Celulares normais têm que morrer!
Agora é oficial: não consigo mais usar celulares que não sejam smartphone. Interfaces de usuário malfeitas, convenções arbitrárias, curva de aprendizado… tudo isso tem que morrer.
O aparelho: Sony Ericsson W995a, celular 3G com Wi-Fi, Bluetooth A2DP, câmera de 8.1 megapixels (com geotagging, detecção de rosto, flash, autofoco e botões dedicados) e Walkman.
O preço: 600 dólares
O veredito: O W995a tem um bom design e parece resistente. Quer dizer, não tem nada de errado com ele a não ser o teclado, que parece meio solto e propenso a causar erros de digitação. O tocador de mídia é OK, e o celular tem botões dedicados para tocar, pausar, avançar e voltar. E os botões são iluminados! Nossa, que bom…
E tem a câmera também. Minhas expectativas eram altas, já que a câmera tem 8.1 MP. Queria que fosse ótima, mas só consegui fotos de alta resolução das mesmas fotos que tiro com meu outro celular…
Quer saber, desculpa, mas não dá pra continuar.
O W995a é basicamente o mesmo celular que eu usei pela primeira vez, e de que tanto gostava: meu confiável Sony Ericsson T68i. Eu e ele temos um passado, e eu adorava aquele celular. Adorava o mesmo menu em forma de matriz, a mesma interface complicada que me fazia navegar por telas e telas até achar o que eu queria, e até mesmo o teclado inteligente — na verdade não tão inteligente assim, mas que seja.
Isso em 2002.
Não quero ser chato com o W995a, que provavelmente é um dos melhores celulares "normais" (não-smartphone) que existem, um modelo high-end totalmente aceitável. Eu quero ser chato com toda a geração de celulares supercaros que não fazem nada além do que faziam os celulares de 10 anos atrás.
Depois do SE T68i, passei por várias outras marcas, Nokia, Motorola, LG, Samsung… todos com a mesma interface malfeita, a mesma incapacidade em lidar direito com música e fotos, e a mesma dificuldade em acessar a internet. Já existiam "smartphones" na época. Mas eles não eram tão "smart", tão espertos assim: eu tinha um BlackBerry, por exemplo, um celular que parecia melhor do que realmente era, com uma roda lateral e e-mail melhor que os outros, que não tinham e-mail. A Sony Ericsson e a Nokia também tinham "smartphones". E estavam contentes.
Então chegou 2007. Num mercado saturado com centenas de combinações de celulares normais, a Apple lançou o iPhone. A Nokia não se importou. A Motorola também não. (Motoquem?) A RIM, que fabrica o BlackBerry, e outras empresas também não se importaram. Aqueles "novatos" de Cupertino não entendiam o mercado de celulares — como é que eles lançariam um? O mercado pensou diferente e o iPhone roubou os holofotes. As pessoas viram simplicidade dentro de um bom design, e mesmo que nem todos tenham comprado, todo mundo percebeu de repente que os celulares não precisam ser malfeitos, nem cheios de botões e intermináveis menus arbitrários. O iPhone redefiniu o jogo e as pessoas perceberam isso, e as empresas mais espertas seguiram o exemplo. Então veio o Android, o Palm Pre, e logo virá o Windows Mobile 7, versões básicas da mesma ideia: smartphones não devem se basear nos celulares normais. Smartphones são na verdade celulares mais simples, que, justamente por causa disso, são mais fáceis de usar que celulares normais.
O veredito de verdade — sobre os celulares normais: Minha última pergunta é: como é que existe empresa lançando celular mais ou menos iguais de 2002 a 2009? Não faço ideia. Existem 4 bilhões de celulares no mundo, e deles só 10% são smartphones. Este número está crescendo rapidamente e só deve aumentar à medida que o Android ganha espaço, com o lançamento do Pre, com melhores BlackBerrys da RIM e com o esforço da Apple em dominar o mundo com a família de produtos iPhone. Não é coincidência que a Nokia, maior produtora de celulares do mundo, passou de ganhar bilhões a lutar para sobreviver. Também não é coincidência que o líder da Nokia chama de principal concorrência a Apple, a Microsoft e a RIM, e não a LG, Samsung ou muito menos Motorola.
Sim, deve existir celular para todo mundo, não só smartphone. É verdade. Celulares normais baratos, a uns 100 reais, são ótimos. Mas o W995a custa 600 dólares. Outros celulares parecidos de outras empresas custam quase a mesma coisa sem contrato. Em 2009, não consigo pensart numa desculpa para comprar este celular.
Celulares normais — como o W995a — são como máquinas de escrever superlegais e eficientes, numa era de processadores de texto.
Celulares normais devem morrer.