TVs de tela plana, compras online e homens na lua? Todos estes eram fantasias de ficção científica dos anos 60. Entretanto, de alguma maneira, o inventor Lee DeForest previu que, lá pelo ano 2000, tudo isso seria realidade. A verdade é que você não precisa necessariamente de uma bola de cristal para ver o futuro.
O pai do rádio
A edição de 17 de janeiro de 1960 do suplemento dominical American Weekly incluía um artigo bem futurista escrito por DeForest, um homem que era chamado de “pai do rádio”. No texto, ele descrevia um mundo que seria reconhecível hoje, mas alienígena há cinquenta anos.
Lee DeForest, por vários motivos, era um homem frustrado. Ele levou os créditos pela invenção da tecnologia revolucionária do rádio, mas nunca se sentiu devidamente reconhecido por suas contribuições. Ele era, na maioria das vezes, constrangido publicamente por outros inventores por não entender como sua própria invenção, o audion, funcionava. Você pode imaginá-lo como o nerd engravatado do começo do rádio.
Mas, no fim da vida (DeForest tinha 87 anos em 1960), ele conseguiu fazer previsões fascinantes do nosso brilhante e reluzente futuro. Muitas das previsões dele parecem ser lidas diretamente de um roteiro dos Jetsons. Mas o desenho da família espacial do século XXI só iria ao ar na TV americana dois anos depois. Em vez disso, os palpites de DeForest parecem tirados do éter e recheados com grandes promessas de um futuro tecnológico. Nem todos os prognósticos se cumpriram, claro. Ao menos, até agora.
Exploração espacial
Voltemos a 1960, quando a exploração espacial ainda estava engatinhando. DeForest anteviu que teríamos chegado à Lua até o ano 2000. Ele estava certo (nós fizemos isso em 1969), apesar de sua previsão de uma base permanente ser um tanto otimista.
Os homens terão orbitado ao redor da Terra e da Lua muitas vezes. Plataformas espaciais fora da atmosfera da Terra serão usadas como estações de retransmissão. Nós teremos pousado na Lua e estabelecido uma base lá. Mísseis equipados com instrumentos serão atirados a milhões de milhas no espaço, e retornarão à Terra com informações dos planetas e outros corpos de nosso sistema solar.
Comunicação
DeForest previu que, no ano 2000, os americanos teriam TVs de tela plana presas nas paredes, traduções automáticas de idiomas estrangeiros no telefone e até mesmo uma versão visual remota de lojas. Ele também acertou os smartphones quase na mosca.
Você terá telefones portáteis que não serão maiores que um maço de cigarros king-size (rádios transistorizados desse tamanho já estão sendo feitos). Você poderá ligar para sua família enquanto anda por uma rua de Boston, ou para um amigo em Los Angeles — ou até mais longe.
Uma TV miniatura irá permitir que você veja a pessoa para qual está ligando. (Desde que você aceite uma imagem muito menos detalhada da TV da sua sala, nós já podemos enviar fotos por cabos telefônicos ou faixas estreita de rádio.) Você também poderá ver itens que está pensando em comprar, de pequenos produtos até casas e apartamentos.
Quando for ligar para outro país, equipamentos de tradução eletrônica, construídos a partir dos princípios dos computadores atuais, irão traduzir sua conversa instantaneamente. Se, por exemplo, você ligar para o Japão, as respostas virão traduzidas do japonês.
A televisão mundial, tanto colorida quanto preto e branco, será comum. Problemas atmosféricos nunca irão interrompê-la; retransmissões serão possíveis por meio de satélites de comunicação ou uso de difusão atmosférica, que já reflete em algumas ondas de TV em distâncias fenomenais.
TVs em miniatura, completamente portáteis, e aparelhos de superfície plana pendurados como retratos na sua parede serão completamente comuns.
Transporte
O futuro dos transportes nas décadas de 50 e 60 envolve, frequentemente, duas coisas: voo e automação. DeForest apostou todas suas fichas nos dois, com seus carros dirigidos automaticamente (na mosca!), jatos atômicos de passageiros (não longe) e disseminadas calçadas rolantes (bem Jetsoniano, mas antes dos Jetsons existirem).
