Falamos muito de smartphones modernos aqui no Gizmodo, mas como ficam os celulares mais simples? Androids low-end, linha Asha, feature phones… Pode parecer que não, mas esse ainda é um grande mercado. Com isso em mente, pegamos um Asha 311, da Nokia, para experimentar. Como ele se sai substituindo um smartphone melhor? Dá para viver com um modelos simples do tipo?
Smartphones topo de linha que custam próximo (ou acima) de R$ 2 mil costumam ser o centro das atenções. Escrevemos notícias, falamos de vazamentos, publicamos reviews completos de todos eles. É nessa faixa que as maiores inovações acontecem, logo, nada mais natural que ela ganhe tanta atenção. No dia a dia, porém, a história é outra. Não é preciso estatísticas ou estudos para identificar o fenômeno. Faça um teste você mesmo: ande na rua, entre em uma estação do metrô, passeie pelo pátio de uma universidade e conte quantos desses smartphones caríssimos estão circulando. Agora conte quantos pé de boi, quantos feature phones e celulares básicos são avistados. Que diferença, não?
A ideia deste review é, sim, analisar o Asha 311, mas também responder duas perguntas fundamentais. Primeiro, se alguém acostumado a smartphones mais caros conseguiria se virar com um mais simples — o preço sugerido dele é R$ 399. Depois, se nessa faixa os aparelhos com S40 da Nokia se saem melhor que os (sofríveis) Androids de entrada. Essas e outras respostas, na sequência.
Espera, smartphone? S40? Sério!?
O que define um smartphone? Existem características, regras, alguma regulamentação que permita às empresas classificarem seus smartphones como tais? Aparentemente, não. Há convenções, sendo a capacidade de executar apps desenvolvidos por terceiros para a plataforma a mais recorrente. E, hey, isso o S40 tem!
Sempre que pode (a assessoria no Brasil fez questão de ressaltar), a Nokia reafirma que o Asha é um smartphone, pelo menos na classificação usada pelo IDC (que a negou a um jornal da Índia) e a GfK, dois institutos de pesquisas de mercado. Sendo ou não, há várias coisas que esses aparelhinhos compartilham com os smartphones, o que torna a experiência no mínimo parecida.
A ausência mais sensível é a multitarefa, mas o que seria uma falha pode ser encarada, sob certo prisma, como uma virtude: sem ter vários apps disputando espaço na memória, podendo focar todo o hardware em um app de cada vez, não tive aquela sensação de lentidão irritante que os Androids mais simples passam.
Existem dois “poréns” aí, um bom e outro ruim. Primeiro, o bom: apesar da falta da multitarefa, há notificações push para alguns poucos apps. Email, bate-papo e WhatsApp, por exemplo, deixam um ícone na barra de status e, quando o usuário volta para a tela inicial, exibem um pop-up na tela que funciona como pré-visualização e atalho rápido para o app em questão. A parte ruim é que os aplicativos são sofríveis. Chegaremos neles. Antes, vamos dar uma olhada mais de perto nesse Asha 311.
Asha 311: processador de 1 GHz e 3G
A Nokia lançou e posiciona a linha Asha como uma opção baixo custo para quem não se contenta com dumbphones — e a empresa está de olho mesmo é no próximo bilhão de usuários. No Brasil, são comercializados vários modelos com preços que variam de R$ 229 (Asha 202) a R$ 399 (Asha 311); ambos preços sugeridos, no mercado são encontrados por valores mais em conta.
Por essa lógica, o Asha 311 está no limite do que a Nokia pode (ou quer) oferecer nesse segmento. Ele é basicão, mas como evidencia seu “slogan”, tem processador de 1 GHz e conectividade 3G, duas características incomuns em aparelhos simples. E tem mais, como a tela de 3″ sensível a toques capacitiva com revestimento Gorilla Glass (!), acelerômetro e notificações push.
O aparelho é pequeno, tem um desenho bem convencional, com botões frontais para atender e desligar chamadas (sem equivalentes na tela)/sair de apps/ligar e desligar e, do lado direito, outros três, para (des)bloqueio da tela e controles de volume — todos bem duros, aliás. As portas, para recarregar a bateria, microUSB e fones de ouvido, ficam todas na parte de cima. Aqui temos duas oportunidades perdidas. Primeiro, a Nokia não manda o cabo microUSB na caixa do Asha 311. Estranho. Segundo, a conexão microUSB também carrega a bateria. Poderia ter economizado cabo e um buraco no aparelho se, a exemplo de quase todos Androids atuais, as funções de transferência de dados e recarga da bateria fossem concentradas na porta microUSB…
Atrás estão a câmera (3,2 MP de péssima qualidade) e o potente alto-falante. Com exceção da base, que é feita de um plástico fosco bem agradável ao tato, todo o resto ou é tela, ou é plástico black piano, ambos verdadeiros imãs para impressões digitais, o que deixa o Asha 311 com um aspecto barato, mulambento. Este celular deve ser um deleite para investigadores do CSI.
Não dá para esperar grandes feitos de um equipamento de baixo custo, embora o Asha 311 se destaque dos demais S40 em alguns pontos, já citados acima. Mas não é preciso ir muito longe para ver onde ele se compromete. Não conte com essa câmera para gravar seus momentos especiais; ela estoura facilmente, gera imagens lavadas e com bastante ruído, é lenta e tem foco fixo. Alguns exemplos, todos sem pós-produção:
Infelizmente um dos pontos mais promissores mostrou-se uma decepção: bateria. Talvez a única vantagem esmagadora de modelos simples frente aos smartphones mais sofisticados, a autonomia do Asha 311, pelo menos usando conexão de dados da operadora, é pífia. A energia é drenada muito rapidamente e não aguenta um dia normal de uso, como a maioria dos smartphones.
