São Paulo que era de seu filho Dori Caymmi, gravado em 1996 no Palace, em São Paulo.

Para quem tiver mais tempo, um vídeo com o programa inteiro de Dorival Caymmi na série “MPB Especial”, da TV Cultura, gravado e exibido originalmente em 1972.

-2018: Aretha Franklin

Uma voz imensa capaz de arrepiar montanhas, moldada no gospel tradicional para triunfar na soul music dos anos 1960 e se adaptar ao pop sem perda de qualidade. Aretha Franklin, a Rainha do Soul, não resistiu a um câncer de pâncreas em 16 de agosto de 2018, aos 76 anos.

Dos corais de igreja onde treinou sua voz desde cedo, Aretha iniciou uma carreira comercial em 1961 na Columbia. Mas seu descobridor John Hammond encaixotou a jovem cantora num estilo puxado para um jazz sofisticado. Ruins não são, mas os álbuns que Aretha gravou entre 1961 e 1966 não emplacaram.

Cansada de seu repertório na Columbia, Aretha mudou-se em janeiro de 1967 para a Atlantic, uma gravadora com tudo a ver com rhythm’n’blues e soul desde a década anterior. Foi gravar no estúdio Muscle Shoals, no Alabama, com a incrível banda da casa, cheia de ginga soul.

Dessa parceria saiu o clássico álbum “I Never Loved a Man the Way I Love You”. E deste saiu o single “Respect” numa versão explosiva e celebratória que engole o original do cantor Otis Redding. Aretha transformou a composição num hino feminista atemporal que funciona até hoje.

Antes de cantar “Respect” no Monterey Pop Festival, naquele mesmo 1967, Otis brincou que “aquela garota roubou minha canção”. Correto. “Respect” estará associada imediatamente a Aretha Franklin até o fim dos tempos.

Eis uma versão de “Respect” com Aretha num programa de TV dos EUA:

Uma cover de “Say a Little Prayer”, famosa também na voz de Dionne Warwick:

E Aretha demonstra todo seu poder nesta apresentação no Kennedy Center, em Washington, diante do então presidente Barack Obama e sua esposa Michelle. Com esta versão de “(You Make Me Feel Like) A Natural Woman”, a cantora extraiu lágrimas do casal presidencial, além da compositora da canção, Carole King, presente ao evento.

-2019: Peter Fonda

Tal qual Béla Lugosi acima, Peter Fonda não foi artista da música. Mas quantas pessoas podem dizer que inspiraram uma música dos Beatles? E quantas deixaram uma música tão associada a um filme como aconteceu com “Born to Be Wild” e o longa-metragem “Sem Destino/Easy Rider”(1969), estrelado por Fonda?

O próprio John Lennon contou que se inspirou numa conversa durante uma viagem de LSD da qual ele e Fonda participavam para compor “She Said She Said”.

Com a droga batendo torta e partindo para uma “bad trip”, Fonda disse que sabia o que era estar morto porque teve uma parada cardíaca num hospital depois de um acidente quando era menino.

Mesmo achando que Peter estava ficando chato com aquele papo, Lennon ficou com as frases na cabeça e as transformou em versos de “She Said She Said”. Ele apenas mudou o gênero do interlocutor.

No ano passado, o canal oficial dos Beatles lançou um videoclipe bem psicodélico de “She Said She Said”.

Quanto a “Born to Be Wild”, o rock foi lançado pelo grupo americano Steppenwolf em 1968 e chegou ao 2º lugar da parada americana de singles. Mas sua glória para a posteridade viria com o filme “Easy Rider”, no qual embala algumas cenas de Peter Fonda e Dennis Hopper correndo por estradas americanas com suas motos incrementadas.

Este clipe feito pelo canal HD Film Tributes compila várias cenas do filme para criar outro clipe de “Born to Be Wild”:

Marcelo Orozco

Marcelo Orozco

Jornalista que adora música, cultura pop, livros e futebol. Passou por Notícias Populares, TV Globo, Conrad Editora, UOL e revista VIP. Colaborou com outros veículos impressos e da web. Publicou o livro "Kurt Cobain: Fragmentos de uma Autobiografia" (Conrad, 2002).

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