Os carros terão “pilotos automáticos”. Depois de entrar numa via expressa, você poderá relaxar e andar como um raio invisível. Seu carro permanecerá a uma distância segura dos outros e o radar automaticamente usará os freios quando for necessário.
Helicópteros de passageiros — os hélibus — irão tirar você dos congestionamentos, trafegando pelo céu em vias expressas multiníveis controladas por radar que, a propósito, serão muito mais baratas que as terrestres. Aviões particulares, vendidos a preços módicos e equipados para decolagem e pouso verticais, também encherão os ares.
Mísseis atômicos carregarão correspondências e encomendas entre cidades — e continentes — em minutos. Jatos e foguetes serão um lugar-comum para voos de passageiros.
As ruas do centro da cidade terão calçadas do tipo escada rolante. Elas levarão você de uma loja ou escritório a outros — e você poderá sentar num banquinho portátil, se preferir.
Iluminação
A “luz fria” era uma promessa do futuro que data do século XIX, mas a eletroluminescência não será comum nas empresas como a Sylvania e a Chrysler até os anos 60. DeForest imaginou que estas vibrantes “luzes frias” iriam revolucionar a maneira como construímos ambientes.
A eletroluminescência, ou “luz fria”, irá revolucionar a aparência das casas, indústrias e cidades inteiras. Sem calor, sombra ou ofuscamento, este amável “brilho” irá nos levar a uma nova era de conforto e segurança em nossos cômodos, aeroportos e estradas. Um toque num botão irá permitir mudanças de nuances em paredes inteiras.
Energia
A adoção em larga escala da energia nuclear e solar como fontes para uso geral era uma previsão comum no começo dos anos 60, mas foi a insistência de DeForest na energia sem fio como a grande onda do futuro que deixou surpresos os leitores da American Weekly na metade do século.
A energia nuclear será uma fonte prática para a indústria, automóveis, navios, mísseis, trens e aviões. Uma “dose” de combustível atômico irá durar anos, até mesmo décadas. Uma única bateria atômica irá produzir a eletricidade necessária por anos em casa ou fábricas em regiões isoladas.
Dispositivos que irão capturar e estocar energia a partir dos raios do sol tornarão o aquecimento solar uma realidade, assim como a iluminação e a energia. A energia solar, em algumas regiões, será mais barata e prática que a nuclear!
Algum dia, também, a necessidade de cabos de força e itens comuns nas casas de hoje, como tomadas e fios, podem desaparecer: há a possibilidade técnica de que a energia pode ser transmitida diretamente por raios invisíveis — e que um avião, por exemplo, pode ser controlado e abastecido pela transmissão de um sinal de rádio e energia.
Negócios e indústria
DeForest profetizou que o escritório do futuro estaria cheio de computadores eletrônicos — liberando milhares de trabalhadores para encontrar outro trabalho que os computadores ainda não estariam aptos a fazer. E, assim como os caixas registradores de amanhã, estes computadores poderiam entender a fala.
Automação, equipamentos eletrônicos e outras máquinas tornarão possível aumentar a produtividade por trabalhador, criando mais tempo para lazer e um padrão de vida constantemente crescente. (Usinas de processamento atômico, refinarias de olho e outras já podem ser operadas em grande parte por um painel de controle.)
Muitas firmas já estão afundando num mar de papel que não para de crescer; isso ocorre com o governo. Computadores eletrônicos irão assumir o controle dos trabalhos de registro e contabilidade, liberando dezenas de milhares de pessoas para outras responsabilidades. A necessidade de modelos caros de teste para novos produtos, de jatos a itens menores, será eliminada: os computadores poderão predizer a performance deles sob diversas condições em algumas horas.
Você poderá ditar anotações e cartas diretamente em uma máquina de escrever eletrônica. Uma máquina fonética rudimentar já pode datilografar algumas palavras e frases simples à medida que elas são faladas num microfone.
Saúde
DeForest previu que a automação na medicina, graças a computadores, permitiria diagnósticos rápidos e referência cruzada de doenças. Mas eram os transplantes de órgãos — que ainda não eram uma realidade nos hospitais americanos da época — os avanços incrivelmente futurísticos para as pessoas dos anos 60.