Para os nostálgicos, uma boa notícia: o alarme continua funcionando mesmo quando o celular está desligado. É um recurso característico da velha Nokia, e uma preocupação extra em dias de concurso, vestibular ou concertos — fique esperto e, na dúvida, remova a bateria!
S40 prova que cachorro velho pode aprender novos truques
A transição para a interface sensível a toques foi bem menos traumática no S40, sistema operacional que equipa o Asha 311, do que a do Symbian, por exemplo. Há mais consistência e padronização no sistema e ele está recheado de pequenos mimos vindos dos irmãos mais velhos que dão um toque extra de sofisticação.
O esquema de três telas foi herdado do MeeGo e, embora exiba telas diferentes, funciona da mesma forma: com gestos laterais. Se lá tínhamos app drawer, notificações e multitarefa, aqui a oferta é menos interessante: o app drawer resiste, com a antiga tela inicial do S40 em uma ponta e, na última tela, o discador (que pode ser substituído pelo app de música ou de rádio). Também do MeeGo vêm as notificações na lock screen que, arrastadas, abrem diretamente o app em questão.
Outra novidade é a presença de uma cortina na barra de status. Ela é bem menos dinâmica que no Android, mesmo quando comparada a versões antigas do sistema do Google. Há controles rápidos para Wi-Fi, dados, 3G e perfil (de toques) e atalhos rápidos para música, discador e mensagens. Nem apps de terceiros, nem outros da própria Nokia interagem com essa porção do sistema. Seria um desperdício em outras plataformas, mas considerando a fragilidade do S40, dá até para entender — não gera complicação, não sobrecarrega o sistema e por aí vai.
Coisas que o Symbian demorou a ter, como uma tecla “voltar” padronizada por todo o sistema, marcam presença. Os ícones seguem o formato quadrado arredondado comum em outros sistemas da casa, mas essa uniformidade vai para o espaço com a instalação de apps. A apresentação é simples, mas o sistema é surpreendentemente ágil. Transição de telas, abertura de apps (com algumas exceções) e outras ações não deixam o usuário esperando, o que é uma vantagem enorme em comparação aos Androids de entrada, verdadeiros testes de paciência.
Apesar da consistência, alguns problemas do passado continuam presentes e outros surgiram nessas últimas iterações do S40. O insistente pedido para o usuário escolher o tipo de conexão a usar, por exemplo, continua. O teclado não se decide entre usar o T9 (que auto-completa palavras) e o modo de escrita convencional, culminando em coisas sem sentido como usar T9 para senhas — se digitada dessa forma, ela fica armazenada no dicionário do aparelho. O acelerômetro não afeta todos os apps, é sempre uma loteria, e o navegador, simples de tudo, pede para recarregar a página quando se muda a orientação para que o layout se ajuste.
Falando em apps, os de terceiros são frustrantes (o Foursquare demora horrores para fazer qualquer coisa), alguns nativos são risíveis (o Twitter não tem aba de menções). Quase todos são feios e desengonçados. Há uma ou outra exceção, mas geralmente em apps sem muito significado — o despertador, temporizador, gravador e outros “apps” que você encontraria sem surpresa em uma calculadora mais avançada são bem legais. Para piorar, não espere nada da Loja além de jogos de gosto duvidoso e skins feias. Novamente, poucas exceções se sobressaem lá: WhatsApp, Twitter (“oficial”, feito pela Nokia e menos pior que o nativo), Opera Mini, Foursquare, Facebook… redes sociais, e nenhum melhor que as contrapartes para Android. Viver com um S40 é abdicar de apps bem feitos.
Antes de continuarmos, deu pra sacar que o S40 do Asha 311 não faz screenshot, certo?
É melhor que um Android barato?
Por mais problemático que o Asha 311 seja, ainda assim o escolheria se a minha única outra opção fosse um Android de entrada. Apesar da baixa qualidade do ecossistema de apps, ele de modo geral é rápido, principalmente em áreas do próprio sistema. Se com um Galaxy 5 da vida é preciso paciência para esperar a agenda de contatos carregar e o aplicativo “Telefone” travar não causa nenhum espanto, essas e outras ações no S40 são desempenhadas sem dificuldade — e isso não acontece só no aparelho da Samsung lançado em 2010, mas também em aparelhos bem mais recentes, como o Galaxy Y ou o MotoSmart, da Motorola, celulares com memória RAM baixa e experiência muito, mas muito afetada. Entendo que isso fuja da parte “smart” da definição “smartphone”, mas na parte mais baixa da pirâmide é preciso pensar assim: poucas funções bem executadas, e não um mundo de apps que você gostaria de usar e vai se frustrar na hora de abrir e ter uma experiência horrível. Isso é péssimo para desenvolvedores e para a imagem do Android (que mais do que nunca está liso nos modelos topo de linha).
Mas, no fim das contas, o uso do Asha 311 como smartphone é bastante prejudicado pela precariedade dos apps. Eles são absurdamente ruins, a ponto de fazê-lo desistir de usá-los — foram várias as vezes em que não consegui fazer check-in no Foursquare, ou acessar uma página web on the go, ou ainda dar uma olhada em redes sociais. Além de ruins, são feios e desinteressantes. E essa falha me leva a questionar se, com R$ 400 na mão para comprar um celular, não seria mais negócio pegar um dumbphone de R$ 100 e economizar uma grana, ou esperar acumular o dobro disso e partir logo para um Android mid-range — opções bem decentes, do Galaxy S II Lite ao Razr i, não faltam. De verdade, e me desculpem os que se viram bem com um, mas é muito difícil ser feliz com um smartphone low-end.