É uma transformação mais sutil do que você imagina.
Semana passada no Google I/O 2015, um dos temas principais da apresentação foi o foco dado por Sundar Pichai ao Android como o futuro do Google. A plataforma não é só o núcleo dos negócios de celulares e tablets do Google; é o núcleo da próxima fase, que Pichai descreve como “dispositivos conectados” à internet das coisas. Ele imaginou um mundo de hardwares que fazem de tudo, desde monitorar o trânsito até o seu batimento cardíaco, tudo reunido pelo sistema operacional do Google.
Permita-me mostrar o que isso realmente significa. O gigante que redefiniu a ideia de Web 2.0 durante a virada do milênio está se redefinindo como um gigante do sistema operacional. Como diriam os cylons, isso já aconteceu e irá acontecer de novo.
Sistemas operacionais para as massas
Durante o século XX, a Microsoft dominou o mercado de computadores ao focar no sistema operacional que ela tinha, o Windows. Claro, ele estava em constante competição com o sistema operacional da Apple — da mesma forma que o iOS compete com o Android hoje. E houve a inserção do Linux. Mas a Microsoft ganhou a batalha por diversos motivos.
Primeiro, ela era agnóstica aos hardwares. Da mesma forma que o Android, o Windows era projetado para funcionar em diversos tipos de computadores. E seus softwares, como o Word, eram igualmente agnósticos. Era possível rodar o Word em uma máquina da Apple (algo que eu fiz, inclusive, durante meus anos como estudante universitária em meu estiloso Mac Quadra). Da mesma forma, os apps do Google são feitos para rodar no iOS.
Ao tornar o Windows mais universal, a Microsoft conseguiu dominar o mercado de software. Eles tornaram o ecossistema do computador de mesa em um ecossistema Windows. Inclusive, esse ecossistema persiste até os dias de hoje. A Net Applications, uma empresa de análise de mercado, estima que o Windows está instalado em 91% dos computadores desktop do mundo.
A estratégia do Android para dominar o mundo
Mas a Apple finalmente encontrou uma maneira de transformar a sua maior limitação em uma vantagem. Em vez de projetar um sistema operacional para uma linha reduzida de PCs, a empresa focou nos eletrônicos de consumo. Com o iPod, o iPad e o iPhone, ela passou à frente da Microsoft em players de mídia, smartphones e tablets – e o mais importante, em lucros. Eles não precisavam disponibilizar o próprio software em todos os dispositivos: o hardware deles é a isca.
E é nisso que entra o Android, com seu sistema operacional desafiador. O Android deixou de lado a ameaça do Linux ao simplesmente incorporá-lo (talvez de forma inepta, como dizem muitos desenvolvedores, mas ainda assim efetiva). E agora que os dispositivos móveis são cruciais, o Google espera dominar o mercado com um sistema operacional para todos governar.
Entretanto, ainda existem muitas diferenças entre o que o Android tenta fazer e o que o Windows fez no século passado. Primeiramente, os dispositivos Android serão fundamentalmente mais diversificados que os computadores de mesa, podendo se tornar um dia parte da infraestrutura urbana, indo além do seu carro e do seu smartphone.
E mesmo o Android sendo um sistema operacional poderoso, o objetivo do Google sempre foi de comandar a nuvem. Então, mudamos de um mundo com dispositivos inteligentes rodando Windows em uma internet relativamente burra, para dispositivos relativamente burros em uma nuvem inteligente. Porque é claro, o seu dispositivo Android não tem muita utilidade (e nem é muito legal) se você não puder conectá-lo aos seus dados pessoas na nuvem do Google, ou de qualquer outra empresa.
Esta mudança significa que seus dados são bem importantes para o valor do Android. Os computadores de mesa eram ótimos para acessar e organizar os seus dados. Mas a infraestrutura dos dispositivos móveis também serve para gerar dados. Quanto mais você usa o seu dispositivo, mais informação ele coleta sobre você, e “melhor” ele se torna. E é isso que trouxe tantas melhorias ao Google Now, além de outras inúmeros aplicativos que colhem todo tipo de informação.
É isso mesmo: você é parte do gadget. O Android é você.
Revisitando A Estrada do Futuro
Sobretudo, pelo que pude entender, ele falava sobre a “World Wide Web” e navegadores. Isso era nos primórdios do Internet Explorer, e Gates pregava como o amanhã nos traria maravilhas internéticas — algo que já era óbvio a mim, mas talvez não para as pessoas mais velhas e para a grande maioria dos usuários do Windows.
Naquele tempo, o futuro era a web, e ela deu luz a algo chamado Google, que cresceu para rivalizar a Microsoft com seu poder — e sua habilidade em definir o cronograma para o nosso futuro tecnológico.
O Google agora diz que o futuro está no sistema operacional. É o fim de um ciclo – ou, mais precisamente, começamos a repetir o mesmo ciclo, trazendo de volto o foco no sistema operacional, mas com uma pequena diferença de perspectiva.
O ecossistema dos dispositivos tem algumas diferenças, e há mais dados para se processar, mas o objetivo é o mesmo: Microsoft e Google querem criar plataformas que controlam as máquinas de informação do mundo, por bem e por mal. Conforme os PCs perdem a importância pouco a pouco, dispositivos conectados dominam o mundo; o Android toma o reino, e o Windows tenta se reinventar.
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