O tempo de vida do homem irá crescer para cerca de 100 anos. As causas e a cura do câncer terão sido encontradas. Nós saberemos lidar com a maioria dos tipos de doenças cardíacas. A capacidade de “transplantar” certos órgãos e tecidos, novas curas para muitas doenças mentais, o domínio das deformações da artrite e até mesmo da maioria dos tipos de dor de cabeça e resfriados — tudo isso será parte das conquistas da medicina.
O átomo e o elétron serão os servos do seu médico. “Cérebros” eletrônicos, por exemplo, irão guardar o conhecimento de todo sintoma de toda doença, tornando instantaneamente disponíveis para os médicos as últimas descobertas científicas, em qualquer lugar, até mesmo as que eles nem sonhavam em obter.
Alimentação
Apesar da impressionante abundância de comida que era produzida nos anos 60, havia uma preocupação de que o mundo não poderia produzir alimentos suficientes para abastecer a população. DeForest viu respostas para a crise da superpopulação na extração marítima e no desenvolvimento de métodos de plantio.
Novas descobertas farão as águas da miséria recuarem de cada um dos cantos da civilização. Nossos oceanos ilimitados serão “cultivados” para obter produtos nutritivos. O refinamento da água salgada em água fresca será difundido e barato. Notáveis desenvolvimentos em irrigação e controle de inundações, uso mais eficiente da energia solar, aceleração eletrônica da germinação e do crescimento e descobertas químicas e biológicas revolucionárias irão expandir as fontes de alimentação da humanidade, de maneira que os famintos serão eliminados — mesmo com imensos aumentos populacionais.
Lar
Utensílios eletrônicos iriam reinar na casa do futuro, escreve DeForest. Fornos de cozimento rápido iriam prepara carne em questão de segundos e a louça suja seria lavada por ondas sonoras de alta frequência. Pisos resistentes à sujeira e tinta anti-insetos iriam contribuir para tornar a casa do amanhã uma versão sanitária da perfeição.
Não haverá problemas para cuidar da casa, praticamente. A temperatura, a umidade e a velocidade do ar em cada parte será mantida automaticamente em níveis confortáveis, dia e noite. Fumaça, poeira e bactérias nocivas serão removidas do ar antes de entrar. O aquecedor reversível, baseado no princípio dos resfriadores, irá esfriar as casas no verão e aquecê-las no inverno.
Utensílios eletrônicos farão suas tarefas de cozinhar, lavar a louça e jogar o lixo fora. Ondas sonoras de alta frequência irão limpar os pratos. Um forno eletrônico vai assar a carne em dois ou três minutos. Todas essas ferramentas poderão ser desligadas a quilômetros de distância, discando códigos no seu radiofone portátil e, graças ao “centro” eletrônico da casa, você poderá aproveitar luxos como ter o café da manhã pronto assim que acorda.
Cobertores não serão mais necessários dentro de casa; uma “cobertura” radiante sobre sua cama irá substituí-los. Em vez de uma janela, haverá uma “cortina” invisível de vento para dividir sua sala do quintal. Um circuito de TV irá permitir que você veja o quarto das crianças ou outros cômodos mesmo estando do outro lado da casa.
Novos pisos, móveis e revestimentos de parede resistentes à sujeira e à graxa estarão disponíveis. Haverá inclusive uma tinta que, ao longo de anos, irá matar qualquer inseto que toque nela.
Clima
O controle do clima era um debate quente nos anos 50. O exército americano chegou a imaginar que poderia usar o tempo como arma contra a União Soviética durante a Guerra Fria. Mas DeForest viu o controle do clima por uma lente mais humanitária — desviando furacões ou diminuindo seu poder destrutivo.
Graças às informações obtidas por satélites, assim como pela análise eletrônica do solo, da atmosfera e dos oceanos, o controle climático estará ao alcance das mãos do home. Nós saberemos como dissipar tempestades de intensidade de furações ou desviá-las de seu curso destrutivo. Nós descongelaremos portos que estão agora bloqueados pelo gelo. Poderemos prever o tempo precisamente por meses e anos.
DeForest não viveu para ver o ano 2000. Na verdade, ele morreu um ano depois de publicar esse artigo. Mas com todas as coisas que ele acertou (ao menos em parte), acho que ele estaria bem satisfeito consigo mesmo, mesmo que poucas pessoas hoje lembrem quem ele foi.