Cientistas fazem viagem tranquila de navio até o Polo Norte — e isso é um péssimo sinal

Navio Polarstern leva pesquisadores ao Polo Norte em apenas uma semana. Eles encontraram muito menos gelo do que o esperado no caminho.
A norte da Groenlândia, os cientistas encontraram grandes piscinas abertas de água e um gelo marinho surpreendentemente fraco que poderia facilmente ser quebrado pelo navio. Foto: Steffen Graupner/MOSAiC

Temos acompanhado de perto o derretimento histórico do gelo no Ártico neste verão no hemisfério norte, mas não tão de perto quanto Gunnar Spreen e sua equipe de pesquisa, que estão literalmente seguindo o gelo.

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“Estamos atracados a um bloco de gelo agora”, disse ele ao telefone de um navio de pesquisa chamado Polarstern, que está atualmente na latitude 88 graus ao norte, pouco menos de 230 quilômetros do Polo Norte. “Estamos à deriva com o gelo. Aonde quer ele que vá, nós vamos.”

Spreen, pesquisador de gelo marinho e sensoriamento remoto da Universidade de Bremen, está participando de uma expedição de pesquisa conhecida como Observatório Multidisciplinar de Deriva para o Estudo do Clima Ártico, ou MOSAiC. É a maior campanha de pesquisa no Ártico da história, com cerca de 500 cientistas e funcionários se revezando no navio de pesquisa por meses a fio.

A equipe atual embarcou no Polarstern em 12 de agosto e, em apenas uma semana, eles chegaram ao Polo Norte. Para chegar lá, eles tomaram uma rota inesperada, ao norte da Groenlândia.

“Fomos para o norte; normalmente, teríamos ido para o leste. Ir para lá pelo norte é incomum porque normalmente há gelo bastante espesso naquela região, o que faz com que ela seja evitada por navios”, disse. “Mas este ano, a concentração de gelo estava muito baixa. Vimos nos satélites que havia muito mar aberto pelo qual poderíamos passar.”

A tripulação do Polarstern até encontrou alguns blocos de gelo, mas eles eram tão frágeis que o quebra-gelo da embarcação conseguiu removê-los com facilidade, abrindo caminho para passar.

Os cientistas do MOSAiC e a equipe de apoio no convés do navio Polarstern. Foto: Lianna Nixon/MOSAiC

É normal ter alguma quantidade de água aberta entre blocos de gelo no Ártico no verão. Embora se expanda e congele a ponto de cobrir quase todo o oceano no inverno, geralmente uma boa parte desse gelo derrete durante os períodos mais quentes do ano.

Mas não deveria haver tanta água aberta como há agora. No verão, o gelo agora cobre apenas metade da área que ocupava na década de 1980. Ele também se tornou mais jovem e mais fino. Ao todo, o Ártico perdeu 75% de seu volume de gelo nos últimos 30 anos.

Perto do Polo Norte, isso cria cenas de tirar o fôlego. O vasto oceano é de um azul profundo e está coberto por blocos de gelo brancos e fragmentados. Esses blocos flutuantes estão manchados com lagoas de derretimento, ou piscinas rasas de água que se formam em sua superfície e refletem o céu turquesa brilhante.

“É realmente muito bonito”, disse Spreen.

O que estraga a cena, porém, é saber que esta cena representa a morte do gelo ártico no verão. A região está esquentando duas vezes mais rápido que o resto do planeta, fato ilustrado pelas recentes ondas de calor e incêndios que bateram recordes na Sibéria. No mês passado, os pesquisadores descobriram que a extensão do gelo marinho no Ártico atingiu seu menor nível desde que os registros começaram, na década de 1970. No próximo mês, quando atinge o mínimo anual, a projeção é de que a extensão do gelo seja ainda menor.

O Polarstern. Foto: Steffen Graupner/MOSAiC

Enquanto o mundo continua a aquecer em meio à crise climática, que cada vez fica pior, um número crescente de pesquisas mostra que o Ártico pode ficar sem gelo já em 2035. As recentes observações dos cientistas do MOSAiC fazem isso parecer mais um fato inevitável do que uma possibilidade remota.

Isso seria devastador para os animais, incluindo focas e ursos polares, que dependem do gelo do mar Ártico para sobreviver. As comunidades indígenas também contam com esse gelo: durante o inverno e a primavera, ele funciona como uma ponte para uni-las e permitir que continuem suas práticas culturais históricas, como a caça às focas e os trenós puxados por cães.

Spreen e seus companheiros passarão o próximo mês no Polarstern seguindo um bloco de gelo e conduzindo uma variedade de experimentos e medições científicas para melhorar os modelos climáticos científicos do Ártico, o que permitirá avaliar essas consequências em detalhes.

Quem está longe também tem motivos para ficar assustado. Mudanças na extensão do gelo marinho podem causar estragos na circulação dos oceanos, levando a mudanças generalizadas no clima global. O desaparecimento do gelo também pode alterar os padrões climáticos mais ao sul, onde vive a maior parte da humanidade.

Os cientistas estão descobrindo muitos desses efeitos só agora, e Spreen e seus colegas esperam contribuir para esse conhecimento. Mas, como mostram as observações da equipe do Polarstern, não há dúvidas de que a região está ficando mais quente rapidamente.

“É muito, muito claro que há grandes mudanças acontecendo no Ártico devido às mudanças climáticas”, disse Spreen. “Para quem está acompanhando a jornada, espero que possam ver como isso é evidente.”

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