Seriam as “cicatrizes” do fundo do mar da Antártica um prenúncio do que vem por aí?

A Terra contém indícios sobre seu passado em todos os cantos. E conforme nos lançamos em direção a um futuro muito mais quente, essas dicas podem nos dizer muito sobre o que estamos encarando. Na Antártica, isso nunca foi mais importante do que agora. As geleiras caindo da camada de gelo da Antártica Ocidental carregam […]

A Terra contém indícios sobre seu passado em todos os cantos. E conforme nos lançamos em direção a um futuro muito mais quente, essas dicas podem nos dizer muito sobre o que estamos encarando.

Na Antártica, isso nunca foi mais importante do que agora. As geleiras caindo da camada de gelo da Antártica Ocidental carregam uma quantidade enorme de gelo que poderia aumentar os níveis do mar em até 3,96 metros se esse gelo acabar no oceano. Elas também estão em uma posição precária, e alguns cientistas sugeriram que elas estão perto do ponto de recuo imparável.

Para entender o quão próximos estamos disso, uma nova pesquisa publicada na Nature na última semana observa o fundo do mar próximo às geleiras de Pine Island e Thwaites — duas das mais vulneráveis na Antártica Ocidental —, encontrando várias cicatrizes, arranhões e mossas causadas por icebergs. As descobertas mostram que, durante um período de 1.100 anos, começando 12.300 anos atrás, aglomerados enormes de pequenos icebergs se separaram das geleiras. Isso é uma má notícia para nós. O clima hoje em dia é parecido com o daquele período. E provavelmente só vai ficar mais quente, devido à crescente poluição por carbono. Os níveis de dióxido de carbono atmosféricos estão em 400 partes por milhão no momento, bem acima das cerca de 265 ppm em que estavam no fim de toda aquela atividade na Antártica milhares de anos atrás.

Os cientistas usaram imagens subaquáticas de alta resolução para examinar um histórico da “violência” dos icebergs no fundo do mar. Eles encontraram 10.831 características, e os resultados mostram que, durante um período de aquecimento 12.300 anos atrás, maioria foi causada por pequenos icebergs.

Cicatrizes deixadas no fundo do mar por icebergs. Imagem: Martin Jakobsson and Matthew Wise

Essas multidões de icebergs surgiram porque as plataformas de gelo acabaram em grandes falésias congeladas que alcançavam um quilômetro de altura em relação à água gelada abaixo. Essas falésias também eram incrivelmente instáveis diante de condições mais quentes e continuamente entravam em colapso, levando a um rápido recuo.

“Um grande desafio nas ciências da Terra é interpretar evidências de registros antigos”, disse Tom Wagner, especialista em criosfera da NASA, em entrevista ao Earther. “Nesse caso, tomaram o formato do fundo do mar e usaram-no para interpretar como camadas de gelo desmoronam e aumentam o nível do mar.”

Embora as geleiras tenham eventualmente se estabilizado milhares de anos atrás, os pesquisadores sugerem que poderíamos estar condenados a uma repetição, agora que as emissões de carbono por humanos estão mais uma vez estimulando o calor.

Desde a década de 1980, as geleiras têm perdido massa em uma taxa acelerada, em grande parte devido às águas quentes em contato com elas na parte de baixo. As geleiras de Pine Island e Thwaites rompem grandes icebergs medidos em unidades do tamanho de Manhattan, mas uma circunstância infeliz da geologia poderia levar a uma instabilidade crescente e a mais icebergs menores associados com o recuo rápido.

Aqui está o problema: a zona de aterramento — ponto em que uma plataforma de gelo começa a flutuar — até recentemente estava sobre um pequeno cume. Isso significa que o penhasco na ponta de um iceberg se mantém relativamente estável porque tem apenas algumas centenas de metros de altura. Grande, é claro, mas não grande o bastante para ser instável.

Porém, conforme a água quente começa a penetrar mais o interior, a linha de aterramento vai recuar ainda mais, até uma área em que a base rochosa sobre a qual a geleira fica se inclina para baixo. Isso vai dar origem a penhascos de gelo que podem preceder um colapso rápido (pelo menos em termos geológicos).

“No interior da atual linha de aterramento, não existem ‘pontos de fixação’ como elevações de base rochosa para que a linha de aterramento se estabilize uma vez que o recuo começa”, contou ao Earther Matthew Wise, candidato a doutorado no Scott Polar Research Institute  e líder da pesquisa. “Portanto, não existe nada para evitar que um futuro recuo se estenda para o interior da Antártida Ocidental.”

O derretimento da camada de gelo da Antártida Ocidental poderia desencadear um aumento do nível do mar de até 3,96 metros. As geleiras de Pine Island e Thwaites sozinhas são responsáveis por manter 1,2 metro de nível do mar sob controle. Mas essa e outras pesquisas cada vez mais mostram que elas não estão aptas ao desafio.

Isso significa que cabe às comunidades costeiras em todo mundo começar a se planejar para um futuro cheio de água. Pelo menos algumas delas parecem estar prontas para o desafio.

[Nature]

Imagem do topo: Björn Eriksson

fique por dentro
das novidades giz Inscreva-se agora para receber em primeira mão todas as notícias sobre tecnologia, ciência e cultura, reviews e comparativos exclusivos de produtos, além de descontos imperdíveis em ofertas exclusivas