Texto: Agência Bori
Highlights
- Pesquisa em escolas do ensino médio de Fortaleza (CE) mostra que 71% dos jovens entre 13 e 19 anos da amostra bebem pelo menos uma vez por mês
- Fatores como fumar na escola e ter pais ou responsáveis que bebem estão associados ao consumo precoce de álcool, além de falta de resiliência emocional
- A religião é fator protetivo da exposição precoce a bebidas alcoólicas ao oferecer suporte social e impor preceitos comportamentais aos jovens
As bebidas alcoólicas são consumidas cada vez mais cedo por jovens brasileiros – e esse comportamento tem relação com o seu ambiente e suas habilidades socioemocionais. Em escolas públicas de Fortaleza, Ceará, adolescentes extrovertidos com baixa capacidade de lidar com frustrações são duas vezes mais propensos a consumir álcool antes dos 15 anos, em comparação a jovens que desenvolvem resiliência emocional. É o que mostra estudo inédito da Universidade Estadual do Ceará (Uece) publicado na segunda (17) na “Revista Psicologia: Teoria e Pesquisa”.
Entre os fatores de risco para o consumo precoce de álcool, o estudo também destaca comportamentos de bullying e tabagismo no ambiente escolar, não ter religião e ter pais ou responsáveis que bebem.
Para chegar a esses resultados, os pesquisadores analisaram o comportamento de 528 estudantes do primeiro ano do ensino médio de 12 escolas públicas da capital cearense. As unidades em questão são adeptas do tempo integral, que adota atividades em dois turnos – uma política que tem a intenção de promover o acesso a uma educação integral, além de retirar os jovens de situações de vulnerabilidade fora da escola. Os estudantes, com idade entre 13 a 19 anos, responderam a seis questionários, com questões sobre seu padrão de consumo de álcool.
A amostra da pesquisa era composta por adolescentes do sexo feminino (63,1%), pardos (54,7%), com uma religião cristã (51,5%). Cerca de 37% confirmaram a prática de consumo precoce de álcool e 71% afirmaram que fazem uso de bebidas alcoólicas pelo menos uma vez por mês.
A associação de álcool e bullying, tema inicial da pesquisa, é alvo de alerta de autoridades em saúde e educação. Segundo levantamentos nacionais, a prevalência de adolescentes que consomem álcool varia de 20% a 26%. Além disso, essas pesquisas também destacam o uso cada vez mais precoce desse consumo, com início a partir dos 12 anos. A prática do bullying também tem se tornado comum no ambiente escolar. Quatro em cada dez estudantes brasileiros já vivenciaram a intimidação sistemática com uso de violência física, verbal ou psicológica, segundo a última Pesquisa Nacional de Saúde Escolar, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2021.
O trabalho se destaca por incluir variáveis individuais, psicológicas e sociais no modelo explicativo sobre álcool e bullying, segundo destaca a autora principal do estudo Dayse Alves, que é professora do curso de Medicina da Uece. Entram neste modelo o comportamento dos pais e responsáveis e comportamentos na escola e entre colegas.
Os resultados mostram que ter uma religião protege os adolescentes da exposição precoce a bebidas alcóolicas – relação já corroborada por outras pesquisas. Isso se explica pelo fato de a religião ajudar os jovens a lidar com as questões éticas e existenciais, além de impor preceitos comportamentais, segundo os especialistas. “É importante destacar que outros contextos de suporte social e maior supervisão podem ajudar os adolescentes a fazerem um consumo menos nocivo do álcool, além da religião”, avalia Alves.
Para a pesquisadora, a identificação de fatores de risco permite mapear caminhos para a prevenção ao consumo precoce e abuso de álcool na adolescência – com ênfase, por exemplo, no desenvolvimento de resiliência emocional. “Tomar iniciativa social e ter entusiasmo são cruciais para se desenvolver relações saudáveis. No entanto, se um/uma adolescente possui alto engajamento social, mas baixa resiliência emocional, ele/ela pode acabar utilizando o álcool como forma de enfrentar problemas emocionais e psicológicos, além de que pode se tornar mais vulnerável à influência dos pares’’, alerta.